PAINEL I

A ARITMÉTICA DA SABESP

Marco Aurélio Jarreta Merichelli
majarretamerichelli@gmail.com

A Região Metropolitana de São Paulo tem grande parte do seu abastecimento de água fornecido pelo Sistema Cantareira, um complexo de túneis e reservatórios que funciona como uma grande e única barragem. Nos últimos meses, o volume de água do reservatório vem diminuindo em consequência da forte estiagem, prevendo-se sérios problemas no abastecimento de água. Desde o dia 15 de maio de 2014, entraram em operação bombas especiais, compradas pelo governo paulista, para retirar a água do fundo de três das represas que compõem o Sistema. Até então, essa água, denominada de reserva técnica, ou “volume morto”, não era considerada como parte da capacidade útil da represa porque estava localizada abaixo do nível usual de captação de água do Sistema. Segundo o site da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), às vésperas do uso da "primeira" reserva técnica (depois foram utilizadas a "segunda", "terceira", etc.), o Sistema contava apenas com volume de água correspondente a 8,2% de sua capacidade útil.

Analisando os dados fornecidos pela própria Sabesp, verifica-se que a capacidade útil do Sistema era de 981,55 bilhões de litros. Então, às vésperas do uso da mencionada reserva técnica, a represa contava com 8,2% de 981,55 bilhões, ou seja, cerca de 80 bilhões de litros de água, e isso era tudo que o Sistema Cantareira dispunha até as novas bombas entrarem em operação. Com elas, a Sabesp informou que novos 182 bilhões de litros de água foram acrescentados ao Sistema, o que implicou elevação do percentual de água disponível da capacidade útil para 26,7%.

A conta feita pela Sabesp para chegar a essa porcentagem foi:

Ocorre que, com o acréscimo de 182 bilhões de litros de água, a nova capacidade útil “potencial” do Sistema passou dos 981,55 bilhões de litros para (981,55+182) bilhões = 1.163,55 bilhões de litros. Portanto, uma outra porcentagem que poderia ser informada à população seria:

Estamos diante de duas interpretações diferentes para a porcentagem, sendo uma delas (a da Sabesp) ligeiramente menos pessimista do que a outra. O fato que vale a pena ressaltar é o de que devemos sempre olhar de forma crítica para os dados numéricos que nos são apresentados.
Em um artigo [1] publicado no jornal O Estado de S. Paulo, sobre o mesmo tema aqui tratado, o biólogo Fernando Reinach cita Ésquilo ao dizer que “A primeira vítima de uma guerra é a verdade”. Poderia ser dito a ele que, na guerra pela água em São Paulo, a segunda vítima foi a Aritmética.

PAINEL II

O TRIÂNGULO DE PASCAL E FUNÇÕES POLINOMIAIS

Hudson Rodrigues Armando
UEG/GO
Rogério César dos Santos
UnB/FUB

 

Vamos mostrar, neste texto, que cada n-ésima coluna do triângulo de Pascal, desenhado na página seguinte, pode ser representada por uma função polinomial de grau n. Por exemplo, a coluna 4, cujos elementos são 1, 5, 15, 35, etc., é representada pela função

no sentido de que:

Nesse mesmo sentido:

  • A coluna 0 é representada pela função polinomial de grau zero, f(x) = 1.
  • A coluna 1 é representada pela função polinomial de grau um, f(x) = x.
  • A coluna 2 é representada pela função polinomial de grau dois,
  • A coluna 3 é representada pela função polinomial de grau 3,

E assim por diante.

Ora, como se pode concluir isso? Observe, em vermelho no triângulo de Pascal, que a soma dos dois primeiros elementos de uma linha dá o elemento seguinte da coluna 1. Isso vale para toda a coluna 1. Logo, as diferenças de dois elementos consecutivos dessa coluna são todas iguais a 1.

Isso significa que a coluna 1 é formada por uma PA: 1, 2, 3, 4, 5, ...
Já a soma dos dois elementos de uma mesma linha, das colunas 1 e 2, como destacado em verde no triângulo, dá o próximo elemento da coluna 2

Isso significa que a coluna 2 é formada por uma PA de segunda ordem, ou de ordem 2. Ou seja, as diferenças de elementos consecutivos dessa coluna formam exatamente a PA que se configura na coluna 1: 3 – 1 = 2; 6 – 3 = 3; 10 – 6 = 4; etc.

Analogamente, concluímos que a coluna 3 é formada por uma PA de ordem 3, ou seja, as diferenças entre elementos consecutivos dessa coluna formam a PA de segunda ordem que se configura na coluna 2. E assim por diante. Enfim, cada coluna n é formada por uma PA de ordem n.

Estamos, na verdade, usando a relação de Stifel para números binomiais,

já que os elementos do triângulo de Pascal são os resultados das combinações Cn,p.

Ora, demonstra-se (ver [1], p.10, Teorema 2) que uma sequência infinita de números reais forma uma PA de ordem n se e somente se os seus infinitos elementos podem ser modelados por uma função polinomial de grau n, com coeficientes reais. Podemos então concluir que cada coluna n do triângulo de Pascal é representada, no sentido indicado no início do texto, por uma função polinomial de grau n,

f(x) = anxn + an – 1xn – 1 + ... + a1x + a0.

Para descobrir os coeficientes dessa função, montamos um sistema com n + 1 equações e n + 1 incógnitas, usando para isso os n + 1 primeiros elementos da coluna n, como ilustramos na situação particular, de grau 4; observamos que a coluna 4 é formada por:

f(1)= C4,0 = 1; f(2) = C5,1 = 5; f(3) = C6,2 = 15;

f(4) = C7,3 = 35; f(5) = C8,4 = 70; etc.

Então, para obter qual função

f(x) = a4x4 + a3x3 + a2x2 + a1x + a0

de grau 4, que representará toda a infinita coluna 4, resolvemos o sistema linear de 5 equações e 5 incógnitas:

cujo resultado é:

A função é, portanto, como vimos no início do artigo:

que nos fornece os infinitos elementos da coluna 4. Por exemplo, o 12° elemento dessa quarta coluna será f(12) = 1365.

Da mesma forma, se pode encontrar a função polinomial modeladora de qualquer outra coluna do triângulo.

Para agilizar as contas, sugerimos que o sistema linear seja implementado em algum software livre, por exemplo, o MAXIMA.

 

 

 

REFERÊNCIAS

PAINEL I

1 REINACH, F. Água diminui, represa sobe, O Estado de S. Paulo, 09/05/2014.

PAINEL II

1<http://www.rumoaoita.com/site/attachments/421_Apostila_ITA_Progressoes.pdf>. (Acesso em 07 julho 2014).