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André Costa Alguns dos resultados mais curiosos e surpreendentes na Matemática do ensino médio são as propriedades do Triângulo Aritmético (também conhecido como triângulo de Pascal-Tartaglia). Propomos aqui justificar algumas dessas propriedades utilizando Análise Combinatória, o que chamaremos de demonstrações combinatórias. Nessas demonstrações, um resultado de contagem é justificado pela interpretação de um problema de dois modos distintos. Utilizaremos a simbologia , denominada de número binomial de 10 sobre 3 (ou combinação de 10 elementos tomados 3 a 3), significando o número de maneiras de se selecionar um conjunto com 3 elementos entre 10 disponíveis. Sabemos que podemos calcular esse valor fazendo
Um exemplo de demonstração combinatória é a igualdade , conhecida por propriedade das combinações complementares. Para justificar num caso particular, imagine um time de voleibol composto por 10 jogadores. O número corresponde à a quantidade de maneiras de selecionar 6 jogadores para o time titular, dentre os 10, que é equivalente aescolher 4 jogadores para o banco de reserva, . Como foi feito no caso acima, vamos enunciar as propriedades de modo geral, contudo vamos demonstrá-las em casos particulares, ficando a demonstração geral para o leitor. O leitor vai constatar que o raciocínio usado no caso numérico escolhido não considera nenhuma propriedade específica dos números envolvidos e, desse modo, pode ser perfeitamente adaptado ao caso geral.
A primeira propriedade que demonstraremos é conhecida por Relação de Stifel. Ela afirma que, ao somarmos dois números vizinhos no Trângulo, numa mesma linha, obtemos como resultado o número que fica abaixo do número da direita. Algebricamente,
Imagine um grupo formado por 1 mulher e 8 homens. Observe que é o número de manei- De outro modo, esses grupos de 4 pessoas podem ser selecionados somando os casos de grupos em que a mulher está presente, , e os grupos em que a mulher não está presente, . Logo A propriedade seguinte, conhecida como Teorema das Linhas, afirma que a soma dos elementos da linha n do Triângulo de Pascal é igual a 2n, ou seja, Considere um salão com 8 portas. Cada porta pode assumir dois estados, aberta ou fechada; logo, o número de estados possíveis das portas nesse salão será de 28 possibilidades. Por outro lado, podemos ter nenhuma porta aberta, ou exatamente uma, ou exatamente duas, etc., até 8 portas abertas, de modo que: Mais uma vez, o raciocínio no caso genérico é semelhante. Às vezes ausente dos livros didáticos no ensino médio, o Teorema das Colunas se refere à soma dos elementos de uma coluna do Triângulo Aritmético, a partir do primeiro elemento até um elemento qualquer dessa mesma coluna, e é expresso de modo preciso como Para justificá-lo, suponha que de um grupo de 7 pessoas {A; B; C; D; E; F; G} desejamos escolher 4 para formarmos um conjunto. Isso pode ser feito de modos distintos. Essa escolha, por outro lado, pode ser particionada contando os conjuntos nos quais A está presente, , adicionando os conjun tos nos quais B está presente, mas A não está, , com os em que C está e A e B não estão, , e, finalmente, o caso em que A, B e C não estão, mas D está, , ou seja, E, F e G obrigatoriamente também estarão nesse conjunto. Logo, Outro resultado interessante é o Teorema das Diagonais. O resultado refere-se à soma dos elementos de uma diagonal do Triângulo Aritmético, ou, precisamente, Algebricamente, ele pode ser obtido imediatamente do Teorema das Colunas utilizando combinações complementares. Mas, também nesse caso, podemos inventar uma historinha. Considere o mesmo grupo de pessoas da história acima, ou seja, {A; B; C; D; E; F; G}. Note que orresponde ao número de escolhas de conjuntos de 3 pessoas escolhidas entre as 7. Essa escolha pode ser feita somando os casos dos gru pos sem o amigo A, ; com os grupos com A, mas sem B, ; com os grupos com A e B, mas sem C, ; e, finalmente, com o grupo em que os três amigos estão presentes, , ou seja, Para concluir nosso texto, apresentamos uma aplicação do Teorema das Colunas: calcular o número de soluções naturais da inequação: x + y + z ≤ 50. Para tanto, iniciamos resolvendo o problema
do número de soluções naturais de uma equação do tipo x + y + z = 5. Esse problema possui vários análogos, e é um dos mais frutíferos da combinatória. Dois desses problemas análogos são: o número de maneiras de distribuir 5 bolinhas idênticas para 3 crianças, e o número de permutações distintas dos elementos A associação do problema original e o das crianças é quase imediata, pois basta pensar que cada solução do tipo x = 2, y = 2 e z = 1 corresponde à distribuição de 2 bolas para as crianças x e y e uma bola para z (nomeando as 3 crianças por x, y e z). Já a ligação do problema das permutações de cinco O’s e dois I’s com as soluções da equação pode ser pensada como um código gráfico para cada solução da equação, ou distribuição das bolinhas entre as crianças, da seguinte maneira: os O’s antes do primeiro I correspondem ao valor de x, os O’s entre o primeiro e o segundo I, ao valor de y, e os O’s após o segundo I, ao valor de z. Por exemplo, a solução 2 + 2 + 1 = 5 seria codificada pela permutação Essa última associação nos fornece uma maneira fácil de resolver os problemas, pois basta fazer a permutação dos elementos O O I O O I O, normalmente feita como Logo, uma maneira natural de se resolver o problema da inequação, colocado inicialmente, seria calcular caso a caso, ou seja, descobrir o número de soluções naturais para cada caso de x + y + z = n, com 0 ≤ n ≤ 50, e depois somar todos os casos para obter a solução final. Calculando todos os casos, temos, x + y + z = 0 possui soluções. x + y + z = 1 possui soluções. x + y + z = 2 possui soluções. x + y + z = 3 possui soluções. ... ... ... ... ... x + y + z = 50 possui soluções. Portanto, o número de soluções naturais da inequação x + y + z ≤ 50 corresponde à soma que, pelo Teorema das Colunas, é igual a Uma resolução inventiva para esse problema é notar que, para cada solução da inequação x + y + z ≤ 50, temos uma solução correspondente da equação x + y + z + t = 50. Logo, temos soluções. Note que essa maneira dupla de resolver esse problema pode também ser vista como um outro modo de demonstrar o Teorema das Colunas, e podemos facilmente criar uma nova historinha para demonstrá-lo dando uma interpretação para o problema da inequação. Espero que esse texto sirva como uma porta de entrada para uma abordagem contextualizada da Combinatória, em particular do Triângulo Aritmético.
BIBLIOGRAFIA 1 Lima, E.L.; Carvalho, P.C.; Wagner, E.; Morgado, A.C. Matemática para o ensino médio, volume 2. 2 Morgado, a. C.; Carvalho, J. B. P.; Carvalho, P. C.; Fernandez, P.. Análise Combinatória e Probabilidade (com soluções dos exercícios). 7a edição. Rio de Janeiro: SBM, 2005.
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