PAINEL I: POLÍGONOS NUMÉRICOS

Lucas Chaves da Silva e
Marcelo Ferreira

Na RPM 65, foi publicado o artigo intitulado Ver para crer, no qual foi proposto o seguinte problema: colocar os números inteiros de 1 a 9, sem repeti-los, sobre os lados de um triângulo equilátero, de modo que a soma dos quatro números em cada lado seja 20.  Veja algumas soluções apresentadas:

Ao ler o artigo, fiquei intrigado e tentei ver se era possível fazer a mesma coisa para polígonos com um número qualquer de lados, isto é, colocar números naturais sobre os lados do polígono, respeitando as regras:

1.  Apenas números inteiros e consecutivos a partir do um são usados.

2.  Em cada lado são distribuídos quatro números.

3.  A soma dos números sobre os lados é uma constante.

Primeiramente, observamos que, se o polígono tem  n  lados, então utilizaremos os números  1,  2, 3,  4,  5,  6, ...,  3n,   já que devemos colocar  n  números nos vértices e mais dois números em cada lado, totalizando, então,  n + 2n = 3n  números.

Agora surge a pergunta: será que podemos determinar alguma soma constante dos quatro números em cada lado?

Uma estratégia para encontrar uma solução (que não é única) é a seguinte: a média aritmética dos números da sequência  1,  2, 3,  4,  5,  6, ..., 3n  é igual a ,  pois os números são consecutivos.

Essa média funcionará como uma “constante”, isto é, como se os números colocados sobre os lados fossem todos iguais a essa média.

Como cada lado, incluindo os vértices, tem quatro números, a soma em cada lado será denotada  S  e dada por

S = 4 = 2 + 6n.

Vejam que essa soma é a soma  20  pedida na RPM 65 para o triângulo  (20 = 2 + 6 × 3).

Agora que já temos uma proposta para a soma de cada lado, vamos tentar criar uma estratégia para preenchimento dos vértices: Consideramos a soma de todos os números colocados nos lados (e nos vértices) do polígono,  nS.  Nessa soma estão repetidos os  números colocados nos vértices, que são contados duas vezes. Então, para obter a soma dos  n  números que estão nos vértices, basta subtrairmos de  nS  o valor da soma da sequência
1, 2, 3, 4, 5, 6, ..., 3n:

nS = n(2 + 6n) – = .

Uma possível estratégia para preenchimento dos vértices, que obedece a soma igual a ,  é escolher os números

n + 1,  n + 2,  n + 3,  ...,  n + (n – 1)  e  2n,

já que a sua soma é

n = .

Resta, agora, criar uma estratégia para distribuir os outros dois números sobre os lados do polígono de forma que a soma dos quatro números dos lados seja a mesma,  S = 2 + 6n.

Como os números foram distribuídos de forma consecutiva nos vértices, pode-se tomar o lado em cujos vértices estão o maior,  2n, e o menor número,  n + 1. Completamos esse lado colocando os números obtidos subtraindo um do menor vértice (n + 1 – 1 = n)  e somando um ao maior  (2n + 1). Observe que   2n + (n + 1) + n + (2n + 1) = 6n + 2.

Nos outros lados, que têm nos vértices os números  (n + 1)  e  (n + 2);  (n + 2)  e  (n + 3),  etc.  colocar os dois números  n – 1,  n – 2,  etc.  até o número 1.  Completar os lados com o número que falta para a soma resultar  6n + 2  (que serão  3n,  3n – 1, ...).

Imagem de um octógono exemplificando o processo descrito:

Observação da RPM

O processo descrito não é único. Há distribuições que obedecem às condições 1.,  2.  e  3.  estabelecidas no início do texto e tais que os números colocados nos vértices não são os indicados acima e a soma dos números colocados sobre os lados é uma constante diferente de  6n + 2,  como mostra o exemplo:

Em um triângulo equilátero

1,  4  e  7  nos vértices e

5  e  9  no lado ligando os vértices  1  e  4

2  e  6  no lado ligando os vértices  4  e  7                  

3  e  8  no lado ligando os vértices  1  e  7

A soma em cada lado é  19.

 

PAINEL II: MÉDIAS EM UM CONCURSO

Elzimar de O. Rufino

Em janeiro deste ano, estive na sala do Departamento de Matemática onde trabalho e lá se encontrava uma senhora solicitando opinião sobre a situação das médias de um concurso do qual ela havia participado. O concurso foi realizado em duas fases e o edital estabelecia que a média final do candidato seria a média aritmética das notas das duas fases. Porém, na primeira fase a pontuação máxima foi 130 pontos, enquanto na segunda fase essa pontuação máxima foi 100 pontos. A candidata não achou justo calcular a média aritmética e perguntou se estaria mais  bem classificada no concurso, caso as pontuações máximas das duas fases fossem iguais.

Fiz, então, a seguinte análise da questão:

Vamos considerar a situação de dois candidatos,  A  e  B,  utilizando as notações:

A1 = nota do candidato  A  na primeira fase
A2 = nota do candidato  A  na segunda fase
B1 = nota do candidato  B  na primeira fase
B2 = nota do candidato  B  na segunda fase

As médias dos candidatos  A  e  B  são dadas, respectivamente, por

MA = e MB = .

Vamos considerar MA e MB as outras médias dos candidatos  A  e  B,  considerando as escalas iguais nas duas fases, isto é, considerando que ambas  as fases tivessem pontuação máxima igual a  100 pontos. Para calcular essas novas médias, observamos que as notas da primeira fase dos candidatos  A  e  B  seriam consideradas iguais a

= A1   e    = B1

e, como as notas da segunda fase permaneceriam as mesmas, teríamos

MA = ( A1 + A2)   e   MB = ( B1 + B2).

Note que

2MA + A1 = 2MA   e   2MB + B1 = 2MB;

logo,

MA > MB      2MA + A1 > 2MB + B1      MAMB > (B1 – A1).

Portanto,  se  B1 > A1,  podemos concluir que

 MA > MB      MA > MB,

ou seja, se o candidato  A  superou o candidato  B,  sendo inferior a ele na primeira fase, então  A  continuaria superando  B  se as médias fossem calculadas considerando escalas iguais.

Suponhamos agora que ocorra  A1 > B1  e vejamos quais as condições necessárias para termos

MA > MB   e   MA < MB

Temos

MA < MB        A1 + A2 < B1 + B2

B2A2 > (A1B1).

Devemos ter também  MA > MB ou seja,

A1B1 > A2B2.

Logo, teremos inversão na classificação dos canditados  A  e  B,  com  A1 > B1,  se e somente se

(A1B1) < B2A2 < A1B1.

Assim,  teremos

MA > MB   e   MA < MB

se o cadidato  A  superou o candidato  B  tendo ido melhor na primeira fase e, na segunda fase, a nota de B  superou a nota de  A  em mais do que (A1B1) e menos do que  A1 B1.

Por exemplo, para

A1 = 5,  A2 = 8,  B1 = 3  e   B2 = 9,6,  temos

(A1B1) =        B2A2 = 1,6       A1B1 = 2

< 1,6 < 2 e  MA = 6,5;  MB = 6,3;  e

MA 5,92;  MB 5,95

 

 

PAINEL III: EMBALAGENS E RPM NAS AULAS DE CÁLCULO

Vanessa Botta

Uma disciplina que tira o sono de uma grande parte dos estudantes universitários da área de Ciências Exatas é o Cálculo Diferencial e Integral, colocada, em geral, no primeiro ano dos cursos.

Uma maneira de ensinar de modo a tornar as aulas mais leves e mais atrativas é apresentar algumas das aplicações práticas que o Cálculo Diferencial e Integral tem em abundância.

Então, numa das minhas aulas sobre o conceito de ponto de mínimo e valor mínimo de uma função, usei o artigo publicado na RPM 60 [1] que trata de embalagens de caixas de sabão em pó: talvez os leitores mais jovens não saibam, mas há algum tempo as embalagens de muitas marcas de sabão em pó mudaram; passaram de um paralelepípedo “mais estreito e alto” para um “mais largo e baixo”. As medida dessas caixas, segundo [1], são:

embalagem antiga: 4,8 cm × 16,8 cm × 24 cm (área superficial de 1198,08 cm2 e volume 1935,36 cm3)

embalagem atual: 19 cm  × 7 cm  × 14,5 cm (área superficial de 1020 cm2 e volume 1928,5 cm3).

Observe que a área superficial da embalagem atual é menor, o que acarretou redução na quantidade de material usado na sua produção. O volume também mudou, mas continuou suficiente para embalar 1 kg do produto. Segundo [2], uma das empresas que aderiram à utilização da nova embalagem reduziu em  31%  a quantidade de papel-cartão usado na confecção das embalagens e em  5%  o papelão das caixas de transporte. Além disso, houve uma diminuição da quantidade de água e energia necessárias para a fabricação das embalagens.

Coloquei então o problema: será possível reduzir ainda mais a quantidade de papelão para haver mais economia em relação à embalagem atual, mantendo o mesmo volume? Esse é um problema que  podemos resolver usando as ferramentas do Cálculo.

Vamos fixar em  7 cm  a largura da caixa, que julgamos adequada ao manuseio; considerando o volume da caixa  igual a 1928,5 cm3, temos, considerando c  o comprimento da caixa e a a altura: 1928,5 = 7ac.

A área superficial, A, da nova embalagem será dada por  A = 2 × 7c + 2 × 7a + 2ac = 14c +14a + ac.

Como a = , podemos considerar a função

A(c) = 14c + 14 + 2c = 14c + + 551.

Observe que

A'(c) = 14 – e A''(c) = .

Como estamos interessados no valor mínimo de  A,  determinemos os pontos críticos da função

A'(c) = 0 c   16,6.

Como  temos pelo A''(16,6) > 0 e A''(–16,6) < 0 temos pelo teste da derivada segunda que c 16,6 é   ponto de mínimo de  A(c)  e o valor mínimo da função é aproximadamente igual  a

A(16,6) = 1015,92.

Assim, a dimensão de uma embalagem ainda mais econômica seria de largura igual a  7 cm,  comprimento  16,6 cm  e altura  16,6 cm. 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[1] Santos, R. C. dos, Bacarin, S. A. de O. Embalagens. RPM 60, p. 10 - 12, 2006.    

[2] Quintanilha, L. O valor de uma ideia simples. Disponível em:
      <http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/desenvolvimento/conteudo_265842.shtml>.
      Acesso em 05 dez. 2012.

 

Nota da RPM

Observamos que a determinação do ponto de mínimo (e do valor mínimo) de uma função do tipo considerado no texto, f(x) = x + , a > 0,  pode ser reduzida à determinação do ponto de mínimo de uma função quadrática, pois

x + = + 2

e, denotando = t, determinar o ponto de mínimo de f(x) equivale a determinar o ponto de mínimo de  g(t) =  t2 + 2 que é obtido para  t = 0;  logo,  o ponto de mínimo de  f(x)  é  x =.

 

 

 

Resposta dos probleminhas...
1.   k = 12
2.   99 km/h
3.   180 km