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Paulo Sérgio C. Lino
Quando um raio luminoso incide sobre um espelho plano, sabemos da Física que "o ângulo de incidência é igual ao ângulo de reflexão". Os ângulos em questão são medidos em relação à normal, isto é, a perpendicular ao espelho pelo ponto onde o raio incidente intercepta o espelho.
Simétrico de um ponto em relação a uma reta Dado um sistema de coordenadas cartesianas no plano, se você propuser a um (bom) aluno que ele calcule as coordenadas do ponto simétrico de um ponto P em relação a uma reta r, muito provavelmente ele fará a equação da reta s, perpendicular a r por P, achará a interseção Q das retas r e s, e as coordenadas do ponto P', simétrico de P em relação a Q, que é a solução. Nesse processo, ele terá usado uma condição de perpendicularidade (provavelmente usando inclinações das retas), resolução de sistemas e fórmula do ponto médio. Vamos usar um outro método que utiliza números complexos, e que chega imediatamente a uma "fórmula" para a solução. Essa alternativa é raramente empregada, devido ao fato de que os números complexos são (erradamente, na nossa opinião) cada vez menos estudados no ensino médio e, quando o são, isso é em geral feito com uma abordagem algebrista e formal, deixando de lado o seu aspecto geométrico, tão rico em aplicações (sobre esse assunto, veja as referências [1] e [2], por exemplo). Como vamos usar complexos, cada ponto P do plano será identificado com o par ordenado (x; y) de suas coordenadas, ou com o número complexo x + yi, ou com o vetor . Suponha que r seja uma reta que passe pela origem e tenha a direção do vetor (ou complexo) unitário u = cosq + isenq. Para seguir a notação mais tradicional para complexos, o ponto P agora será chamado de z e seu simétrico em relação a r, de z'. Girando esses objetos do ângulo –q em torno da origem, a reta r coincidirá com o eixo Ox, enquanto os pontos z e z' serão transformados nos pontos e , pois = cos(-q) + isen(-q) = cosq - isenq, e girar um complexo de um certo ângulo equivale a multiplicá-lo pelo unitário da direção orientada correspondente. Porém, nessa posição, é o conjugado de . Logo, usando a álgebra dos complexos: Observe que u2 = cos2q + i sen2q, de modo que o resultado equivale também a girar o conjugado de z do ângulo 2q em torno da origem.
Exemplo 1 Suponha que P = z = (4; – 2) e que r tenha equação y = 3x. Então, r é paralela ao vetor (1; 3) e podemos tomar u = como sendo o seu vetor unitário. Neste caso, z' = u2= (4 + 2i) = (4 + 2i) = = (–4,4; 0,8). O leitor está convidado a fazer a figura com coordenadas e também a resolver o problema pelo seu método favorito e comparar os dois processos.
Reflexão em um espelho Se considerarmos os raios incidente e refletido juntamente com seus prolongamentos, eles podem ser encarados como retas, e não semirretas. Assim fazendo, o raio refletido é o simétrico do raio incidente não somente em relação à normal, como também em relação ao próprio espelho. Dado então um ponto z do raio incidente, e sendo u um vetor unitário da direção da reta que representa o espelho, o simétrico de z em relação ao espelho será z' = u2, desde que o espelho passe pela origem do sistema de coordenadas escolhido. O raio refletido fica então determinado por z' e pelo ponto de interseção do raio incidente com o espelho.
Como aplicação, vamos resolver o seguinte problema: O que acontece com um raio quando ele é refletido sucessivamente em dois espelhos não paralelos? Na figura, o raio incidente é refletido por E1, dando origem ao raio intermediário, que por sua vez é refletido por E2, gerando o raio refletido final. Vamos colocar no plano dos raios um sistema de coordenadas cartesianas, com origem no ponto de interseção dos espelhos (não esquecer que os espelhos estão reduzidos aos seus traços no plano dos raios), e de forma que o eixo Ox coincida com o espelho E1. Desse modo, o unitário de E1 é igual ao complexo 1. Sendo q o ângulo entre os espelhos (mais precisamente, o ângulo orientado de que deve girar E1 para coincidir com E2), então o unitário de E2 é u = cosq + isenq. Um ponto genérico z do raio incidente inicial será refletido por E1 em z' = . O raio incidente intercepta E1 num ponto a (sendo a real). Portanto, o raio intermediário (como reta) passa por z' e a. Porém, esses dois pontos se refletem por E2 nos pontos u2'= u2z e u2= u2a, respectivamente, e esses pontos determinam o raio refletido final. Como já tínhamos observado anteriormente, multiplicar um complexo por u2 = cos2q + isen2q equivale a girá-lo do ângulo 2q em torno da origem. A conclusão é que o raio refletido nos dois espelhos (como reta) é o resultado da rotação do raio incidente original em torno do ponto interseção dos dois espelhos, pelo dobro do ângulo formado pelos espelhos. Observação O que acontece no exemplo anterior se os dois espelhos forem perpendiculares? Resposta: Nesse caso, o ângulo entre os dois espelhos é reto. Logo, 2q = p, o que significa que o raio incidente é refletido na sua própria direção, mas no sentido contrário. Esse resultado é chamado reflexão total e é utilizado na construção dos dispositivos óticos chamados catadióptricos ou "olhos de gato", presentes nas rodovias e na traseira dos veículos (ver [3]). Na prática, em vez de usar dois espelhos planos, utiliza-se um prisma em que duas faces são perpendiculares.
Referências: [1] Carneiro, J. P. A. Geometria e o Ensino dos Números Complexos. RPM 55, 3 quadrimestre de 2004 – p. 15-25. [2] Motta, Edmilson. Aplicações dos Números Complexos à Geometria. Eureka, volume 6. [3] Código de Trânsito Brasileiro: http://www.anfavea.com.br/documentos/capitulo6seguranca.pdf
________________________________________________ Um matemático está observando o prédio em frente. Vê duas pessoas entrando. Depois, vê três pessoas saindo. Distraído, pensa: Se agora entrar uma pessoa, o prédio ficará vazio. ! ! !
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