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Impressiona-me o grau de atenção dele durante a aula e o valor que esse jovem rapaz dá ao conhecimento. Para responder às suas perguntas, tive que refletir, raciocinar, desenhar, conversar com colegas, ou seja, tive que estudar. Devido a esse aluno, sinto estar evoluindo, e estou dizendo no presente porque continuo lecionando para a turma dele, que, aliás, é muito participativa. Vamos aos fatos: estávamos numa aula sobre "semelhança" e nossa definição de semelhança era como em [1]: Dizemos que dois polígonos ABC... e A'B'C'... são semelhantes se existe uma correspondência ABC... A'B'C'... entre eles, satisfazendo duas condições: os ângulos correspondentes são congruentes ( = ', = ') e seus lados correspondentes (ou homólogos) são respectivamente proporcionais () Já tínhamos demonstrado que, no caso de triângulos, uma condição implica a outra. Eis que o Ian me surpreende com a seguinte pergunta: Essa e outras perguntas feitas adiante, confesso, nunca me haviam sido feitas por alunos anteriores. Penso que seria proveitoso e emocionante se os colegas leitores tentassem responder a elas antes de prosseguir na leitura. Antes de prosseguir, esclareço que minha definição de polígono também era a de [1], que exclui a possibilidade de interseções entre lados exceto, eventualmente, pelos pontos extremos. Resposta: admiti que, ao falarmos de um trapézio, esteja claro quais são as bases e quais são os lados transversos. Sejam a e b, com a > b, as medidas das bases; c e d as medidas dos lados transversos de um trapézio ABCD; ka e kb as medidas das bases e kc e kd dos lados transversos de um trapézio A'B'C'D'. Tracei, como mostra a figura, um segmento de reta BE paralelo a um dos lados transversos (AD), fazendo aparecer dentro do trapézio o triângulo BCE, cujos lados têm as medidas conhecidas: a – b, c, d. Logo seus ângulos BC, EB e CE estão com suas medidas , e determinadas. Sendo = 180 – , as medidas dos ângulos internos do trapézio ABCD estão determinadas: m() = , m() = + , m() = e m() = . Analogamente, no trapézio A'B'C'D', efetuei os mesmos procedimentos, obtendo o triângulo B'C'E' , que é semelhante ao triângulo BCE, pois seus lados correspondentes são proporcionais (razão k). Sendo assim, os ângulos do triângulo B'C'E' são congruentes aos ângulos do triângulo BCE, e, em decorrência, o mesmo ocorre com os ângulos dos trapézios A'B'C'D' e ABCD. Desse modo, podemos concluir que: se dois trapézios têm os lados homólogos proporcionais, eles são semelhantes, e, portanto, a resposta à pergunta do Ian é afirmativa. Mas os questionamentos desse aluno não pararam por aí; vejam outras perguntas que vieram em sucessão, algumas feitas em conversa fora da sala de aula. P1: Quais as condições para que quatro números positivos sejam as medidas dos lados de um quadrilátero convexo? P2: Quais as condições para que quatro números positivos sejam as medidas dos lados de um trapézio? P3: Se existir um trapézio cujas base medem a e b e os lados transversos c e d, existe também o trapézio cujas bases medem c e d e os lados transversos a e b? P4: Quatro números positivos podem ser as medidas dos lados de no máximo quantos trapézios? Para tentar responder a essas perguntas, vamos recordar as condições para que três números positivos sejam as medidas dos lados de um triângulo. Consideremos três números a, b e c tais que a b c 0; sabemos que o triângulo de lados com medidas a, b e c existe se, e somente se: a < b + c, conhecida como desigualdade triangular. Claro que, sendo a o maior dos três, a desigualdade a < b + c acarreta b < a + c e c < a + b. Bem, agora vamos às respostas. R1: Consideremos um quadrilátero convexo ABCD cujos lados medem a, b, c e d tais que a > b > c > d. Seja k a medida do segmento de reta AC. Em relação aos triângulos ABC e ACD temos, respectivamente, b + c > k e k + d > a. Logo, podemos concluir que b + d + c > a. Reciprocamente, se a < b + c + d, podemos escolher k tal que a k b, b + c > k > a – d e então construir os triângulos de lados a, d e k e de lados b, c e k. Obtemos o quadrilátero desejado "colando" esses dois triângulos pelo lado de tamanho k. Sendo assim, podemos afirmar que: quatro números positivos são as medidas dos lados de um quadrilátero se, e somente se, o maior deles é menor que a soma dos outros três. Para responder às três seguintes perguntas, vou excluir duas possibilidades: dos quatro números serem iguais ou de serem dois pares de números iguais, porque, nessas condições, obteríamos um losango ou um paralelogramo, que alguns consideram trapézios, outros não. R2: Consideremos um trapézio ABCD cujas bases medem a e b, com a > b, e os lados transversos c e d, com c d, como mostra a figura abaixo. Tracemos o segmento BE paralelo ao lado AD, fazendo aparecer o paralelogramo ABDE e o triângulo BEC, e neste caso temos: c – d < a – b < c + d de onde destacamos a desigualdade a – b > c – d, pois a desigualdade a – b < c + d, que equivale a a < b + c + d, já acontece pela simples existência do quadrilátero. Estamos afirmando que: num trapézio, a diferença entre as medidas das bases é superior à diferença entre as medidas dos lados transversos. Reciprocamente, sejam a, b, c, d números positivos com a > b e c d, que são medidas dos lados de um quadrilátero, isto é, qualquer um deles sendo menor do que a soma dos outros três. Se a – b > c – d, então c < (a – b) + d e, além disso, d < (a – b) + c e (a – b) < c + d. Portanto, podemos construir um triângulo CBE, de lados BE = d, BC = c e EC = a b : Prolonguemos o lado CE, no sentido de C para E, até um ponto D tal que ED = b, e, em seguida, tracemos um segmento BA paralelo a DE tal que BA = b, de modo a formar o paralelogramo ABED e o trapézio ABCD de bases CD = a, AB = b e lados transversos BC = c e AD = d. Logo, podemos afirmar que quatro números positivos a, b, c, d com a > b e c d, que sejam as medidas dos lados de um quadrilátero, são as medidas dos lados de um trapézio cujas bases medem a e b e os lados transversos c e d se, e somente se, a – b > c – d. R3: Respondida a pergunta 2, fica mais fácil de responder à pergunta 3. Existindo o trapézio cujas bases medem a e b, com a > b, e os lados transversos c e d, com c d, devemos ter a – b > c – d. Para existir o trapézio cujas bases meçam c e d e os lados transversos a e b, deveríamos ter: c – d > a – b, o que seria uma contradição. Logo, se existe um trapézio cujas bases medem a e b e os lados transversos c e d, NÃO EXISTE o trapézio cujas bases medem c e d e os lados transversos a e b. R4: Para que quatro números positivos a, b, c e d sejam as medidas dos lados de uma quantidade máxima de trapézios, é evidente que devemos considerá-los diferentes dois a dois. Suponhamos então que a > b > c > d. Em seguida, vamos elencar as quadras ordenadas que representem hipotéticos trapézios, de modo que os dois primeiros elementos da quadra representem, respectivamente, as medidas da base maior e da base menor, e os outros dois representem as medidas dos lados transversos em ordem decrescente. São elas: (a, d, b, c), (a, b, c, d), (a, c, b, d), (b, c, a, d), (c, d, a, b), (b, d, a, c). É claro que pelo menos a quadra (a, d, b, c) representa um trapézio, pois certamente a – d > b – c; e, consequentemente, o mesmo não ocorre com a quadra (b, c, d, a). A seguir, só podem ocorrer três situações: a – b > c – d, a – b < c – d ou a – b = c – d. Analisemos cada uma delas: 1. Se a – b > c – d, decorre que a – c > b – d, e, assim, as quadras (a, b, c, d) e (a, c, b, d) representam trapézios e o mesmo não acontece com as quadras (c, d, a, b) e (b, d, a, c). 2. Se a – b < c – d, decorre que a – c < b – d, e assim as quadras (a, b, c, d) e (a, c, b, d) representam trapézios e o mesmo não ocorre com as quadras (a, b, c, d) e (a, c, b, d). 3. Se a – b = c – d, decorre que a – c = b – d, e, assim, nenhuma das quadras (a, b, c, d), (c, d, a, b), (a, c, b, d) e (b, d, a, c) representa trapézios. Portanto, quatro números positivos diferentes, com o maior deles menor que a soma dos outros três, sempre representam as medidas dos lados de pelo menos um trapézio e de no máximo três trapézios. Para encerrar, um alerta: a desigualdade triangular, que serviu de base para as minhas respostas, quase não aparece mais nos livros de Matemática do ensino fundamental e do ensino médio, e quando aparece vem desacompanhada de exercícios de aplicação. Depois só reaparece no estudo dos vetores, quando o aluno se torna universitário, o que é uma pena!
Referência bibliográfica [1] Moise, Edwin G. e Downs Jr., Floyd L. Geometry. Addison-Wesley, 1964.
Você sabe calcular 382 de cabeça? Veja como é fácil: 382 = (38 + 2).(38 – 2) + 4 = 40.36 + 4 = 1440 + 4 = 1444. E 232 ? 232 = (23 – 3).(23 + 3) + 9 = 20.26 + 9 = 520 + 9 = 529. 852 é moleza! 852 = (85 + 5).(85 – 5) + 25 = 90.80 + 25 = 7225. Agora é sua vez: 412 = ? 412 = (41 – 1)(.......) + ....... = Enviado por Maurício Ary Jalom |