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Carlos Alberto M. de Assis
Uma resposta para uma pergunta Certa vez, com o intuito de desafi ar os meus alunos do 1º ano do ensino médio do Instituto Católico de Educação e Cultura Mater Coeli, colégio onde trabalho, coloquei a seguinte questão retirada de [2] no quadro: “Mostre que x = ... é um número inteiro.” Alguns alunos me mostraram o que tinham feito, ou seja, x2 = 2 + x ou x2 – x – 2 = 0, equação cujas raízes são x1 = –1 ou x2 = 2, concluindo, então, que x = 2. Mas fiquei me perguntando: E se o x da questão fosse escrito da seguinte maneira: x = , x = ou, ainda, x = e assim sucessivamente? Mais geralmente, para que valores inteiros de n, n > 0, teremos que x = é inteiro? Intrigado com a pergunta, resolvi fazer alguns rascunhos de cálculos e mostrar para o professor Raphael Antunes, o qual forneceu valiosas sugestões para elaborarmos este artigo. Generalizando o raciocínio dos alunos, tome x = . Elevando ao quadrado, temos x2 = n + x, que implica x2 – x – n = 0. Sendo claro que x deve ser maior que zero, fica-se com x = Sempre que D = 1 + 4n for um quadrado perfeito (necessariamente ímpar), e só nesse caso, x será inteiro positivo e satisfará a equação dada. A tabela abaixo exibe os quadrados ímpares (começando com 32, já que para D = 1, n = 0), os correspondentes valores de n = e os respectivos valores para x. Assim, a primeira linha significa que x = = 2, a segunda linha significa que x = = 3, e assim por diante. De um modo geral, de x = tira-se que D = (2x – 1)2 e, portanto, n = . Isso mostra que x pode assumir qualquer valor natural maior do que 1, mas n só pode assumir os valores n = que formam a Progressão Aritmética de segunda ordem (ver [3]) (2, 6, 12, 20, 30, 42, ...). Assim, por exemplo, não é inteiro, mas é inteiro (igual a 4). Cabe agora aqui alertar para alguns cuidados que devem ser tomados no raciocínio anterior. Em primeiro lugar, deve ser explicado que, nessas equações, os “pontinhos” indicam que está ocorrendo um processo infinito, mais precisamente, um processo de limite (ver[1]). Por trás da expressão está a sequência: x1 = , x2 = , x3 = , ... Quando se escreve x = , pretende-se que x seja o limite dessa sequência. Mais ainda: quando os alunos escreveram x2 = 2 + x, usaram a “aritmética dos limites”, que é uma coleção de teoremas úteis, tais como: “o limite do quadrado é o quadrado do limite”, “o limite da soma é a soma dos limites”, etc. (ver [1]). Esses teoremas só podem ser aplicados se, de antemão, temos a certeza da existência dos limites em questão. No presente caso, é bastante claro que a sequência , , ,... é crescente, ou seja, cada termo é maior do que o anterior. Além disso, todos os termos dessa sequência são menores do que 2. Isso se pode ver por indução (ver [1]), pois, se um certo termo xk for menor do que 2, então o termo seguinte xk+1 também o será, pois satisfará a igualdade xk+1 = = 2. Como o primeiro termo é menor do que 2, então, pelo princípio da indução, todos são. Finalmente, como a sequência é crescente e “limitada superiormente” (todos os seus termos são menores do que 2), então, ela tem um limite, por um dos princípios básicos da teoria dos limites (ver [1]). (O raciocínio foi feito para n = 2, mas um argumento análogo é válido para qualquer n da forma [(2x – 1)2 – 1]/4.) Ainda em relação aos cuidados que devem ser tomados, observamos que nem sempre sequências obtidas por recorrência, como as deste artigo, têm limite. O leitor pode consultar, por exemplo, a RPM 26, p. 12, para encontrar exemplos de sequências defi nidas por recorrência, sem limite, para as quais a suposição errônea da existência do limite leva a resultados paradoxais, como, por exemplo: = 2, que leva a x2 = 2 ou x = . Ou = 4, que leva a x2 = 4 e x = = . Desse modo teríamos 2 = =4. O que acontece neste exemplo é que existe um x real, x = , para o qual o limite existe e é igual a 2 e não existe nenhum número real para o qual o limite exista e seja igual a 4.
Referências bibliográficas [1] Lima, E. L. Análise real, vol. 1. IMPA, 2006. |