Painel I

O critério vale para 7 e ...

Cydara Cavedon Ripoll
UFRGS

Na seção PAINÉIS da RPM 61 está publicado um interessante critério de divisibilidade por 7 que é conseqüência do fato de que há múltiplos de 7 terminando com todos os algarismos 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9. Mesmo considerando que o assunto " critérios de divisibilidade" tem sido reiteradamente publicado na RPM, como mostra a bibliografia, achamos que valeria a pena mostrar que o critério de divisibilidade por 7 da RPM 61 pode ser generalizado para qualquer outro número que seja relativamente primo com 10, isto é, que não tem os fatores 2 e 5 na sua decomposição em primos. Para isso, basta observar que vale o seguinte resultado que demonstraremos no final do texto:

Se n > 2 é um natural relativamente primo com 10, então todos os algarismos 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9 aparecerão como algarismo das unidades de algum dos números n, 2n, 3n, 4n, 5n, 6n, 7n, 8n ou 9n.

Vejamos como esse resultado permite, por exemplo, decidir se 9.174.579 é divisível por 17.

Como 17 é relativamente primo com 10, sabemos pelo resultado anterior que cada um dos algarismos 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9 é o algarismo das unidades de um dos números n, 2n, 3n, 4n, 5n, 6n, 7n, 8n ou 9n. E, de fato:

  1 × 17 = 17 2 × 17 = 34 3 × 17 = 51
  4 × 17 = 68 5 × 17 = 85 6 × 17 = 102
  7 × 17 = 119 8 × 17 = 136 9 × 17 = 153

Como 9.174.579 termina em 9, escolhemos 7 × 17 = 119 e fazemos 9.174.579 − 119, obtendo 9.174.460. É propriedade conhecida da divisibilidade que

9.174.579 é divisível por 17 ⇔ 9.174.460 é divisível por 17.

Como 17 e 10 são primos entre si, temos, por outra propriedade da divisibilidade, que

9.174.460 é divisível por 17 ⇔ 917.446 é divisível por 17.

Continuamos o processo, repetindo essa idéia:

917.446 − 136 = 917.310, já que 8 × 17 = 136

91.731

91.731 − 51 = 91.680, já que 3 × 17 = 51 9.168

9.168 − 68 (4 × 17) = 9.100, já que 4 × 17 = 68 91

91 − 51 = 40, já que 3 × 17 = 51

Finalmente, como flagrantemente 40 não é divisível por 17, concluímos que 9.174.579 também não é.

 

Demonstração do resultado

Consideremos, no conjunto {n, 2n, 3n, 4n, 5n, 6n, 7n, 8n, 9n}, dois números distintos, digamos in e jn, com i ≠ j, i, j = 1, 2, ..., 9.

Se in e jn têm o mesmo algarismo das unidades, então o algarismo das unidades de in − jn é zero, ou seja, in − jn = n (i − j)= 10k, com k inteiro.

Como, por hipótese, n e 10 são primos entre si, então i − j tem que ser divisível por 10. Mas isso ocorre se e somente se i − j = 0, já que i, j = 1, 2, ..., 9.

Logo, i = j, o que mostra que os algarismos das unidades dos números do conjunto {n, 2n, 3n, 4n, 5n, 6n, 7n, 8n, 9n} são todos diferentes entre si e todos não nulos (n e 10 são primos entre si).

Como só existem 9 possibilidades para esses algarismos, concluímos que todos eles aparecem como algarismo das unidades em n, 2n, 3n, 4n, 5n, 6n, 7n, 8n e 9n, o que completa a prova.

 

Painel II

O número 12

Carlos Grosso
Retirado do Jornal de Matemática Elementar nº 265
Lisboa, Portugal, maio de 2008

Ao número 12 são atribuídos muitos significados, sobretudo de índole religiosa ou espiritual, cuja influência provocou alguns efeitos na organização de nosso cotidiano.

O número 12 é associado à idéia da perfeição eterna, de ciclo completo. Porque 12 é o produto do número três pelo número quatro, é interpretado como a manifestação do espiritual no material, representando a relação entre o abstrato e o concreto, entre a Trindade e a Matéria.

Na historiografia judaico-cristã, temos os 12 filhos de Jacob, filho de Isaac e neto de Abraão, dos quais derivaram as 12 tribos de Israel. Refere-se ainda que Jacob usava um peitoral sobre o qual haviam sido incrustadas 12 pedras preciosas que são a revelação de 12 poderes cósmicos. Também a coroa usada na sagração da monarquia inglesa tem 12 pedras preciosas.

São 12 os deuses principais da mitologia grega, que vivem no Monte Olimpo. O ano tem 12 meses. O zodíaco divide a esfera celeste em 12 casas. O relógio está dividido em 12 horas.

A bandeira da União Européia tem 12 estrelas douradas, que, segundo a Comissão Européia, representam a "solidariedade e harmonia entre os povos da Europa", porque o número 12 é "tradicionalmente um símbolo de perfeição, de plenitude e de união".

Não consigo acreditar que os números tenham algum significado que os transcenda, porém creio que a natureza abstrata dos números propicia a sua utilização como representantes de significados que os transcendem. Atribuições e interpretações do significado do número 12, sobretudo relacionadas com questões religiosas e sociais, decorrem do fato, do domínio aritmético, de 12 ser o produto de 3 por 4 e, além disso, parece-me que o fato de 12 ter muitos divisores, 1, 2, 3, 4, 6 e 12, pode ter ajudado na sua projeção. É que, entre as quatro operações aritméticas elementares efetuadas no conjunto dos números inteiros, a divisão é a única que nem sempre dá resultados inteiros, sendo uma minoria os casos em que isso acontece. Conjugando esse fato com a circunstância de que a maioria dos seres humanos se mostra mais disponível para o cálculo com inteiros do que com outros tipos de números, compreende-se a importância dada aos números inteiros que se evidenciam por terem muitos divisores como 12, 24 e 60, por exemplo.

Mas o objetivo deste artigo é mostar uma intervenção do número 12 numa relação entre os domínios algébrico e geométrico. Consideremos uma função quadrática f(x) = ax2 + bx + c com Δ = b24ac > 0, condição essa, como bem sabemos, que implica a existência de duas raízes reais distintas da equação ax2 + bx + c = 0. Essas raízes são as abcissas dos pontos em que a parábola, gráfico de f, intersecta o eixo x.

Consideramos o triângulo formado pelos pontos A, B e pelo ponto V, vértice da parábola, como na figura. Esse triângulo é isósceles, já que AV = VB. Vamos verificar que o muito falado número 12 relaciona a função quadrática com a possibilidade de o triângulo AVB ser equilátero.

Como é conhecido, as coordenadas dos pontos A, V e B são dadas em função dos coeficientes da função quadrática:

Podemos usar o teorema de Pitágoras para calcular AV:

Por outro lado,

Para que AVB seja equilátero, devemos ter AB = AV, o que é equivalente a 12Δ = Δ2 ou, como Δ > 0, é equivalente a Δ = 12.