Frederico Reis Marques de Brito
CU de Sete Lagos - UNIFEMM

Quando dois conjuntos têm a mesma quantidade de elementos?

No artigo [1], a RPM apresentou uma interessante discussão para responder à pergunta: quando podemos dizer que dois conjuntos A e B têm a mesma quantidade de elementos? Vamos retomar essa discussão, agora de uma forma mais geométrica.

Certamente se tratarmos de conjuntos finitos tais como o conjunto A dos meses do ano, o conjunto B dos signos do zodíaco e o conjunto C das letras do nosso alfabeto, será fácil notar que A e B têm a mesma quantidade de elementos, mas C tem mais elementos do que A. Já a questão de comparar, pelo número de elementos, conjuntos infinitos é bem mais delicada. Recordemos a definição dada em [1]:

Dados dois conjuntos A e B, dizemos que eles possuem a mesma cardinalidade ou a mesma quantidade de elementos se existe uma função bijetora entre A e B. Informalmente, isso significa que existe uma regra que a cada elemento de A associa um único elemento de B e, reciprocamente, cada elemento de B fica associado a um único elemento de A. É usando essa linguagem informal que vamos apresentar alguns exemplos ilustrados por figuras geométricas.

1) Qual segmento tem mais pontos: o de 3 cm ou o de 6 cm?

-Embora não seja intuitivo, vamos mostrar que AB de 6 cm e A'B' de 3 cm têm a mesma quantidade de pontos.

Para isso basta ligar um ponto P qualquer de AB com O. A figura mostra que a ele fica associado um único ponto P’ de AB reciprocamente, cada ponto Q’ de A'B' é o associado de um ponto Q de AB . Portanto, AB e A'B' têm a mesma quantidade de pontos.

2) Há bastante tempo, os matemáticos já perceberam que duas circunferências quaisquer têm o -mesmo número de pontos, independentemente de seus raios Assustador? Nem tanto. Sem perda de generalidade podemos supor as circunferências com mesmo centro O. Em seguida basta observar que cada semi-reta de origem O corta cada uma das circunferências em exatamente um ponto, implicando a existência de uma correspondência bijetora entre os pontos de uma e da outra. Portanto, elas têm a mesma quantidade de pontos.

-3) Podemos usar o mesmo tipo de raciocínio para uma circunferência e uma elipse, ou um retângulo, ou ainda, para duas esferas, etc. Assim, ficamos sabendo, por exemplo, que a órbita terrestre (supostamente uma elipse) e o anel que está no seu dedo (supostamente uma circunferência) têm a mesma quantidade de pontos!

4) Um segmento e uma semi-reta têm a mesma quantidade de pontos. Na figura a seguir estão o segmento AB, aberto em B, e uma semireta de origem A, não passando por B. -Construímos o segmento auxiliar OB paralelo à semi-reta.

Agora, dado um ponto P do segmento AB, P diferente de B, associamos a ele o ponto P’, intersecção da reta OP com a semi-reta. Essa construção define uma correspondência bijetora entre o segmento e a semi-reta, mostrando que ambos têm a mesma quantidade de pontos.

5) Outro fato interessante: se tirarmos de uma circunferência C um ponto qualquer, ela passará a ter a mesma -cardinalidade que uma reta. Podemos supor sem perda de generalidade que o ponto suprimido foi o pólo norte N e traçar a reta horizontal que passa pelo centro da P’circunferência. Aí basta considerar a projeção estereográfica: dado um ponto P qualquer da circunferência (diferente de N), traçamos a semi-reta de origem em N, passando por P. Essa reta não será horizontal e, portanto, interceptará a reta horizontal num único ponto P. A correspondência descrita é bijetora e as duas figuras têm a mesma quantidade de pontos.

Em todos esses exemplos trabalhamos com conjuntos infinitos, que podem ser definidos como conjuntos que possuem um subconjunto próprio com mesma cardinalidade do todo. A idéia de conjunto infinito gerou controvérsias entre os matemáticos e demorou a ser formalizada e amplamente aceita.

Como bem disse o grande matemático David Hilbert,

“O infinito! Nenhuma outra questão jamais moveu tão profundamente o espírito humano; nenhuma outra idéia tem estimulado tão frutiferamente seu intelecto; no entanto, nenhum outro conceito tem necessitado de mais esclarecimentos do que esse do infinito...”

 

Referência bibliográfica

[1] ALENCAR, Raymundo, ABUD, Zara. Quantos Tem? para conjuntos infinitos. RPM 57, p. 41-48.