Bruno Alves Dassie

Os problemas de quadratura são sempre intrigantes. Destaca-se na história o famoso problema grego da quadratura do círculo e, associado a esse, o da quadratura das lúnulas (ver RPM 06 e 16). Temos também a quadratura da parábola dada por Arquimedes. Mais recentemente, como citado, entre outros, em [1] e [2], temos a quadratura do quadrado, que consiste em cobrir um quadrado usando ladrilhos quadrados. Pode-se também pensar em cobrir outras formas, como, por exemplo, retângulos, usando ladrilhos quadrados. Ou ladrilhar um quadrado usando peças retangulares, sendo este problema mais simples que os demais, apresentando uma solução bastante interessante dada com peças compostas a partir de números da seqüência de Fibonacci: 1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, ... e assim por diante, com cada termo igual à soma dos dois anteriores. Como exemplo, consideremos as peças:

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Com essas peças podemos montar o quadrado da figura.

-Vamos denominar Quebra-cabeça de Fibonacci o problema de montar um quadrado com um número ímpar de retângulos cujas dimensões são dadas pelos termos iniciais e consecutivos da seqüência de Fibonacci.

Mas o problema tem sempre solução?

A seqüência de Fibonacci, já abordada pela RPM em artigos publicados nos números 6, 17, 20 e 45, apresenta belíssimas propriedades.

Entre elas, encontra-se a seguinte:

Se somarmos um número ímpar de produtos cujas parcelas sejam números sucessivos da seqüência, iniciando com 1×1 obtemos o quadrado do último número.

Ou seja,

a1a2+ a2a3 + ... + an2an1 + an1an = (an )2,

sendo ai, i =1, 2, ..., n os primeiros termos da seqüência e n é par.

Vamos considerar alguns exemplos: n = 2: a1a2 = 1 × 1 = 1 = (a2)2,

n = 4: a1a2 + a2a3 + a3a4 = 1 × 1 + 1 × 2 + 2 × 3 = 9 = 32 = (a4)2,

n = 6: a1a2 + a2a3 + a3a4+ a4a5 + a5a6 = 1 × 1 + 1 × 2 + 2 × 3 + 3 × 5 + 5 × 8 = 64 = 82 = (a6)2 (este é o exemplo anterior).

A propriedade pode ser demonstrada usando o princípio da indução finita.

Vejamos:

i) A propriedade é válida para n = 2 (1 × 1).

-ii) Suponha válida para n = k, ou seja,

a1a2 + a2a3+ ... + ak2ak−1 + ak1ak = (ak)2,

sendo ak um termo de ordem par na seqüência de Fibonacci. Agora, vamos provar que a propriedade é válida para ak+2, pois assim teremos um número ímpar de parcelas, ou seja, queremos provar que

a1a2 + a2a3 + ... + ak1ak + akak+1+ ak+1ak+2= (ak+2)2.

Pela hipótese de indução, temos que

a1a2 + a2a3+ ... + ak2ak−1 + ak1ak = (ak)2, logo,

a1a2 + a2a3 + ... + ak1ak + akak+1+ ak+1ak+2 =

ak2 + akak+1 + ak+1ak+2 = ak(ak+ ak+1) + ak+1ak+2.

Mas ak+ ak+1 = ak+2 então ak(ak+ ak+1) + ak+1ak+2= akak+2+ ak+1ak+2 = ak+2(ak+ ak+1) = (ak+2)2 , como queríamos provar.

É importante notar que a validade da propriedade demonstrada, embora seja necessária, não basta para mostrar que o quebra-cabeça pode ser montado: é possível exibir exemplos de retângulos com soma de suas áreas igual a um quadrado perfeito, mas que não formam um quadrado. Por exemplo, a soma das áreas dos retângulos 1 × 1 e 1 × 3 é igual a 4, mas esses retângulos não podem ser montados formando um quadrado 2 × 2.

Vamos então provar agora, por indução, que o quadrado pode efetivamente ser montado. Mais precisamente, vamos mostrar que, se n é par com as primeiras (n − 1) peças (retângulos de dimensões a1×a2, a2×a3, ..., an1×an), podemos formar um quadrado de lado an.

i) Para n = 2, o retângulo 1 × 1 = a1 ×a2 é um quadrado.

ii) Suponhamos que possamos montar um quadrado de lado a com as primeiras (k − 1) peças, sendo k par. Os próximos retângulos da seqüência são ak ×ak+1 e ak+1 × ak+2.

Como ak+2 = ak+ ak+1, esses retângulos podem ser justapostos ao quadrado de lado ak, como mostra a figura, de modo a formar um quadrado de lado ak+2. Logo, com as primeiras k + 1 peças (com k + 2 par) também podemos montar um quadrado de lado ak+2.

Portanto, pelo princípio da indução finita, os primeiros (n − 1) retângulos podem ser justapostos de modo a formar um quadrado de lado anquando n é par. Note que esse argumento geométrico substitui com vantagens o argumento puramente algébrico anterior, porque, além de mostrar que a soma das áreas dos primeiros (n − 1) retângulos (n par) é igual a (an)2, mostra que eles podem ser justapostos formando um quadrado.

Na verdade, nossa demonstração faz mais do que isso: ela fornece um método (ou um algoritmo) para fazer a montagem. Basta colocar dois retângulos de cada vez, começando do maior para o menor, justapondo-os sempre de tal modo que um esteja apoiado no outro, com dois outros lados alinhados.

É também interessante notar que, em ambas as demonstrações, ao passar de k para k + 2 não usamos o fato de que k é par. Mas o resultado só vale, de fato, para k par (ou seja, para um número ímpar de retângulos). Isso ocorre porque, começando de 1, temos um quadrado inicial, mas começando de 2, não (os retângulos 1 × 1 e 1 × 2 não formam um quadrado).

 

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Ivan Mariano Lomasso Costa
Professor da rede pública municipal − BH /MG
Escolas Governador Carlos Lacerda e Santos Dumont

Matemática e Vida 1

Matemática e Vida 2

No meio do triângulo
existe um ponto
ponto que é encontro
que é equilíbrio
se encontra fácil
riscando medianas
mas não tão fácil
arriscando encontros
Três pontos definem um plano.
Na geometria é claro.
Porque na vida, entretanto,
três pontos se unidos num plano
formam amoroso triângulo
difícil de ser eqüilátero.

continua na página 'É por indução?'.