|
|
|||
José Marcos Lopes
Apresentamos, neste artigo, uma proposta para o ensino de probabilidade condicional, utilizando um jogo de dados baseado em Game of Kasje, citado em [2], p.181. Consideramos que os conceitos necessários ao estudo de probabilidade condicional já foram anteriormente estudados.
O jogo consiste no lançamento simultâneo de dois dados (com faces equiprováveis) e é disputado por dois jogadores, digamos, João e Maria. Os pares abaixo valem os pontos indicados e pares diferentes deles não são pontuados.
Se um jogador não conseguir nenhuma face 4 no primeiro lançamento, poderá efetuar um segundo lançamento com os dois dados. Se conseguir pelo menos uma face 4 no primeiro lançamento, reserva esse dado e decide se lança ou não o outro dado mais uma vez. Vence o jogo quem obtiver a maior pontuação. Caso os dois jogadores obtenham a mesma pontuação, o procedimento todo é repetido.
Um jogador deverá sempre aproveitar o segundo lançamento? O segundo jogador possui melhores possibilidades de vencer o jogo? Primeiramente, João efetua um ou dois lançamentos, posteriormente é a vez de Maria. Assim, Maria está numa posição melhor para decidir se aproveita ou não o seu segundo lançamento, já que conhece a pontuação obtida por João. Para tornar o jogo mais justo, deve existir uma alternância entre João e Maria como primeiro jogador. Se João conseguiu (4; 1) ou (1; 4) – 1 ponto, no primeiro lançamento, então ele deverá lançar o segundo dado mais uma vez, pois não é possível diminuir sua pontuação. Se João conseguiu 2 pontos no primeiro lançamento, então possui uma probabilidade de 16,17% de diminuir sua pontuação e uma probabilidade de 83,33% (1/6 + 4/6) de manter ou aumentar sua pontuação. Se João obteve 3 pontos no primeiro lançamento, então possui uma probabilidade de 33,33% (2/6) de diminuir sua pontuação e uma probabilidade de 66,67% (1/6 + 1/2) de manter ou aumentar sua pontuação e, se obteve 4 pontos no primeiro lançamento, então possui uma probabilidade de 50% de diminuir sua pontuação e uma probabilidade de 50% de manter ou aumentar sua pontuação, caso decida pela utilização do segundo lançamento.
O cálculo de probabilidades condicionais está relacionado ao cálculo da probabilidade de um evento ocorrer sabendo-se que um outro evento já ocorreu. Vamos sistematizar o conceito na resolução dos problemas a seguir. Problema 1: Considerando-se apenas o primeiro lançamento, qual a probabilidade de João marcar 3 pontos, sabendo-se que ele obteve em pelo menos um dos dois dados uma face 4? Solução Quando lançamos dois dados, temos um espaço amostral, S, constituído de 36 resultados possíveis. A informação de que João obteve em pelo menos um dos dois dados a face 4 reduz o espaço amostral para S1 = {(1; 4), (4; 1), (2; 4), (4; 2), (3; 4), (4; 3), (4; 4), (4; 5), (5; 4), (4; 6), (6; 4)}, que tem 11 elementos. Assim, a probabilidade de João marcar 3 pontos deve agora ser calculada nesse novo espaço amostral. Como João obtém 3 pontos se ocorrer (3; 4) ou (4; 3), temos que a probabilidade de João marcar 3 pontos no primeiro lançamento, sabendo-se que obteve pelo menos uma face 4, é igual a p = 2/11. Problema 2: Considerando-se apenas o primeiro lançamento, qual a probabilidade de João marcar 3 pontos, sabendo-se que o número da face do primeiro dado é maior do que a do segundo? Solução Da mesma forma que no problema 1, temos o espaço amostral reduzido para S2 = { (2; 1), (3; 1), (3; 2), (4; 1), (4; 2), (4; 3), (5; 1), (5; 2), (5; 3), (5; 4), (6; 1), (6; 2), (6; 3), (6; 4), (6; 5) }, que tem 15 elementos. Desses 15 elementos, João pode marcar 3 pontos em apenas um deles, quando ocorrer (4; 3). Assim, a probabilidade de João marcar 3 pontos no primeiro lançamento, sabendo-se que o número da face do primeiro dado é maior do que a do segundo dado é igual a p = 1/15. Nos dois problemas calculamos a probabilidade de João marcar 3 pontos no primeiro lançamento e a informação fornecida altera o valor da probabilidade. Entretanto, em ambos os problemas calculamos a probabilidade condicional como o quociente entre o número de casos favoráveis e o número de casos possíveis. A partir daqui é possível começar a sistematizar o conceito de probabilidade condicional. No problema 2, definimos os eventos: A = {João marca 3 pontos no primeiro lançamento dos dois dados} e B = {O número da face do primeiro dado é maior do que a do segundo}. Desejamos calcular a probabilidade de ocorrer o evento A, sabendo-se que o evento B já ocorreu. A notação comumente utilizada é P(A|B). Temos que B = {(2; 1), (3; 1), (3; 2), (4; 1), (4; 2), (4; 3), (5; 1), (5; 2), (5; 3), (5; 4), (6; 1), (6; 2), (6; 3), (6; 4), (6; 5) } tem 15 elementos. Assim, P(B) = 15/36. Agora, A = {(3; 4), (4; 3)} e AB = {(4; 3)}. Assim, P(A B) = 1/36. Desses cálculos, observando o resultado do problema 2, obtemos: A relação acima não se verifica apenas para o caso particular do problema 2. Na verdade, essa relação é a definição de probabilidade condicional ([1], p. 141), admitindo-se que P(B) > 0. O problema 3, a seguir, pode ser utilizado para introduzir o importante conceito de eventos independentes. Problema 3: Considerando-se apenas o primeiro lançamento, qual a probabilidade de João marcar 4 pontos? Solução João obtém 4 pontos no primeiro lançamento se conseguir o resultado (4; 4) que tem probabilidade 1/36, 1 caso favorável em 36 casos possíveis. Outra solução Consideremos os seguintes eventos: A = {João obtém a face 4 no primeiro dado} e B = {João obtém a face 4 no segundo dado}. Para João marcar 4 pontos no primeiro lançamento, deve obter a face 4 no primeiro dado e também face 4 no segundo dado. Temos então a probabilidade .Assim, Temos ainda que P(A) = P(B) = 1/6. Portanto, P(AB ) = P (João obtem 4 pontos no primeiro lançamento) = Concluímos que, nesse caso, P(AB) =P(A) . P(B). Em termos de probabilidade condicional, obtemos que: ou seja, a probabilidade de ocorrer o evento A dado que ocorreu o evento B é igual à probabilidade de A. Assim, a ocorrência do evento B não interfere sobre a ocorrência ou não do evento A. Se P(AB) =P(A) . P(B), os eventos A e B são chamados independentes ([1], p.153). Os três problemas anteriores mostram como os conceitos de probabilidade condicional e eventos independentes podem ser apresentados por meio do jogo. Os problemas a seguir permitem explorar outros conceitos. Problema 4: Considerando-se apenas o primeiro lançamento, qual a probabilidade de João marcar 3 pontos, sabendo-se que obteve faces iguais nos dois dados? (Evento impossível.) Problema 5: Qual a probabilidade de João marcar 5 pontos nesse jogo, assumindo que João aproveita seu segundo lançamento se e só se obteve pontuação menor ou igual a 3 no primeiro lançamento? (Papel do e e do ou.) Solução i) João obtém 5 pontos no primeiro lançamento. Neste caso, p1 = 2/36 ≈0,0555. ii) João obteve 0 ponto no primeiro lançamento e 5 pontos no segundo lançamento dos dois dados. Neste caso, iii) João obteve 1 ponto no primeiro lançamento e a face 5 no lançamento do segundo dado. Neste caso, iv) João obteve 2 pontos no primeiro lançamento e a face 5 no lançamento do segundo dado. Neste caso, v) João obteve 3 pontos no primeiro lançamento e a face 5 no lançamento do segundo dado. Neste caso, Portanto, a probabilidade pedida [(i) ou (ii) ou (iii) ou (iv) ou (v)] é dada por p = p1+ p2 + p3 + p4 + p5 ≈ 0,1216 ≈ 12,16%. Lembrando que Maria joga depois de João, sua probabilidade de vitória está condicionada aos pontos que João já obteve. Se Maria obtém uma pontuação menor do que João no seu primeiro lançamento, então ela utilizaráo seu segundo lançamento. Se Maria obtém uma pontuação maior do que João já no seu primeiro lançamento, então o jogo termina com a vitória de Maria. Agora, quando Maria empata com João em seu primeiro lançamento, ela deve decidir se aproveita ou não o segundo lançamento. Isso, obviamente, está condicionado aos pontos obtidos por João. Nos dois problemas a seguir, estamos considerando que, se Maria empatou com João no primeiro lançamento, então ela usará o seu segundo lançamento se e só se João obteve 3 pontos ou menos. Problema 6: Se João não marcou pontos, qual a probabilidade de Maria vencer, perder ou empatar o jogo? (Eventos complementares. As respostas são ≈ 51,77%; 0%; ≈ 48,22%.) Problema 7: Se João marcou 4 pontos, qual a probabilidade de Maria vencer, perder ou empatar o jogo? (As respostas são ≈ 24,38%; ≈ 68,13%; ≈ 7,48%.)
Referências bibliográficas [1] MORGADO, A.C.O. et alii. Análise Combinatória e Probabilidade. Coleção do Professor de Matemática. Rio de Janeiro : SBM, 2004.
|