José Marcos Lopes
FEIS - UNESP

   Introdução

A RPM nos tem brindado com inúmeros artigos sobre cálculo aproximado de raízes quadradas, de modo que achávamos que já conhecíamos todos os métodos elementares para essa finalidade. Qual não foi a nossa surpresa ao depararmos com um “novo” método ao lermos um artigo de M. A. Grant em [1] (depois explicamos as aspas).

Apresentamos o método através de um exemplo. Seja a1 = 4 uma primeira aproximação de -. Temos

-

Observamos assim uma segunda aproximação a2 = 33/8 de -. Notando que a2 = 4,125 e sabendo que- com 11 casas exatas, vemos que conseguimos uma aproximação melhor do que a primeira. Prosseguindo com o mesmo método, mas agora tomando a2 no lugar de a1, temos

-

Obtivemos assim uma terceira aproximação a3 = 2177/ 528 ≈ 41231060606, melhor do que a segunda. O estudante pode prosseguir com os cálculos e verificar que cada iteração fornece uma aproximação melhor do que a anterior.

Vejamos outro exemplo começando com - temos

-

Sabendo que essa aproximação de - tem erro apenas na última casa, vemos que o método parece ser muito bom.

 

   Por que funciona

Por que o método funciona? Uma primeira explicação pode advir da propriedade de que, se s é um número real tal que 0 < s < 1, então s2< s. Assim, se a é uma aproximação de - tal que - temos - e pode-se obter uma aproximação melhor do que a.

Os seguintes cálculos podem aprofundar nossa compreensão sobre o que está ocorrendo. Seja r > 0 um número real e seja a > 0 uma aproximação de -tal que - temos

-

Supondo a > 1/2, obtemos - e assim a aproximação (r + a2)/ 2a é melhor do que a. Entretanto, examinando vários exemplos, vemos que para aproximar - não é necessário começar com a satisfazendo as condições e a > 1/2. Por exemplo, iniciando com - e aplicando sucessivamente o método acima nove vezes, obtemos - em que as dez primeiras casas são exatas.

Qual é então a explicação?

 

   Um método muito antigo

Vimos que, dada uma aproximação a1de -, calculando -obtemos uma segunda aproximação a2 = (r + a12)/ 2a1. Essa expressão pode ser reescrita da seguinte forma:

-

Essa fórmula já é conhecida do leitor da RPM (confira as referências [2]). Vemos assim que o método aqui apresentado não é propriamente novo, por isso usamos aspas no termo “novo” no primeiro parágrafo deste texto.

 

   Potencializando o método

Em [1] Grant também observa que a convergência do método pode ser acelerada se tomarmos potências 2n, com n > 2 inteiro. Por exemplo, retomando os cálculos feitos na Introdução, temos

-

que fornece, com uma única iteração, a aproximação a3 ≈ 4,12310606 obtida na Introdução, com seis casas exatas. Tomando a potência 6, uma única iteração fornece - ≈143649/34840 ≈ 4,1231056257 com dez casas exatas.

 

   Justificativas finais

Conforme observamos anteriormente, o método apresentado estará perfeitamente justificado com o resultado:

Seja r > 0 um número real. A seqüência - definida por

- converge para -.

A demonstração desse resultado fica bastante simplificada com o

Lema

Seja r > 0 um número real, e sejam a > 0 e b > 0 números reais tais que r = ab. Denotamos c = (a + b)/2. Valem as seguintes propriedades:

i) Se a = - (ou b = -), então c = -;

ii) Se a < b, então a < -< c < b

iii) Se a < b, então -

Demonstração

i) é claro. Vejamos ii). De r = ab e de a < b temos a < -< b. Ainda

-

do que segue -<c. Ainda de a < b temos c = (a + b)/2 < (b + b)/2 = b, ou c < b. Isso completa a demonstração de ii).

Vejamos agora iii). Como a < b, temos a<-< c < b. Portanto,

- Mas

- Portanto,

- Isso termina a demonstração do Lema.

Passamos agora à demonstração do resultado principal.

Notemos que a1é a média aritmética de a0 e de r/a0, e que a0(r/a0) = r. Notemos ainda que a2 é a média aritmética de a1 e de r/a1, e que a1(r/a1) = r, e assim por diante. Estamos na posição de aplicar o Lema, sendo que, para cada i > 0, temos a = ai e b = r/ai ou vice-versa, e c =ai+1.

Se a0 = -, temos a1= -, por i) do Lema. Reaplicando i), temos a0= -, e assim sucessivamente, temos an= -para todos n > 0.

Portanto nesse caso a seqüência - é constante e converge para -.

Se a0 - examinamos os casos a0<- e a0>-. Suponhamos a0<-. Fazendo a = a0 e b = a0/r, temos a < b e c = a1. Por ii) do Lema vem -< a1. Tomando agora a = a1/r e b = a1, temos a < b e c = a2. Por ii) do Lema vem -< a2 e por iii) vem - Repetindo o argumento segue que -< a3 e -

Repetindo sucessivamente o argumento, temos

- para todo n > 1 (*).

Por outro lado, se -< a0, fazemos a = a0/r e b = a0. Temos a < b e c = a1. Por ii) do Lema vem -< a1 . Tomando agora a = a1/r e b = a1, temos a < b e c = a2. Por ii) do Lema vem -< a2 e por iii) vem - Repetindo sucessivamente o argumento, obtemos novamente (*). Como o fator 1/2n tende a zero, segue de (*) que an converge para -, conforme queríamos demonstrar.

Com um pouco mais de trabalho é possível verificar que a convergência de an para - é quadrática. Isso implica que a cada iteração do método existe uma tendência de dobrar o número de casas exatas da aproximação. O estudante pode observar esse comportamento fazendo experimentos numéricos.

 

Referências bibliográficas

[1] GRANT, M. A. Approximating square roots. The Mathematical Gazette, 66, p. 230-231, 1982
[2] Revista do Professor de Matemática, n 2, p. 27, n 4, p. 25-27, n 9, p. 65-66.