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Chama-se retângulo áureo qualquer retângulo ABCD (Fig. 1) com a seguinte propriedade: se dele suprimirmos um quadrado, como ABFE, o retângulo restante, CDEF, será semelhante ao retângulo original.
O
Partenon (Fig. 3), ou templo da deusa Atena, uma das mais admiradas obras
da arquitetura universal, revela, em seu frontispício (Fig. 4) um quase
exato retângulo áureo. Todavia não há evidencia histórica de que, ao
construir o templo no 5
Voltemos à relação (1). Dela decorre, por uma propriedade bem conhecida das proporções, que: ou seja;
Isto
significa que se o retângulo de lados a + b e a é áureo, então também
o é o retângulo de lados a e b.
Evidentemente
o mesmo raciocínio se aplica para mostrar que
também são áureos os retângulos de lados b e a – b, a – b e
2b – a, etc. (Fig. 5). Em outras palavras,
dados os números positivos a e b, satisfazendo a relação (1), formemos
a seqüência
5b – 3a, 5a – 8b, 13 b – 8a, ... (2) Pois bem, o raciocínio anterior estabelece que quaisquer dois elementos consecutivos desta seqüência são os lados de um retângulo áureo. Portanto, o processo anterior de retirar quadrados de retângulos áureos conduz a uma seqüência infinita de retângulos áureos, com dimensões cada vez menores e tendendo a zero. É fácil provar que os lados de um retângulo áureo são grandezas incomensuráveis. (Veja a definição deste e de outros conceitos correlatos na pág. 6 do número 5 da RPM.) Se fossem comensuráveis, teriam um submúltiplo comum s, de sorte que, com referencia à Fig. 1, onde a e b seriam então números inteiros. Em conseqüência, todos os números da seqüência (2) seriam inteiros e positivos. Isto é um absurdo, pois não existe seqüência infinita e decrescente de números inteiros positivos. Concluímos, então, que os lados de um retângulo áureo são incomensuráveis.
O retângulo áureo está intimamente ligado com a chamada divisão áurea de um segmento, ou divisão em média e extrema razão, que introduziremos a seguir. Diz-se que um ponto C de um segmento AB (Fig. 6) divide este segmento em média e extrema razão se
A relação (3) é precisamente a relação (1) se pusermos AC = a e CB = b, de sorte que os segmentos AC e CB da divisão áurea (ou AB = a + b e AC = a) são os lados de um retângulo áureo. É
interessante notar que se C1 divide AB em média e extrema razão,
e se marcarmos no segmento AB os pontos C2, C3, C4,...
de tal maneira que AC2 = C1B, AC3 = C2C1,
AC4 = C3C2, ... (Fig. 7), então Cn
divide ACn-1 em média e extrema razão n = 2, 3, 4,... Este
resultado segue facilmente do que já provamos antes sobre a seqüência
infinita.
de retângulos áureos, donde segue também que os segmentos AC1 e C1B da divisão áurea de AB são incomensuráveis. Sugerimos que o leitor faça uma demonstração completa destes resultados. Como já observamos há pouco, as relações (1) e (3) são idênticas quando pomos AC = a e CB = b. Delas segue-se que b2 = ab = a2. (4) O número m = b/a é conhecido como a razão áurea. Dividindo a equação anterior por a2 obtemos: m2 + m = 1. (5) O primeiro membro torna-se um quadrado perfeito quando lhe adicionamos 1/4:
ou seja, Extraindo a raiz quadrada e notando que m > 0, teremos: portanto,
Vamos construir um retângulo áureo a partir de seu menor lado AE = a (Fig. 8). Para isso construímos EF = AE perpendicularmente a AE. Com centro em G, ponto médio do segmento
AE, traçamos o arco
Simplificando, obtemos daqui a relação (4) que, como vimos, equivale à relação (1). Logo ABCD é um retângulo áureo. Se o problema fosse dividir o segmento AE = EF em média e extrema razão, bastaria completar a construção anterior marcando, no segmento AE, o ponto H tal que AH = b (Fig. 9).
É surpreendente que a razão áurea esteja intimamente relacionada com a chamada seqüência de Fibonacci, como veremos a seguir, pois aparentemente uma coisa nada tem a ver com a outra. Leonardo de Pisa, muito conhecido como Fibonacci (filho de Bonaccio), viveu no período de aproximadamente 1170 a 1250. Ele foi educado na África e viajou muito pela Europa e Ásia Menor. Tornou-se famoso por conhecer muito bem toda a Matemática então acumulada. Em 1202 ele publicou o Liber Abaci, ou Livro do Cálculo, que teve importância decisiva na tarefa de tornar conhecida na Europa a Matemática dos árabes e hindus. Foi esse livro que popularizou no Ocidente o uso dos algarismos arábicos e os métodos hindus de cálculo com números inteiros, frações e raízes. A seqüência de Fibonacci aparece num dos problemas tratados no Liber Abaci e que consiste no seguinte: Um
casal de coelhos torna-se produtivo após dois meses de vida e, a partir
de então, produz um novo casal a cada mês. Começando com um único
casal de coelhos recém-nascidos, quantos casais existirão ao final de um
ano? Vamos
designar com fn o número de casais de coelhos existentes após
n meses. Evidentemente,
1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34, 55, 89, 144,... Que
relação pode existir entre esta seqüência e a razão áurea?
Aparentemente nenhuma. No entanto, vamos demonstrar agora – para
surpresa de todos nós! ... – que a razão
áurea m é o limite, com n
Para isto, começamos reescrevendo a seqüência (2) sem os seus três primeiros elementos, a + b, a, b, isto é,
onde
Vamos demonstrar que esta lei de formação (9) equivale a
Para
isto, vamos provar que se a lei de formação (10) vale para 4 Daqui e de (10), com n = k – 1 e n = k, vem
como que é precisamente (10) com n = k + 1. Fica
assim demonstrado que se a lei de formação (10) vale para 4
Prosseguindo
agora na demonstração de (7); lembremos que os elementos an
da seqüência (2) se aproximam de zero com n
ou
seja, É claro que isto pode ser escrito na forma (7), C.Q.D. A título de curiosidade, vamos calcular fn-1 / fn com três casas decimais, para n = 1, 2, ..., 8:
Para n
A divisão áurea é conhecida desde os pitagóricos de cinco séculos A.C. Ao que tudo indica, essa divisão foi descoberta no pentágono regular, que exibe uma surpreendente profusão de segmentos na razão áurea. Talvez este tenha sido o motivo que levou os pitagóricos a adotarem o pentagrama (pentágono regular estrelado) como símbolo de sua seita (Fig. 10).
Como exemplo de ocorrência da divisão áurea num pentágono regular convexo mencionamos que a interseção de duas de suas diagonais divide qualquer delas em média e extrema razão. Assim, na Fig, 11, Deixamos ao leitor a tarefa de demonstrar esse resultado. É
muito improvável que Pitágoras ou seus primeiros discípulos soubessem
que os segmentos da divisão
áurea fossem incomensuráveis, embora haja fundadas razões para se
acreditar que a descoberta dos incomensuráveis tenha ocorrido com o pentágono
regular no fim do 5 Na antiguidade, a divisão de um segmento em média e extrema razão tornou-se tão familiar que era conhecida simplesmente como a “seção”, em qualquer qualificativo. O nome “divisão áurea” lhe foi dado por Kepler (1571-1630), que escreveu:
Tanto a razão áurea, como os números de Fibonacci, aparecem numa variedade enorme de situações inesperadas (veja a ref. [2] e o cap. 5 da ref. [3]). Hoje a literatura sobre os números de Fibonacci é enorme. Existe até uma revista – The Fibonacci Quartely – fundada em 1963, dedicada à pesquisa em torno desses números! Ao concluir este artigo, deixamos dois problemas ao leitor: 1. Demonstre que num triângulo isósceles, com ângulos de 72º, 72º e 36º, a bissetriz interna de um dos ângulos de 72º divide o lado oposto em média e extrema razão. 2. Use o resultado anterior para construir o decágono e o pentágono regulares inscritos num círculo dado. O leitor que tiver dificuldade com esses problemas, poderá se valer da seção 2.4 da ref. [1]. Referências
[1]
A. Aaboe, Episódios da História Antiga da Matemática, Coleção
Fundamentos da Matemática Elementar, SBM, 1984.
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