Fabiano de Araújo Pinto
Itaperuna-RJ

Sou professor da rede estadual de ensino do Rio de Janeiro e, aproveitando o final de minhas férias, resolvi escrever essas notas para dividir a experiência, que passo a relatar, com outros professores, leitores da revista.

Sempre achei importante explicar aos alunos o porquê das coisas em Matemática, principalmente no campo geométrico. Por exemplo, quando eles perguntam por que a área de um círculo de raio r é dada por r2, respondo apresentando o método da exaustão utilizado por Arquimedes (ver RPM 10, p. 11 e RPM 51, p. 15.) Mas, quando a pergunta foi sobre a fórmula do volume da esfera, precisei pesquisar um pouco mais sobre como esse verdadeiro gênio chamado Arquimedes chegou na conhecida fórmula.

Arquimedes, na sua obra Sobre a esfera e o cilindro, escreveu e demonstrou, utilizando um método análogo ao utilizado para determinar a área de um círculo (método da exaustão), o seguinte teorema:

O volume de uma esfera é igual a quatro vezes o volume de um cone que tem como base o círculo máximo da esfera e como altura o raio da esfera.

Arquimedes sabia que o volume do cone que tem por base um círculo de raio r e altura h é dado por (1/3)r2h, ou seja, (1/3)r3 no caso r = h.

Desse modo, o teorema fornece, para volume da esfera, a conhecida expressão (4/3)r3.

Mas julguei que apenas essa informação não seria adequada para meus alunos.

Fui, então, atrás do processo utilizado por Arquimedes para intuir qual seria a fórmula do volume da esfera, o que ele costumava fazer, antes de procurar uma prova.

Na época de Arquimedes já se sabia que o volume de um cilindro, tendo por base um círculo de raio r e altura r, é dado por r2.r ou r3 e que a razão entre os volumes de dois sólidos semelhantes é igual ao cubo da razão de semelhança (*). Como duas esferas quaisquer são semelhantes, sendo a razão de semelhança igual à razão entre seus raios, já se sabia que o volume da esfera é proporcional ao cubo do raio. Faltava determinar a constante de proporcionalidade.

Arquimedes apresenta, na sua obra O Método, várias situações em que ele usou o raciocínio físico para prever certos resultados matemáticos. Elaborei, então, a experiência que passo a descrever, para justificar a fórmula do volume da esfera.

Mandei confeccionar um cilindro de madeira e uma esfera da mesma madeira. A esfera de raio r e o cilindro de altura r tendo por base um círculo de raio também igual a r.

Sendo os dois sólidos construídos do mesmo material, consideramos ambos com densidade igual a 1 e, a essa altura, uma balança resolveria o problema, pois a razão entre os volumes é a razão entre as massas.

Optamos, entretanto, pelo uso da alavanca, até para relembrar a conhecida afirmação de Arquimedes ao rei de Siracusa, referindo-se a alavancas: "Dê-me um ponto de apoio e eu moverei o mundo".

Pois bem, para usar o princípio das alavancas, procuramos o ponto de apoio, em uma barra de madeira que sustentava os dois corpos, esfera e cilindro, de modo a equilibrar os dois corpos. Notamos que o ponto não era eqüidistante do cilindro e da esfera. Chamamos de Lc a distância do centro da base do cilindro a esse ponto e de Le a distância do centro da esfera ao ponto.

Assim, denotando por mc = Vc a massa e o volume do cilindro e por me = Ve a massa e o volume da esfera, respectivamente, e usando o princípio das alavancas - o produto da massa do cilindro pela sua distância ao ponto de apoio é igual ao produto da massa da esfera pela sua distância ao mesmo ponto -, obtivemos

mc Lc = me Le   ou   Vc Lc = Ve Le.

Como Vc = p/r3 chegamos a Ve = pr3 Lc / Le.

Medimos então a razão Lc / Le , obtendo 4/3, aproximadamente, pois toda medida tem sua margem de erro. Com efeito, o fato de que o valor dessa constante é exatamente 4/3 exige uma prova teórica.

A aula ficou mais interessante por usar material concreto e também por resgatar o pensamento genial do grande Arquimedes.

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(*) O tema deste artigo já foi tratado anteriormente na RPM 10, p.14, no artigo de Geraldo Ávila, intitulado Arquimedes, a esfera e o cilindro, do qual vale reproduzir uma observação: ... Arquimedes nunca escreveu as fórmulas do volume e da área da esfera, como de resto nunca escreveu fórmula alguma. Não há, em todos os seus livros, uma única fórmula, porque a Matemática Grega era essencialmente geométrica. As relações métricas eram sempre expressas na forma de proporções ...

Teorema: Todo o ângulo obtuso é reto

Vamos dar uma demonstração deste absurdo teorema.

Seja AB um segmento qualquer. Construímos então, de um mesmo lado da reta AB, dois segmentos de mesmo tamanho, AC e BD. O segmento AC é perpendicular a AB e o segmento BD não é perpendicular a AB. Na figura a seguir, o segmento BD faz com AB um ângulo maior que 90o.

Os segmentos AB e CD não são portanto paralelos e têm comprimentos diferentes. Logo, suas mediatrizes não são paralelas e, portanto, se cortam em um ponto que chamaremos P.

Como P está na mediatriz de AB, então PA = PB. Como P está na mediatriz de   CD, então PC = PD, e como AC = BD, por construção, então os triângulos PAC e PBD são congruentes. Logo, os ângulos PAC e PBD são iguais e, como os ângulos PAB e PBA são iguais porque o triângulo PAB é isósceles, concluímos que o ângulo ABD, que é maior que 90o, é igual ao ângulo BAC que é reto, CQAD, como queríamos absurdamente demonstrar.

Nota

Tomando o suplemento de cada ângulo obtuso, concluímos também que todo ângulo agudo é reto. Portanto, fica demonstrado que qualquer ângulo é reto.