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Vicenzo
Bongiovanni
Perguntas como essas são formuladas tanto por estudantes como por professores. Este artigo vai contar por que um mesmo quadrilátero pode parecer na literatura matemática com definições diferentes. E uma nota da redação, NR, vai dizer, na opinião da RPM, como um professor pode lidar com tal situação. A geometria que se estuda hoje nas escolas tem suas origens num livro chamado Os Elementos escritos aproximadamente em 300 a.C por Euclides. É na Grécia que nasceram as principais idéias da geometria. E é lá que iremos ver como Euclides tratava os quadriláteros. Na definição 19 do livro I de Os Elementos, Euclides define “figura quadrilátera” como sendo aquela “contida por quatro linhas retas” . Em seguida, na definição 22, ele apresenta caracterizações de alguns quadriláteros notáveis: Quadrado é uma figura quadrilátera de quatro lados iguais com ângulos retos. Oblongo é uma figura quadrilátera com ângulos retos, mas que não tem quatro lados iguais. Rombo é uma figura quadrilátera com quatro lados iguais, mas não com ângulos retos. Rombóide é uma figura quadrilátera que tem lados e ângulos opostos iguais entre si, mas não tem quatro lados iguais e nem ângulos retos.
Podemos observar que o oblongo de Euclides é um caso particular do hoje denominado retângulo, que o rombo é um caso particular do nosso losango e que rombóide é um paralelogramo particular. Representaremos a seguir, por uma diagrama de Venn, os conjuntos dos quadriláteros notáveis definidos por Euclides. Entre os textos de geometria que foram importantes no ensino, depois dos Elementos de Euclides, estão os Elementos de Geometria de Legendre (1793) e o tratado de Hadamard (1898), Leçons de géométrie élémentaire. Legendre, que preconiza uma geometria mais rigorosa e menos intuitiva caracterizava os quadriláteros notáveis da seguinte maneira: O quadrado tem seus lados iguais e seus ângulos retos. O retângulo tem ângulos retos sem ter os lados iguais O losango tem os lados iguais sem que os ângulos sejam retos. O paralelogramo tem os lados opostos paralelos. Podem-se observar algumas diferenças entre as definições de Legendre e as de Euclides. O oblongo e o rombo de Euclides passam a se denominar respectivamente retânguloe losango. O rombóide recebe o nome de paralelogramo, mas o seu conceito é ampliado: agora, o paralelogramo apresenta os lados opostos paralelos. Essa alteração na definição permite que os quadrados, os retângulos e os losangos sejam também classificados como paralelogramos. Mais tarde, em 1898, Hadamard caracteriza os quadriláteros notáveis de uma maneira mais ampla: Quadrado é um quadrilátero que tem todos os lados iguais e todos os ângulos iguais. Retângulo é um quadrilátero que tem todos os ângulos iguais e, conseqüentemente, retos. Losango é um quadrilátero que tem os quatro lados iguais. Paralelogramo é o quadrilátero que tem os quatros lados paralelos dois a dois. Nessas novas definições, as restrições impostas aos retângulos e aos losangos foram eliminadas: agora todo quadrado pode ser considerado losango e retângulo. É importante observar que o processo que permitiu evoluir para as definições modernas de Hadamard levou muitos anos. Durante séculos, a obra de Euclides serviu de modelo para o ensino da geometria e cada novo autor de manual de geometria respeitava a divisão dos conteúdos da obra de Euclides bem como as definições e proposições.
Voltando ao ensino dos quadriláteros, podemos dizer que as concepções dos nossos alunos relativas às definições dos quadriláteros notáveis, nas series iniciais, assemelham-se muito às de Euclides e Legendre. Os quadrados, losangos, retângulos e paralelogramos são identificados dentro de quatro classes distintas de objetos matemáticos. Quando as definições mais amplas são introduzidas, perece-nos que uma dificuldade do aluno em aceitá-las, está no fato de ter que fazer corresponder a um único nome (por exemplo retângulo), objetos matemáticos representados por formas diferentes (retângulo e quadrado). Compete as nós professores de Matemática, a tarefa de acolher o saber trazido pelos alunos (e que não está errado!) e de fazê-lo progredir lentamente para uma concepção mais ampla, como a de Hadamard, generalizando proposições relacionadas com quadriláteros. NR Mal comparando, problemas causados pelas definições diferentes de alguns quadriláteros são como problemas causados por alguns mosquitos: incomodam, mas não são graves. O que o professor pode fazer: 1. Adotar uma das definições existentes (nunca inventar novas definições). Se a classe estiver usando um livro texto, adotar, de preferência, a definição dada no livro. 2. Avisar os alunos que talvez eles encontrem definições ligeiramente diferentes, pois, historicamente, elas sempre existiram. 3. Responder coerentemente a perguntas como as do início deste artigo se forem feitas por alunos, mas não provocar esse tipo de questionamento. Reforçando nosso argumento: O que é importante saber sobre o losango? Que é um paralelogramo;
que seus lados são congruentes; que suas diagonais são perpendiculares.
Falar sobre os ângulos do losango é uma “questão
de gosto”. Se eles puderem ser retos, o quadrado é losango.
Se eles não puderem ser retos, o quadrado não é um
losango. Só isso!
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