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José Luiz
Pastore Mello
Apresentamos, neste artigo, um problema trigonométrico de maximização enunciado no século XV e uma sugestão de aplicação em sala de aula. As atividades descritas permitem que o professor trabalhe a trigonometria de forma menos técnica e mais contextualizada, de acordo com a recomendação dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática do ensino médio.
A cidade de Kõningsberg, na Prússia (atual Rússia), é conhecida na Matemática devido ao famoso problema das pontes, resolvido pelo matemático suíço Leonhard Euler (1707-1783): ver RPM 3, p. 12. Outro acontecimento importante que marca a vida da cidade, cujo nome significa Montanha do Rei, é o fato de ela ter sido o local de nascimento de Johann Müller (1436-1476), um dos maiores matemáticos do século XV, mais conhecido como Regiomontanus, uma latinização do nome de sua cidade natal. Regiomontanus realizou diversos estudos nas áreas de Astronomia, Geometria e Trigonometria. Em seu livro mais famoso, De Triangulus Omnimodes, escrito em 1464 e impresso apenas em 1533, Regiomontanus apresenta uma visão moderna da Trigonometria com dados tabelados de várias funções trigonométricas. É curioso notar que, mesmo tendo sido escrito antes do conceito de notação decimal, as tabelas trigonométricas contidas no livro não apresentam frações devido à utilização de um círculo de raio 100 000 000 de unidades, o que produzia apenas valores inteiros para as aproximações utilizadas. A importância dos conhecimentos em Astronomia de Regiomontanus fez com que ele fosse convidado pelo Papa Sixto IV para trabalhar na confecção de um calendário mais acurado do que o que vinha sendo usado pela Igreja. Após a realização do trabalho, a gratidão do Papa foi tal que rapidamente o astrónomo se tornou seu principal conselheiro. Depois de um ano em Roma, Regiomontanus faleceu, tendo sido anunciada como causa de sua morte o flagelo de uma peste. Existem especulações de que ele tenha sido envenenado por alguma pessoa descontente com a alta influência de um "não italiano" sobre o Papa e a Igreja romana. Alguns historiadores especulam ainda que, se não tivesse falecido tão cedo, talvez tivesse condições de realizar uma moderna compreensão do sistema solar, como a feita por Copérnico 100 anos depois [2]. Entre os interessantes problemas propostos por Regiomontanus, destacamos um de 1471 que é citado na referência [1] como o primeiro problema de extremos encontrado na História da Matemática desde a antiguidade. O problema (NR) é o seguinte: Suponha uma estátua de altura h sobre um pedestal de altura p. Um homem de altura m (m < p) enxerga do pé ao topo da estátua sob um ângulo , que varia de acordo com a distância d entre o homem e a base do pedestal. Determinar d para que o ângulo de visão a seja o maior possível.
NR: O problema tratado neste artigo já foi publicado e resolvido na seção O leitor pergunta da RPM 7 (1985). Considerando o tempo decorrido desde sua publicação e o interesse do problema, optamos por republicá-lo.
Apesar de o problema poder ser resolvido com as ferramentas do Cálculo, existe uma solução simples e engenhosa que apresentaremos a seguir. Inicialmente marcamos na figura os pontos A, B e C representando respectivamente o topo da estátua, o pé da estátua e os olhos do observador. Em seguida traçamos a reta r que passa por C e é paralela à linha do chão. Traçamos então a única circunferência , com centro na mediatriz do segmento AB, que passa pêlos pontos A e B e tangencia a reta r. Marcamos, na figura, C como o ponto de tangência. Se C percorrer livremente a reta r, qualquer possibilidade para o ângulo de visão será dada por uma certa localização de C em r. Provaremos que assume o maior valor possível quando C coincide com Ct . Para isso, mostraremos que = medida ACtB é maior que = medida para qualquer posição de C diferente de Ct. Se D é o ponto de encontro da reta AC com a circunferência , temos
Por outro lado, no triângulo BCD, temos + + 180° = 180°. Logo, = + implicando > . Uma vez verificado que é o ângulo de máximo campo visual, determinaremos agora a distância d, entre o observador e a base do pedestal, para que esse ângulo seja atingido. Se Q é o ponto de intersecção da reta AB com r, sendo as retas r e AB, respectivamente, tangente e secante a , aplicando potência no ponto Q encontraremos a distância d procurada:
Se a altura m do observador for pouco significativa em relação à altura da estátua e do pedestal, podemos simplificar a fórmula para
Em outubro de 1931, após cinco anos de construção, foi inaugurado no alto do morro do Corcovado o cartão de visitas do Rio de Janeiro, a estátua do Cristo Redentor. A altura total da estátua é 30 m, seu pedestal mede 8 m, e admitiremos um observador com 1,70 m de altura. A que distância esse observador deve ficar da base do pedestal do Cristo Redentor para que o seu ângulo de visão seja o maior possível?
Referências bibliográficas [l] DÖRRIE, HEINRICH. 700 Great Problems of Elementary Mathematics: their historyand solution. NY: Dover Publications, 1989. [2] JOHNSON, ART. Famous Problems and their mathematicians. Englewood, Colo:Teacher Ideas Press, 2000.
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