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Luís Fernando Mello
Em 1982, a seleção brasileira de futebol encantava os amantes da arte futebolística na Copa do Mundo realizada na Espanha. Não era para menos, uma vez que o time contava com talentos do calibre de Júnior, Cerezo, Falcão, Sócrates e Zico. Pouco tempo depois, em 1985, três químicos, Harold W. Kroto, Robert F. Curi e Richard E. Smalley, surpreenderam a comunidade científica com o anúncio da descoberta dos fulerenos (Nature, volume 318, p. 162), uma forma alotrópica de carbono e a primeira molecular, à qual deram o nome de buckminsterfulereno ou simplesmente C60. (NR) Em 1996, Kroto, Curi e Smalley foram laureados com o Prêmio Nobel de Química. Dois anos antes éramos tetracampeões mundiais de futebol na Copa dos Estados Unidos com um time esforçado, que não encantava e tinha apenas um grande destaque: o baixinho Romário. Do ponto de vista químico, o C60 nada mais é do que uma molécula formada por 60 átomos de carbono com cada um desses átomos ligado a três outros. Do ponto de vista matemático, a estrutura das ligações desses 60 átomos de carbono forma um poliedro convexo cujos 60 vértices são exatamente os átomos de carbono e as arestas são suas ligações químicas. As faces desse poliedro são hexágonos e pentágonos. Depois do C60, outros fulerenos foram descobertos, tais como C70, C76, C240, C540,..., em que os subíndices correspondem ao número de átomos de carbono. Estudando a síntese de quantidades macroscópicas de fulerenos, Sumio Iijima, em 1991, descobriu outros tipos de moléculas de carbono e as denominou nanotubos: tubos cilíndricos de diâmetros da ordem de 8 nm a 15 nm (l nm é igual a 10-9m), empacotados um dentro do outro como diversas camadas de uma cebola e com as extremidades fechadas por hemisférios fulerênicos.
Exemplos de nanotubos
Mas nem tudo eram flores naquela época. Em 1990, nossa seleção nacional fracassava nas fases iniciais da Copa do Mundo da Itália. Recentemente foi descoberto que os nanotubos são flexíveis e mais resistentes que qualquer aço, e têm propriedades elétricas especiais, sendo, por exemplo, melhores condutores elétricos que o cobre. Várias aplicações envolvendo os nanotubos já estão sendo implementadas (veja Scientific Amerícan Brasil, número l, p. 41).
Do ponto de vista matemático, a estrutura das ligações dos átomos de carbono dos fulerenos (nanotubos) forma um poliedro convexo cujos vértices são tais átomos. Podemos então utilizar a conhecida fórmula de Euler para poliedros convexos, V A + F = 2 (1) para saber um pouco mais a respeito dessas estruturas, lembrando que V é o número de vértices, A é o número de arestas e F é o número de faces do poliedro. Inúmeros são os artigos que tratam de Euler e dessa fórmula. Publicados aqui na RPM temos os artigos de Guilherme M. de La Penha (RPM 3, p. 2 e p. 12), que tratam de aspectos da biografia de Euler e da aplicação de sua fórmula (1) na Teoria dos Grafos, respectivamente; de Luiz Márcio P. Imenes e José Jakubovic (RPM 3, p. 5) que faz um estudo dos poliedros regulares; de Zoroastro Azambuja Filho (RPM 3, p. 15) e de Elon Lages Lima (RPM 5. p. 23), ambos apresentando belas demonstrações da fórmula (1); de João Bosco Pitombeira (RPM 11, p. 9), aplicando a fórmula (1) no estudo da planaridade de grafos; de Eduardo Wagner (RPM 47, p. 5), estudando condições necessárias para a existência de poliedros conhecendo-se V, A e F que satisfazem (1). Outra belíssima aplicação da fórmula (1) no contexto da Teoria dos Grafos está na sua utilização na demonstração do Teorema das Cinco Cores: Todo mapa pode ser colorido com no máximo cinco cores (veja J. L. Gersting, Fundamentos Matemáticos para a Ciência da Computação, 4a edição, LTC Editora, p. 253).
Se um poliedro convexo possui apenas faces hexagonais e pentagonais e, em cada vértice, incidem exatamente 3 arestas, então ele possui exatamente 12 faces pentagonais. (*) Para mostrar esse resultado, observamos primeiro que: cada face hexagonal do poliedro possui 6 arestas em sua fronteira, cada face pentagonal possui 5 arestas em sua fronteira e cada aresta é parte da fronteira de duas faces. Assim, se indicarmos por FH e FP o número de faces hexagonais e poligonais respectivamente, teremos 6FH + 5FP = 2A. (2) Por outro lado, como cada aresta liga dois vértices e (por hipótese) de cada vértice partem três arestas, temos: 2A = 3V (3). Da fórmula de Euler (1) segue então que V A + FH + FP = 2 . Multiplicando por 6 e usando (2) e (3), obtemos:
Nas moléculas de fulerenos e nanotubos, cada átomo liga-se exatamente a 3 átomos de carbono e podemos, portanto, concluir do resultado que elas têm que possuir exatamente 12 faces pentagonais.
A essa altura do campeonato você pode estar indagando o que toda essa história de poliedro convexo, fulereno e nanotubo tem a ver com futebol. Uma rápida olhada nos jogos transmitidos pela televisão, ou mesmo no seu armário, será suficiente para se convencer de que, de fato, essas coisas estão relacionadas. Você já reparou que alguns modelos de bolas de futebol são fabricados com gomos hexagonais e pentagonais? Dê uma olhada! Agora, um tal modelo de bola de futebol nada mais é do que um poliedro convexo com faces hexagonais e pentagonais inflado.
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