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Helder
de Carvalho Matos O
jogo de quadrinhos é muito conhecido e tão simples que pode ser
explicado em poucas palavras. Ele é jogado num quadriculado de pontos
como ilustra a Fig. 1.
Cada
jogador marca uma aresta unindo dois vértices na mesma horizontal ou na
mesma vertical (Fig. 2)
e
toda vez que um dos jogadores, ao colocar uma aresta, completar um
circuito fechado, ele tem direito (e obrigação) de marcar nova aresta (é
importante não confundir “circuito fechado”com “quadrinho unitário”
ou, simplesmente, “quadrinho”. Embora todo quadinho seja um circuito
fechado, este pode ser mais geral que um simples quadrinho, como ilustra a
Fig. 3).
Ganha
o jogador que fechar o maior número de quadrinhos e o jogo termina quando
o quadriculado original ficar reduzido apenas a quadrinhos. Para facilitar
a contagem, os jogadores marcam os quadrinhos que vão fechando com sua
inicial. Por exemplo, se Herculano joga com André, o jogo pode terminar
com a vitória de André (Fig. 4)
O jogo de quadrinhos é largamente jogado em fundos de salas de aulas, sobretudo quando a aula fica muito chata ... E foi depois de muito jogar em tais circunstâncias que acabei descobrindo como prever, em qualquer jogo, qual dos dois jogadores ganhará (ou, pelos menos empatará) o jogo. Daremos
algumas definições preliminares. Diremos
que o jogo se encontra numa situação quase final quando no
quadriculado não existirem quadrinhos com três arestas, mas um tal
quadrinho forçosamente se formará.
com
o acréscimo de qualquer nova aresta (Figs 5 e 6). Chamaremos corredor
a uma seqüência de quadrinhos que serão fechados por jogadas sucessivas
de um mesmo jogador. (Fig. 6)
Quando
um jogo se encontra em situação quase final, como ilustra a Fig. 6, ele
consiste exclusivamente de corredores e qualquer aresta adicional
precipita o fechamento de quadrinhos ao longo de um corredor. Vamos
enumerar os corredores em ordem crescente (mais precisamente, não-decrescente)
de seu tamanho. Por tamanho de um corredor entendemos o número de
quadrinhos que ele produz com os fechamentos sucessivos. No caso da Fig.
7,
Vamos
supor, como é natural, que cada jogador proceda da maneira a não
entregar quadrinhos; e se for obrigado a entregar alguns, que entregue o
menor número possível, sito é, que entregue o corredor que tenha menos
quadrinhos a fechar. Chamaremos esse procedimento de perda mínima.
Veremos, logo adiante, que tal procedimento não assegura vitória, ou
mesmo empate; mas permite prever quem vai ganhar (ou empatar) o jogo. Observemos
agora que o jogador que fechar o último corredor (o de número r), fecha
também os de números r –2 , r –4, ..., e o outro jogador fechará os
corredores r –1, r –3, r –5, ... Há dois casos a
considerar, conforme r seja par ou ímpar. 1º
caso: r par. O jogador
que fechar o último corredor ganhará um número de quadrinhos igual a S1
= Cr + Cr-2
+ ... + C2 E
o outro jogador ficará com S2
= Cr-1
+ Cr-3
+...+ C1 quadrinhos. 2º
Caso: r ímpar: O jogador que fechar o último corredor ganhará. S1
= Cr + Cr-2
+ ... + C1 quadrinhos,
ao passo que o outro ficará com S2
= Cr-1
+ Cr-3
+...+ C2 quadrinhos. Vamos colocar esses dois casos a lado, em colunas, o que nos permite comparar as somas S1 e S2.
Isto
permite constatar, facilmente, que o jogador que terminar o jogo sempre
levará vantagem e certamente ganhará se r for impar, pois neste caso, S1
é estritamente maior que S2. Portanto, a estratégia para
ganhar (ou, pelos menos, empatar) o jogo é, assegurar-se de fechar o último
corredor. Quando, ainda no 2º grau, eu me divertia com o jogo de quadrinhos, acabei percebendo a necessidade de ganhar o último corredor para não perder o jogo. E acabei descobrindo também que se o número de vértices for ímpar, então ganha ou empata o primeiro jogador (o que começa o jogo); ao passo que se o numero de vértices for par, então ganha ou empata o segundo jogador. Para
estabelecermos esse resultado, vamos considerar o jogo já em situação
quase final, quando então vale a seguinte formula de Euler generalizada*[
: A
+ r = V + R –2, onde
A é o número de arestas, r o numero de corredores, V o número de vértices
e R o número de regiões. As figs. 6 e 7 ilustram jogos com uma única
região cada um, que é o plano todo. Já as Figs. 8 e 9 mostram jogos com
três regiões cada um: R1, R2 e R3.
Para determinar quem ganha o último corredor e, portanto, ganha ou empata o jogo, vamos primeiro supor que R = 1 quando o jogo chega a uma situação quase final. Isto significa que no quadriculado não há circuitos fechados. Então, a fórmula de Euler nos dá. A
+ r = V – 1. Temos de examinar duas hipóteses, conforme V seja ímpar ou par e cada uma delas comporta dois casos. 1ª
hipótese: V é impar. Então A + r é par, daí os dois casos
seguintes: Caso
1a: A e r ambos pares. Disto decorre que foi o segundo jogador quem
colocou a última aresta (pois A é par), levando o jogo a situação
quase final. Portanto, é o primeiro jogador que entregará o primeiro
corredor ao segundo; e como r é par será primeiro quem fechará o último
corredor, ganhando ou, pelo menos, empatando o jogo.
Caso 1b: A e r ambos ímpares. Então, foi o primeiro
jogador quem colocou a última aresta (pois A é impar), levando o jogo a
situação quase final. Em conseqüência, o segundo jogador entregará o
primeiro corredor ao primeiro jogador; e como r é impar, o primeiro
jogador fechará o último corredor, ganhando o jogo, pois neste caso não
há empate. 2ª
hipótese: V é par. O raciocínio aqui é inteiramente análogo ao da
1ª hipótese, com dois casos a considerar. A única diferença é que
agora quem ganha ou empata o jogo é o segundo jogador. Falta examinar o caso em que R > 1. Ora, quando o jogo começa, R = 1, pois só temos uma região, que é o plano todo. E, se R permanecer igual a 1 até a situação quase final, um dos jogadores é o favorecido; como acabamos de ver, trata-se do primeiro se V for ímpar e do segundo se V for par. Se um dos jogadores decide fechar um circuito, ele altera a paridade de V + R –2, na situação quase final, portanto altera a paridade da soma A + r na fórmula de Euler e, repetindo os argumentos já usados, o anteriormente favorecido passa a ser desfavorecido. Mas lembremos que pelas regras do jogo, o próprio jogador que fechou um circuito é obrigado a colocar uma nova aresta, o que novamente altera a posição dos jogadores, restabelecendo, as previsões originais. Isto completa a demonstração do teorema em todos os casos.
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