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O assunto “números primos” costuma ser apresentado ao aluno durante a 5a série do ensino fundamental e daí para frente é praticamente abandonado. Quando o aluno se encontra no ensino médio já está mais amadurecido para a Matemática, mas os números primos quase não reaparecem, o que é uma pena. O conhecimento específico de temas do ensino médio , aliado ao fascínio que os números primos sempre despertam, poderia ser utilizado tanto para fixar melhor o conteúdo específico, quanto para despertar no aluno o gosto por problemas desafiadores de Teoria dos Números. Nosso objetivo é partilhar com os leitores da RPM alguns problemas que envolvem números primos e que poderiam ser utilizados em suas aulas. Vamos inicialmente relembrar alguns fatos básicos em relação aos números naturais. Definição 1: Um número natural é primo se ele possui apenas dois divisores positivos e distintos. Essa definição é equivalente à seguinte, que é encontrada mais freqüentemente: Definição 2: Um número natural é primo se ele é maior do que 1 e é divisível apenas por si próprio e por 1. Da definição, decorre a seguinte seqüência de números primos: (2, 3, 5, 7, 11, 13, 17, 19, 23, 29, 31, 37...) e, como podemos observar, com exceção do 2, todos os demais números primos são ímpares. Há alguns anos, num dos grandes vestibulares nacionais, apareceu a seguinte pergunta: escolhido ao acaso um divisor positivo do número 60, qual é a probabilidade de ele ser primo? Um número significativo de alunos errou essa questão, porque considerou 1 como sendo primo. É uma pergunta freqüente dos alunos: por que não considerar 1 como primo? A resposta está no bem conhecido Teorema Fundamental da Aritmética: "todo número natural maior do que 1 pode ser expresso de maneira única, a menos da ordem, como produto de números primos". Se considerássemos 1 como primo, não haveria a unicidade acima ( , etc.) e isso traria vários inconvenientes técnicos no desenvolvimento da Teoria dos Números. Salientamos que os gregos já conheciam muitas propriedades dos números primos e que Euclides apresenta, nos Elementos, uma demonstração muito elegante da existência de infinitos números primos (ver RPM 11 e 20).
Vejamos alguns problemas (e probleminhas...)
que acreditamos possam ser interessantes aos nossos alunos. Apresentamos as
soluções de alguns deles para ilustrar o tipo de trabalho que sugerimos e
deixamos outros para os leitores tentarem suas próprias soluções. No
próximo número da revista, RPM 48, estarão publicadas as soluções de todos os
problemas aqui propostos. P1. Escreva o número 91 como soma de dois números primos. Solução: Os alunos não deverão ter dificuldade em perceber que, como a soma de dois ímpares é par e como 2 é o único primo par, os números são 2 e 89. Aliás, esse pode ser um bom momento para recordar com os alunos os testes de primalidade, para verificar que 89, efetivamente, é primo.
P2. Eu e meu irmão caçula temos idades entre 10 e 20 anos e hoje nossas idades são expressas ambas por números primos, fato que se repetirá pela próxima vez daqui há 18 anos. Determine minha idade sabendo que a idade de nosso irmão mais velho, que, hoje, também é um número primo, é uma unidade maior do que a soma das nossas idades.
P3. Uma equação do 2o grau, cujos coeficientes são todos números primos, pode apresentar duas raízes iguais?
P4. Os números a, b e podem ser todos primos? A resposta aos dois problemas acima é não, e eles não devem apresentar maiores dificuldades ao leitor.
P5. Quantos pontos da reta são tais que as suas duas coordenadas são números primos? Observe-se que, trocando o número 51 por outro valor, o problema pode tornar-se muito mais difícil. Para a reta somos conduzidos ao conceito de "primos gêmeos" (diferem por 2 unidades). Até hoje é um problema “em aberto” saber se existem ou não infinitos pares de “primos gêmeos”. Se tomássemos a reta obteríamos seis soluções: , , , , e , todas no primeiro quadrante e que podem ser obtidas por inspeção direta. Neste instante é natural lembrar que a famosa conjectura de Goldbach - “todo número natural par pode ser escrito como soma de dois números primos” - ainda não foi provada e nem se encontrou um contra-exemplo.
P6. As medidas dos lados de um triângulo retângulo (numa mesma unidade) podem ser números primos? Solução: A resposta é não. Do teorema de Pitágoras temos a igualdade . Sendo a, b e c primos, não podem ser todos ímpares e, como e , devemos ter ou . Digamos . Teremos então:
e analisando os possíveis valores de e , que são 1, 2 ou 4, concluímos que a situação é impossível.
P7. Para quantos pontos da circunferência as duas coordenadas são números primos?
P8. Para quantos pontos da circunferência as duas coordenadas são números inteiros? Esse problema se assemelha ao anterior, embora seja mais difícil que ele. Para resolvê-lo sugerimos a leitura de um artigo de Gilberto Garbi, “Outro belo teorema de Fermat”, publicado na RPM 38.
P9. Determine as medidas, em graus, dos ângulos internos de um triângulo acutângulo, sabendo que elas são expressas por números primos.
A mesma pergunta sem a hipótese de ser acutângulo exige um pouco mais de trabalho.
P10. Quantos divisores possui o número 2 420?
Esse exercício é uma aplicação clássica do
Teorema Fundamental da Aritmética e do Princípio Fundamental da Contagem.
P11.
Verifique que todos os
números da seqüência
,
, ...,
são números compostos (são os chamados “desertos de
primos”). P12. Quantos são os números naturais, de 1 a 100, que podem ser escritos como um produto de dois números naturais distintos entre si e diferentes de 1? Solução: De 1 a 100 temos 100 números. Para obtermos a resposta à nossa pergunta, subtraímos de 100 o número de primos entre 1 e 100, que é 25; o número de quadrados de números primos, que é 4, e o número 1. A resposta é 70.
P13. Apresente algum número natural n para o qual o valor numérico do polinômio não seja um número primo.
P14. Quantos polígonos regulares, com número par de lados, podem ter todas as diagonais expressas (numa mesma unidade) por números primos?
P15. Há dois anos, ano em que finalmente concluí meu Doutorado em Matemática, nasceu meu segundo filho e ocorreu uma notável coincidência: eu e meus dois filhos passamos a fazer aniversário no mesmo dia do ano. A partir daí outras coincidências aconteceram. No ano passado nossas três idades foram representadas por quadrados perfeitos e hoje, dia em que estamos comemorando mais um aniversário, percebo que nossas idades são representadas por três números primos. Supondo que vivamos cem anos cada um, pergunto: qual é minha idade hoje? Nos próximos anos, quantas vezes todas as nossas idades voltarão a ser representadas por números primos? Esperamos ter deixado aqui uma provocação positiva aos colegas leitores da RPM.
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