Paulo Afonso da Mata Machado

Esta é uma história inventada, mas o modo mencionado de se calcular o quórum de 3/5 é verdadeiro, não apenas na Câmara de Vereadores de Belo Horizonte, mas na própria Assembléia Legislativa de Minas Gerais.

Na comemoração dos 100 anos de Belo Horizonte saíram inúmeras publicações sobre a história de nossa cidade. Folheando uma dessas publicações, vim a saber quem foi Diogo Vasconcelos, que dá nome à conhecidíssima Praça da Savassi.

Durante os debates para a mudança da capital, Vasconcelos foi um baluarte na defesa da sua manutenção em Ouro Preto. Homem muito rico, usou sua influência para tentar convencer os deputados estaduais a votarem contrariamente à mudança. Perdeu. Entretanto, ele percebeu que, afinal de contas, uma nova capital poderia ser fonte de rendimento para um homem abonado como ele. Transferiu-se para Belo Horizonte e passou a emprestar dinheiro aos funcionários públicos que receberam lotes e estavam sem dinheiro para construir suas moradias.

Diogo Vasconcelos teve em Belo Horizonte a mesma influência que tinha em Ouro Preto. Tanto isso é verdade que conseguiu que seu nome fosse dado a uma importante praça de Belo Horizonte: a Praça da Savassi, ou melhor, Praça Diogo Vasconcelos, pois Savassi é apenas apelido.

Penso que, não obstante Diogo Vasconcelos ter sido um dos primeiros moradores de Belo Horizonte, manter seu nome numa praça que é conhecida nacionalmente por outro nome é uma atitude incoerente. Não foi o que aconteceu com a Praça 21 de Abril, pois, após a colocação da estátua de Tiradentes, o povo passou a chamá-la de Praça Tiradentes, nome que depois foi oficializado.

Outro exemplo é o da Rua do Amendoim. Por uma ilusão de ótica, a rua tem um declive que parece um aclive. Se você desligar o seu carro e baixar o freio de mão, terá a impressão de que o carro está subindo, apesar de desligado. O povo não tardou a apelidar essa via de Rua do Amendoim, por motivos óbvios. A Câmara Municipal não tardou em oficializar o nome popular.

E a Praça da Savassi, por que continua a se chamar Diogo de Vasconcelos? Procurei um vereador e convenci-o a apresentar um projeto oficializando o nome de Praça da Savassi. Apresentado o projeto, logo foi parar nos jornais. O debate ganhou os pontos dos ônibus, as mesas dos botequins, os quarteirões fechados da Praça Sete (opa!, quase me esqueci de que o nome oficial é Praça 7 de Setembro).

No dia da votação, lá estava eu na Câmara de Vereadores. Como o projeto visava a modificar a Lei Orgânica do Município, era necessário o voto favorável de  dos vereadores. Acompanhei a votação com lápis e papel na mão. Votaram a favor do projeto 23 vereadores. Como no total são 37, o projeto estava aprovado!

– Vencemos, vencemos – disse para o meu amigo vereador. Mas ele balançou a cabeça negativamente e me explicou que o quórum de  correspondia a 24 vereadores.

Retirando a calculadora do bolso, disse-lhe que não: 3/5 de 37 é igual a  22,2.  Ora,  23  é maior que  22,2.  O projeto estava aprovado!

Com minha argumentação, consegui confundir o vereador. Acostumado a considerar o quórum de  de 37 como 24, ele nunca o havia questionado. Para tirar a dúvida, pegou o regimento interno da Câmara, que diz o seguinte:

“O quorum de  será calculado da seguinte forma:

a)    se o número de vereadores for múltiplo de 5, esse número será dividido por 5 e multiplicado por 3;

b)   se o número de vereadores não for múltiplo de 5, serão somadas tantas unidades quantas necessárias para se obter um múltiplo de 5 e, em seguida, divide-se esse número por 5 e multiplica-se por 3”.

Não concordei. Afinal de contas, a lei não pode mudar uma regra matemática. E, para provar que o regimento estava errado, tomei de um lápis e expliquei:

Vamos supor um número,  V,  de vereadores, tal que  V  seja uma unidade a mais que um múltiplo de  5.  Podemos dizer que  V = 5n + 1 ,  sendo  n  inteiro. 3/5de  V  será igual a  3n+3 .  Portanto, o primeiro número inteiro imediatamente superior será  3n + 1.  Se formos obedecer ao regimento, teremos que somar quatro unidades a  V,  obtendo  , o que daria um quórum de  3n + 3 ,  portanto duas unidades a mais que o necessário.

Se raciocinarmos de forma análoga com  ,  que é o caso da composição atual
indica que 3n + 3 deveria ser o quórum, e não  3n + 3,  como se calcula pelo regimento.

Para  V = 5n + 3,  teremos o mesmo caso. O quórum deveria ser  3n +  e não  3n + 3 . O único caso em que o regimento bate com a Matemática é quando  ,  com quorum de  3n + 3 .

Não adiantou minha argumentação. O regimento teria que ser modificado, mas não valeria para aquela votação, que já havia se encerrado. Portanto, meus caros conterrâneos, acostumem-se a chamar a Praça da Savassi de Diogo Vasconcelos, pois é esse seu verdadeiro nome.

 

Curiosidade  

Imagine só,  o número  é  quaaaase  um número inteiro.  Usando um computador, você pode verificar que:

 = 262 537 412 640 768 743,999 999 999 999 2 ...