Sérgio Alves
Renate Watanabe

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RPM - O leitor pergunta
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Existe  raiz  ( ) - ésima ?

Um leitor do Maranhão pergunta: Como se justifica que o conjunto solução da equação    é , haja vista que    torna o índice da raiz negativo?

RPM: O problema está no uso do símbolo  É costume usar o símbolo   apenas para  n  inteiro, maior do que 2. Mas o autor do problema acima pode ter convencionado que o símbolo    eqüivale a  , ,  e, nesse caso, basta observar que

    e    .

É aconselhável, ao usar o símbolo , deixar bem claro qual é a interpretação dada a ele para evitar dúvidas legítimas como a levantada pelo leitor.

O número  e

Uma professora de Tocantins pergunta:  Qual é a origem do número neperiano  e?  Por que esse número é representado pela letra “e” ? O nome “neperiano” é uma homenagem a John Napier?  Onde poderíamos aplicar a função exponencial 

RPM: Essas perguntas talvez inspirem um futuro artigo na RPM tal a riqueza do tópico. Aqui, porém, seremos objetivos, tentando responder às perguntas ao pé da letra.

O número e (mais conhecido como número de Euler, e não como número neperiano) foi estudado pela primeira vez por Leonhard Euler por volta de 1720, embora a sua existência esteja implícita nos trabalhos de John Napier, um dos inventores dos logaritmos. Euler também foi o primeiro a usar a letra e,  em 1727, para designar esse número. Os logaritmos inventados por Napier em 1614 não dependiam da idéia de base porém estavam numericamente relacionados, embora não fossem iguais, aos logaritmos hoje chamados naturais ou neperianos. Grosso modo, Napier, para construir sua tábua de logaritmos, usou potências do número

Em 1667, Gregory mostrou como achar logaritmos calculando áreas de paralelogramos inscritos entre uma hipérbole e suas assíntotas. Esses fatos e os trabalhos de Newton e Leibniz sobre séries de potências serviram de base, para os trabalhos de Euler sobre o número  e.  Aos 21 anos, Euler escreveu: “Para o número cujo logaritmo é 1, escreva e,

A grande importância do número e no cálculo vem do fato de    e a sua derivada serem iguais.

(As informações acima foram tiradas de livros de História da Matemática citados freqüentemente na RPM.)

Aplicações:

O número  e  ocorre naturalmente quando o aumento ou diminuição de uma grandeza se faz proporcionalmente ao valor da grandeza num dado instante. Os exemplos a seguir foram tirados do livro Logaritmos, de Elon Lages Lima.

Juros contínuos: Se os juros de um capital  C,  a uma taxa de  k  por cento ao ano, forem capitalizados continuamente, após t anos o capital será igual a

Desintegração radioativa: Um corpo de massa  M  formado por uma substância radioativa cuja taxa de desintegração é    terá, após  t  segundos, uma massa igual a  .  

Cortando uma esfera

A interseção de uma superfície esférica  S  com um plano  p  passando pelo seu centro é uma circunferência  C  de mesmo centro e mesmo raio que  S.  Ela é chamada circunferência máxima de  S.

Um leitor de Ribeirão Preto, SP, nos envia duas questões a esse respeito.

1.   Sejam  A  e  B  dois pontos não diametralmente opostos de uma superfície esférica  S.  Como mostrar que existe uma e somente uma circunferência máxima de  S  passando por  A  e  B?  

2. Duas circunferências máximas são ditas perpendiculares se estiverem em planos perpendiculares. Dadas duas circunferências máximas quaisquer, mostrar que sempre existe uma terceira perpendicular a ambas.

RPM: Com relação à primeira pergunta, seja  O  o centro de  S.  Como  AB  e  O  são pontos não colineares, pois  A  e  B  não são diametralmente opostos, podemos considerar o plano  p  determinado pelos três pontos.

A interseção  é uma circunferência máxima que passa por  A  e  B.  Além disso, ela é única, pois, se  é um plano tal que    é uma outra circunferência máxima, então contém os pontos não colineares  AB  e  O,  o que implica    e,assim, as circunferências máximas coincidem.

Quanto à segunda pergunta, sejam    e    as circunferências máximas dadas.

O centro  está simultaneamente em  e ;  logo,    é uma reta  r  que passa por  O.  Consideremos o plano p perpendicular a  r e que passa por O.  Sendo ,  e ,  segue  p  perpendicular a  e a  . Logo,  é circunferência máxima que é perpendicular a  e a  .

Nota do Prof. Sérgio Alves: Um modelo para a chamada Geometria Esférica é dado do seguinte modo:

Fixe uma superfície esférica  S  no espaço euclidiano tridimensional. Interprete “ponto” como sendo um conjunto    consistindo de dois pontos euclidianos de  S,  diametralmente opostos (antípodas) e interprete “reta” como uma circunferência máxima de  S. Nesse contexto, os resultados 1 e 2 acima traduzem os seguintes fatos da Geometria Esférica:

1.  Dados dois “pontos” distintos  A  e  B,  existe uma única “reta” que passa     por A  e  B.

2. Dadas duas “retas” distintas quaisquer e coplanares (na Geometria Esférica), existe uma terceira “reta” que é simultaneamente perpendicular às “retas” dadas. (Note que na Geometria Euclidiana isso não acontece, exceto se as retas dadas forem paralelas.)

Observe que na Geometria Esférica não existem “retas” paralelas, isto é, “retas” que não se interceptam.

 

Reta eqüidistante de duas circunferências

Um leitor de São Paulo pediu a solução do seguinte problema:

Dados o ponto P e duas circunferências, traçar por  uma reta eqüidistante das duas circunferências e que as deixa em semiplanos opostos.

RPM: Se uma reta e uma circunferência não têm pontos comuns, a distância da reta à circunferência é a diferença entre a distância do centro da circunferência à reta e o raio da circunferência (d na figura a seguir).

A construção geométrica da reta pedida vai basear-se na seguinte propriedade dos trapézios:

Na figura a seguir, A  e  B  são, respectivamente, os centros das circunferências de raios  r  e  RP  é o ponto dado.

Construção:

Determina-se o ponto médio M de  e, com centro em M, traça-se uma circunferência  de raio . A reta procurada é uma das retas tangentes  a  , passando pelo ponto dado.

Justificativa:

AXBY  é um trapézio e, pelo visto anteriormente, 

(Agradecemos ao Professor Sylvio Niskier a solução aqui apresentada.)  


Questões deixadas para o leitor interessado investigar:  Quais são as posições relativas do ponto e das circunferências para que o problema tenha solução? A solução, quando existe, é única? Se deixarmos de lado a condição: “que as deixa em semiplanos opostos”, o problema terá novas soluções? Quantas? Sempre?