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Nesses tempos de calculadoras eletrônicas e computadores digitais, o cérebro humano parece, muitas vezes, um artefato anacrônico no mundo dos cálculos matemáticos. Um minúsculo chip é capaz de realizar cálculos de modo espantosamente mais rápido que nossos bilhões de neurônios. Por que nos darmos ao trabalho de ensinar a tabuada? Ou a adição? Por que aprender a fazer contas, se há máquinas capazes disso de modo muito mais preciso e rápido? Talvez pela mesma razão pela qual ainda joguemos xadrez, apesar de a máquina fazer isso melhor que qualquer um de nós. Talvez porque sentimos prazer em realizar um cálculo complicado sem o auxílio de calculadoras. Talvez porque possamos nos divertir e entreter com isso... ou simplesmente porque em verdadeira Matemática o computador esteja ainda muito aquém da mente humana... Neste artigo exponho a prova dos onze que é análoga à prova dos noves [1]. Uma completa a outra, no sentido de que, se nenhuma delas acusa erro numa conta, muito provavelmente o cálculo está correto. Intuitivamente, parece-me, pela razão que revelo no fim deste artigo, que há menos de 2% de probabilidade de uma conta estar errada e as provas dos noves e dos onze não mostrarem isso. Mesmo assim a conta pode estar errada e passar por ambas as provas.
É fácil calcular o resto de uma divisão por 11. Basta somar cada algarismo de ordem ímpar com o oposto de cada algarismo de ordem par e no final acrescentar, se necessário, um múltiplo de 11 de modo que o resultado esteja no conjunto A = {0,1,2,3,4,5,6,7,8,9,10}. Vejamos os exemplos. O resto de 5 491 na divisão por 11 é 2, pois: 5 + 4 9 + 1 = 9 e 9 + 11= 2 A. Do mesmo modo, o resto de 94 859 na divisão por 11 é 6, pois: 9 4 + 8 5 + 9 = 17 e 17 + (11) = 6 A Quando dois números inteiros a e b deixam o mesmo resto na divisão por outro inteiro n, indicamos isso por a b (mod n) e dizemos que a é congruente b módulo n. Não é difícil mostrar que, se a b (mod n) e b c (mod n), então a c (mod n); se a b (mod n) e c d (mod n), então (a + c) (b + d) (mod n) e ac bd (mod n) (veja RPM 7, pág. 25). Vimos que 5491 2 (mod 11) e 9485 6 (mod 11); por uma das propriedades acima, temos 5491 x 94589 2 x 6 (mod 11). Como 12 1(mod 11), obtemos 5941 x 9485 1 (mod 11), também por uma das propriedades acima. O produto de 5 491 por 94 859 tem, portanto, resto 1 na divisão por 11. Caso encontremos um resultado para a multiplicação 5 491 x 94 859 que não tenha resto 1 na divisão por 11, a conta estará errada. Quando falha?
A prova dos onze falhará quando um
resultado errado tiver o mesmo resto na divisão por 11 que o resultado certo.
Nesse caso, a prova dos onze não acusará erro na conta, apesar de haver algum.
As provas dos noves e dos onze falharão simultaneamente quando um resultado
errado tiver o mesmo resto na divisão por 99 = 9
x
11 que o resultado certo. Daí minha opinião de que ambas as provas falharão
apenas em menos de 2% dos casos (1/99
1% <
2%).
Referências bibliográficas:
Um número é par quando termina em 0, 2, 4, 6 ou 8. Na Roma antiga não existia número par porque não existiam 0, 2, 4, 6 ou 8, que são invenções posteriores. Ou existia número par? Existia, claro! O número XVI “termina” em I e é par, XXIV “termina” em V e é par. É importante sabermos a diferença entre número e numeral. Número é idéia, numeral é símbolo. O número é uma noção de quantidade só existente nos neurônios de quem a construiu. Número não pode terminar em 0, 2, 4, 6, ou 8. O numeral, sim, quando escrito com os nossos algarismos usuais. Todos concordamos que o rigor matemático é necessário, mas também que uma linguagem simples é conveniente para o aluno e para todos. Olho para cima e vejo ÿÿÿ. Avalio a situação com minhas noções de quantidade e, para relatar o que vi, precisarei de algum numeral falado, escrito, gesticulado ... Posso representar a quantidade pela palavra três (falada ou escrita) ou por sinais como ///, 3, three, III, , 6/2, , 4!-3 x 7, etc. Numerais diferentes representando o mesmo número. Por causa de exageros cometidos na época da Matemática Moderna, muitas pessoas criaram certa aversão à palavra numeral. Usar, ou não, essa palavra é questão de gosto. A mensagem deste artigo é mostrar que, ao falar, o professor deve tomar um certo cuidado para deixar bem claro se ele está se referindo a um número ou ao símbolo que o representa – numeral, para quem gosta.
Vamos discutir alguns exemplos.
a) Número decimal.
Não existe! O numeral, a
representação, é que pode ser decimal
b) Número misto.
Não existe! O numeral é
que pode ser misto (“inteiro” e fração).
c) Fração.
Será que o leitor já ouviu afirmações como: A palavra fração costuma ser usada, ora com o significado de numeral, ora com o significado de número racional.
Se falamos de frações com o significado de
numeral, podemos simplificar frações, isto
Alguns autores usam a palavra fração referindo-se ao número, isso porque popularmente fração é pedaço, portanto, quantidade. Adotando essa posição, podemos fazer as operações com frações, mas não podemos simplificá-las nem falar em numerador da fração porque quantidades não podem ser simplificadas e nem possuem numeradores, etc. Alguns professores acham que não devemos levantar esses problemas com os alunos. Outros acham que alguma coisa deve ser discutida. No entanto, os erros devem ser evitados, principalmente em publicações, tentando não poluir muito a linguagem, o que é perfeitamente possível. Uma vez alguém me disse que ensinar errado é mais fácil.
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