Claudia A. C. de Araujo
Vitória, ES

     Introdução

David Hilbert (1862–1943) foi um renomado professor da universidade de Göttingen, Alemanha, e um dos maiores matemáticos da transição do século dezenove para o século vinte. Suas contribuições são contadas nas mais diversas áreas de pesquisa, como lógica matemática, equações diferenciais, teoria dos números e física matemática. Os chamados espaços de Hilbert, por exemplo, encontraram aplicação na teoria quântica.

No Congresso de Paris de 1900, Hilbert propôs 23 problemas que ele acreditava que estariam ou que deveriam estar entre os que ocupariam a atenção dos matemáticos no novo século. Embora a Matemática tenha se desenvolvido em muitos caminhos não previstos em 1900, grande parte desses 23 problemas de fato se relacionava com conceitos e teorias que vieram a ser trabalhados por notáveis matemáticos do século vinte. Muitos dos problemas propostos por Hilbert ainda não foram resolvidos.

No campo da Geometria, Hilbert realizou estudos sobre axiomatização, que culminaram na publicação da obra Fundamentos da Geometria, em 1899, que exerceu forte influência sobre a Matemática do século vinte. Entre os diversos postulados e teoremas dos Fundamentos da  Geometria, de Hilbert, encontramos um interessante método para multiplicar segmentos, o qual, como o próprio Hilbert salienta, satisfaz todas as propriedades válidas para a multiplicação de números reais. Neste artigo, apresentamos esse método e mostramos como o mesmo pode ser útil para a interpretação geométrica de certas operações algébricas.  

 

     Multiplicando e dividindo segmentos como Hilbert  

Hilbert utiliza as seguintes palavras ao definir seu método de multiplicação de segmentos:

“Para definir geometricamente o produto de um segmento  a  por outro  b,  nos servimos da seguinte construção. Escolhemos, em primeiro lugar, um segmento arbitrário, que permanece invariável em tudo o que vamos considerar, o qual designamos por  1.  Depois, sobre um dos lados de um ângulo reto colocamos, a partir do vértice  O,  os segmentos  1  e  b  e sobre o outro lado o segmento  a.

Unimos os extremos dos segmentos  1  e  a  por meio de uma reta e traçamos uma paralela a esta pelo extremo de  b,  que determina no outro lado um segmento  c.  A este segmento  c  damos o nome de produto do segmento  a  pelo segmento  b  e escrevemos:  .”

A validade do método de Hilbert e sua equivalência com a multiplicação de números reais é facilmente comprovada por meio do teorema de Tales. Podemos também definir um critério para a determinação do quociente de um segmento  c  por um segmento  b,  bastando efetuarmos uma construção inversa à da multiplicação. Ou seja, escolhido o segmento  1,  colocamos sobre um dos lados de um ângulo reto a partir do vértice  O  os segmentos  1  e  b,  e sobre o outro lado o segmento  c,  como feito antes.

Entretanto, dessa vez, unimos os extremos dos segmentos  b  e  c  por meio de uma reta e traçamos uma paralela a esta pelo extremo de  1,  determinando, no outro lado, o segmento  .

Se o método de Hilbert satisfaz as propriedades dos números reais, podemos utilizá-lo para visualizar operações com quaisquer números reais, positivos ou não. Basta acrescentarmos à idéia de Hilbert um sistema de coordenadas. Assim, é possível verificar geometricamente que:

 

1)    O produto de dois números positivos,  a  e  b,  é um número positivo  .

 

2)    O produto de um número positivos  a  por um número negativo  b  é um número negativo  .

3) O produto de dois números negativos,  a  e  b,  é um número positivo  .

4)      Se  a  e  b  são dois números reais tais que    ou  , então  .

Como já foi dito, a validade dos métodos de multiplicação e divisão de segmentos propostos por Hilbert se sustenta na teoria de semelhança de triângulos. Sendo assim, para se fazer uma interpretação geométrica das operações de multiplicação e divisão de dois números reais, não é necessário que o ângulo entre os eixos coordenados seja um ângulo reto. É interessante que o professor promova discussões a respeito de questões como essa com seus alunos, deixando que eles explorem ao máximo as propriedades sugeridas pelo método.

Como desafio, deixamos para o professor o seguinte exercício: verifique geometricamente a propriedade de distributividade da multiplicação com relação à adição, válida para os números reais.

 

Referências bibliográficas:

[1] Boyer, C. História da Matemática. Tradução de Elza Gomide. São Paulo: Editora Edgar Blucher, 1974.

[2] Hilbert, D. Fundamentos de la Geometria. Tradução da 7a edição alemã de Francisco Cebrian. Madrid: Instituto Jorge Juan, 1953.

 

 

Claudia A. C. de Araujo, é mestre em Matemática pela PUC -Rio, reside em Vitória, ES onde é professora de História da Matemática na Faesa. E doutoranda em Matemática e seu divertimento predileto é cinema.

 

Resposta dos probleminhas  

1)      {1771, 1772,... 1830},  conjunto com 60 elementos.       

2)       22 degraus. 

3)    381654729.