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Maria Laura Mouzinho Leite Lopes

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Seis problemas não triviais equivalentes*

Zalman Usiskin
Universidade de Michigan
Ann Arbor, Michigan.

O poder da Matemática de relacionar o que aparentemente não tem relação  

Neste artigo dois problemas serão chamados equivalentes se sua resolução fizer uso do mesmo tipo de Matemática.

Problemas equivalentes evidenciam talvez a qualidade mais importante da Matemática: a possibilidade de um conceito teórico ser usado como modelo para muitas idéias diferentes. É fácil produzir exemplos.

Se o conceito teórico for “combinações”, como em Probabilidade, esta idéia também pode ser usada para determinar as leis de Mendel em Biologia, para calcular coeficientes binomiais, para calcular certas probabilidades em jogos de baralho, para achar o numero de polígonos de vários tipos que  tenham pontos arbitrários, como vértices, e  assim por diante, quase que indefinidamente.

Mas é difícil produzir bons exemplos quando se desejam problemas equivalentes em uma escala muito menor, onde mesmo tipo de Matemática não significa Matemática de um mesmo campo, ou de um mesmo tópico dentro de um campo ou assunto que usem as mesmas idéias. Especificamente tentei encontrar problemas satisfazendo as seguintes condições:

1 – Os problemas deveriam ser  matematicamente idênticos até  nos números usados na sua resolução.

2 – Até que uma resolução fosse examinada, nada no problema deveria indicar que o mesmo tipo de Matemática pudesse ser usado. Assim os problemas deveriam, na medida do possível, vir de tópicos totalmente desvinculados dentro da Matemática ou dentro de aplicações da Matemática.

3 – Os problemas deveriam estar no âmbito da Matemática do 1 ou 2 grau, quanto mais simples, melhor.

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* Publicado “The Mathematics Techer”, vol. 61, n.º 4 de Abril de 1968. Traduzido com permissão de “The National Council of Teachers of Mathematics”.  

   

     Problemas

inteiro positivo).

2.  Ache todos os  retângulos cujos lados tenham por medida números inteiros e que tenham área e perímetro numericamente iguais.

3.  Quais pares de inteiros positivos têm média harmônica igual a 4?

4.  Ache os possíveis pares de inteiros cujo produto seja positivo e igual ao dobro de sua soma.

5.   Dado um ponto P, ache todos os n tais  que o espaço em torno de P possa ser coberto, sem superposição, por polígonos regulares, congruentes, de n lados.  

6.   Para quais inteiros positivos n > 2, o número 2n é divisível por n-2?

É possível que o leitor já tenha percebido que alguns desses problemas envolvem o mesmo tipo de Matemática. Se este for o seu caso, a condição 2 não foi satisfeita para você. Esperamos porém que, para a maioria dos leitores, seja uma surpresa o fato de que esses problemas sejam equivalentes.

Para mostrar a equivalência, verificaremos que os seis problemas se reduzem à resolução de uma equação que é a caracterização do primeiro.

 

     Redução dos Problemas a uma Equação  

Problema 1.

positivos. (A equação será resolvida mais adiante.)

Problema 2.

Sejam a e b o comprimento e a largura do retângulo procurado. Como a área e o perímetro são numericamente iguais, temos:

2a+ 2b = ab

2 (a + b) = ab

 

Como a e b devem ser inteiros e positivos esta última equação tem a mesma forma que a equação do Problema 1.

Problema 3.

A média harmônica de dois números x e y é

 

Sejam x e y inteiros positivos. Das condições dadas:

 

A última equação tem a mesma forma que a equação na 3 linha do Problema 2 e assim se reduz à equação do Problema 1. 

Problema 4.

Sejam x e y dois inteiros, z o seu produto, z > 0. Os números x e y devem ser positivos As condições juntas implicam:

 

Esta última equação é idêntica à equação da última linha do Problema 3 e assim reduz-se à equação do Problema 1.

 

Problema 5.

Este é o problema mais difícil de caracterizar. Seja k o número de polígonos com vértice em P. Se os polígonos não se sobrepuserem, forem regulares e congruentes, utilizando a notação da Fig. 1, obter-se-á:

em graus

Mas os ai são medidas de ângulos de polígonos regulares de n lados, portanto

 

Temos então:

Das condições do problema segue-se que n e k devem ser inteiros positivos e portanto esta equação tem a mesma forma que a da primeira linha do Problema 2.

Problema 6.

Se 2n é divisível por n – 2 então 2n = (n – 2) k, onde k é um numero inteiro. Esta equação é idêntica a uma das equações do Problema 5 e portanto se reduz à do Problema  1.

 

     Equação Diofantina

Assim, os seis problemas podem ser resolvidos considerando-se a equação do Problema 1. Devido às condições, esta equação é  uma equação diofantina e sua solução é interessante.

  p = 3 q = 6;

  p = 4 q = 4;

5. Por causa da simetria de p e q na equação original, obtemos resultados

6.      Portanto temos 3 soluções:

(p, q) = (3,6); (p,q) = (4,4); (p,q) = (6,3).

 

     SOLUÇÕES

Todos os problemas estão agora resolvidos.

Problema 1 A resposta é

 

Problema 2 – Existem  dois retângulos satisfazendo as condições dadas: Um é 4 x 4 e o outro, 3 x 6.

Problema 3 – Duas respostas: 4 e 4 ou 3 e 6 são pares de inteiros cuja média harmônica é 4.

Problema 4 – Os pares são idênticos ao do problema 3.

Problema 5 – Os únicos polígonos  regulares congruentes que, sem superposição, cobrem o espaço em torno de P (e assim cobrem o plano) são os polígonos de 3 lados (seis triângulos eqüiláteros em torno de P), os de 4 lados (quatro quadrados em torno de P) e os de 6 lados (três hexágonos regulares em torno de P), como se vê na Fig. 2.

 
Fig. 2 – Seis  triângulos, quatro quadrados, três hexágonos.

 

Problema 6 – A resposta é: n – 2 é um divisor de 2n quando n = 3, n = 4 ou n = 6. (A condição n > 2 no problema original garante ser n – 2 positivo. Sem essa condição existiriam as soluções n = 1, n = 0 ou n = –2).

 

     RESUMO

Os seis problemas formam um grupo de problemas, não triviais equivalentes que podem ser usados em classes de 1 e 2 graus. É fácil desenvolver outros grupos de problemas  mais apropriados para o uso em Álgebra Elementar ou geometria. Tais grupos de problemas podem ser usados para demonstrar o poder de um pouco de Matemática abstrata na resolução de exercícios que, à primeira vista, pareciam não relacionados.

 

 

O Teorema de Napoleão

Napoleão Bonaparte, além de grande soldado e hábil político, era um grande admirador da Ciência e dos cientistas. Em particular, devotava grande interesse à Matemática. O que pouca gente sabe é que Napoleão é o descobridor de um belo teorema de Geometria. Eis o enunciado do teorema de Napoleão.

Tome um triângulo arbitrário. Com base em cada um dos seus lados, construa (externamente) um triangulo eqüilátero. Os centros desses 3 triângulos eqüiláteros são ainda vértices de um triangulo eqüilátero.