Logaritmos – Um curso alternativo

Renato Fraenkel
Escola Rudolf Steiner
Rua Job Lane 900
04638 – São Paulo – SP

Neste artigo quero expor um modo menos convencional de apresentar os logaritmos ao 1o. ou 2o. ano colegial. Não tentarei aqui me preocupar com uma fundamentação por meio de teorias pedagógicas, nem tampouco comparar  o caminho escolhido com aquele utilizado nos livros didáticos usuais.

Duas idéias básicas gerais norteiam esse tipo de ensino: 1) tratamento fenomenológico da Matemática e das Ciências Exatas (isto é, sua ligação com fenômenos reais da natureza, procedimento indutivo, ao invés da utilização de teorias ou modelos puramente abstratos) e 2) ênfase na origem e aplicabilidade do conteúdo que está sendo tratado.

Neste sentido, o ensino do Lagaritmos numa escola – local onde se deve adquirir cultura geral e não ainda o treinamento especializado – tem duas metas fundamentais: 1o. realçar na sua essência (qualidade) a operação de exponenciação (e com isso a de sua inversa, a logaritmação) 2o. capacitar o aluno para a utilização da potente ferramenta que é o cálculo com logaritmos. Assim podemos suscitar nos alunos o que se poderia chamar de uma admiração pela teoria. A discussão sobre a importância do cálculo logarítmico (ou de outro cálculo qualquer) na época das calculadoras eletrônicas teria que ficar para um outro artigo.

Na exposição que se segue não justificarei cada passo. Apresento de forma resumida algumas idéias que utilizei nos últimos três anos, lecionando esta matéria. A exposição terá quatro partes:

 

 

     I – Introdução – Problemas Básicos

A essência (qualidade) da exponenciação pode ser realçada através de 3 ilustrações:

1a. ilustração:

A do velho conto chinês, em que se afirma ter o inventor do jogo de xadrez pedido como remuneração para sua criação, tantos grãos de arroz quantos coubessem no tabuleiro do jogo, dispostos da seguinte maneira: na primeira casa seria colocado um grão, na segunda  casa o dobro do número de grãos da casa anterior. A surpresa vem quando se convida o aluno a avaliar o resultado. (Sugestão: dar o problema como lição de casa.) Minha experiência mostrou que somente 2 ou 3 alunos por classe acertam o resultado:
que gostam de traduzir este resultado para uma unidade mais significativa, por exemplo, quantos vagões seriam necessários para transportar este arroz? Como lição de casa, esta transformação do número de grãos para o de vagões é uma excelente recordação da divisão.

2a. ilustração:

“Quantos quadrados são necessários para “cobrir” o Brasil, supondo o processo indicado na figura e a = 8.000 km?”

Também aqui deixo que os alunos estimem o resultado (enquanto no 1o. problema as estimativas eram muito abaixo do resultado correto, neste são muito acima!). Os alunos devem chegar ao resultado por tentativas:

 

1o quadrado            1 cm de lado

3o quadrado            2 cm de lado

5o quadrado            4 cm de lado
............................................

59o quadrado      536.870.912 cm (=229)

61o quadrado   1.073.741.824 cm (=230)

Logo o 61o. quadrado já tem lado maior que 8.000 km (=800.000.000 cm)! No parágrafo IV (ver adiante) o mesmo problema pode ser resolvido a partir da equação:

 

logo,

 

e

 

Portanto o 60o. quadrado não “cobre” o Brasil mas o 61o., sim. Estes tipos de raciocínio são muito mais reais para o aluno do que o enfoque baseado na função inversa e composição de funções, tão em moda atualmente, carentes, porém, de conteúdo concreto.

Este mesmo problema pode ser resolvido com hexágonos e pentágonos (este último caso requer a demonstração da proporção áurea).

Como uma calculadora sem função exponencial, não resolve diretamente os problemas referidos acima, temos ainda uma motivação para tentar obter uma solução rápida e fácil dos problemas (associo esta procura às biografias de grandes astrônomos e físicos que passaram vidas inteiras fazendo cálculos para obterem seus resultados. Isto porque não se pode esquecer que atualmente existe uma tendência de substituir a Aritmética e a Geometria pela Álgebra e pela formalização estrutural, com decorrente menosprezo pelo cálculo “braçal”).

3a. ilustração:

Outro aspecto essencial da diferença entre o crescimento aritmético e o geométrico (exponencial) é ilustrado pelo problema dos juros simples e compostos. O seguinte problema (sugerido por um colega) pode ser mencionado aqui e resolvido num momento apropriado durante o curso: “A quanto montaria um capital de Cr$ 1,00 depositado no ano da morte de César (44 a.C.) se aplicado a 1% ao ano – a juros simples e compostos?” (Estimar!) Pode-se começar um capítulo sobre juros, calculando à mão os juros após um ano, dada uma taxa mensal qualquer e escolhendo números os mais simples possíveis. No caso dos juros compostos e Cr+1 = Jr+1) e seria ainda necessário introduzir uma convenção de arredondamento. Posteriormente pode-se deduzir a fórmula dos juros compostos, dos resultados (fica o cálculo “braçal” de an). (V.RPM, n.º 2 pág. 11)

Os problemas de juros simples e compostos são a seguir representados em gráfico (capital/tempo) – sem um estudo formal de funções – e também o problema do tabuleiro de xadrez (casa/n.° de grãos). Os gráficos de 3x e 1,5x para – 5  x  5 complementam como exemplos o estudo da forma e das propriedades específicas dos gráficos exponenciais de base maior do que 1. A motivação para a introdução do cálculo logarítmico é completada mostrando a dificuldade em calcular “braçalmente” 74,3 ou  apresentados em problemas concretos como o cálculo da aresta de um cubo de volume 12, um juro com um período de vigência de 4,3 anos, etc.

 

 

      II – Definição e propriedades dos logaritmos

A idéia do uso dos logaritmos como uma ferramenta para cálculos pode ser ilustrada pelo seguinte exercício (tirados de E. Blindel: “Logarithmen”- Suttgard, 1954): faz-se uma tabela das potências de 2 até 220, exercitando-se com ela os quatro tipos de cálculo):

a)    64 x 1024 = 26 x 210 = 216 = 65536

b)     8192 : 512 = 213 : 29 = 24 = 16

c)    (256)2 = (28)2 = 216 = 65536

d)    3= 25 = 32

e, com prática, chega-se à simplificação de expressões complicadas como

 

Devido ao fato de não podermos calcular, por exemplo, 184 com auxílio de “nossa tabela” (pois 18 não está “tabelado”), ficará evidente para os alunos a vantagem de introduzir-se um tabela que não tenha “espaços vazios” entre os números inteiros tabelados. Isso foi resolvido no séc. XVII tendo-se experimentado várias bases no lugar de 2; J. Burgi publicou em 1620 uma tabela na base 1,0001, com 8 casas decimais!

Assim, passa-se à tabela decimal e a seu uso, ainda sem a definição do logaritmo, quando são dados alguns exercícios para fixar a idéia de que a tabela usada é uma tabela de potências de 10.

A seguir vem a definição formalizada  depois, vários exercícios (numéricos) de determinação de x, b ou a, sendo conhecidas duas das variáveis (alguns exemplos: log100,001; log0,00110; logx64 = m, para m = 1, 2, 3, 6, -6; log3x = 2; log3x = -2; etc). Esses exercícios já contêm as equações logarítmicas e exponenciais: por exemplo,

log0,00110 = x 0,001x = 10 10-3x = 10 -3x = 1.

A seguir formalizamos as quatro propriedades dos logaritmos (que já foram exaustivamente aplicadas nos exercícios com a tabela de potências de 2): log (a.b) = log a + log b, etc.

 

     III – Cálculo logarítmico

Neste capítulo, nada virá de essencialmente novo. São tratados o manuseio da tabela, característica e mantissa e, eventualmente, a interpolação (que eu não uso), chegando-se ao cálculo de expressões numéricas como as vistas acima. Pode-se intercalar neste capítulo a solução logarítmica dos problemas já vistos na parte I. Prefiro tratar a mudança de bases em conjunto com uma aplicação (ver adiante).

 

     IV – Aplicações

No fim do curso os alunos devem ter a sensação de terem feito um progresso qualitativo, de terem aprendido algo de essencialmente novo e concreto. Este sentimento advém, entre outros, da possibilidade de aplicar o aprendido, isto é, da possibilidade, agora, de resolver problemas práticos antes quase impossíveis. Pela minha experiência, não se torna enfadonho aprofundar aqui os problemas da parte I.

Um dos problemas que pode ser resolvido neste capítulo é o do cálculo do tempo em que de n obtidos em I e II, obtém-se a fórmula da mudança de bases. (Inicialmente toma-se x = 10 para a resolução  deste exercício, passando-se posteriormente ao caso geral).

Como última aplicação pode-se tratar o problema do “crescimento constante” que ocorre em lnx (logex). Costumo formulá-lo da seguinte maneira: “Um capital de Cr$ 100,00 é colocado a juros compostos a uma taxa anual de 100%. Qual seria o capital acumulado após um ano, se os juros fossem adicionados: a) anualmente, b) semestralmente, c) cada 1/3, ¼, ..., 1/20 de ano, d) cada dia, hora, minuto, ..., e a “cada instante”? O cálculo terá que ser feito – para o ano dividido em n partes, com n = 1, 2, 3 e 4 “braçalmente”, para  n= 5, ..., até 20, logaritmicamente – de forma lenta, para que os alunos percebam a problemática do n  (sem formalismo algum!). Ainda deverão estimar os resultados n aumenta pelos resulatados parciais obtidos. Os resultados serão tabelados e levados a um gráfico (n/capital final). Todos os alunos acreditam na convergência, mas deve-se chamar sua atenção para o fato de que a convergência necessita ainda ser comprovada teoricamente. Este exercício pode ser dado no 3o. colegial ao tratar-se do

 

lim

n

Dependendo da tabela de logaritmos disponível, a partir de n = 20 faz-se necessário o uso da calculadora, podendo-se então fazer o cálculo sem o uso de logaritmos (com uma tabela de apenas 4 decimais, a partir de n = 20, não se obtém mais diferença no capital acumulado). Acho extremamente importante introduzir-se o uso da calculadora em todas as situações em que a obtenção de resultados numéricos mais precisos a torna indispensável. Naturalmente discussões pedagógicas e filosóficas com os alunos devem acompanhar o seu uso. Não existe obrigação de se adquirir uma calculadora, pois bastam duas ou três na classe para se chegar aos resultados desejados. Todos os demais cálculos são feitos sem calculadora.

Para finalizar, alguns aspectos práticos: em nossa escola, nas duas primeiras  horas de cada dia, é desenvolvido um determinado assunto – seja Logaritmos, Botânica. Historia da Antiguidade, etc – durante um período de aproximadamente 3 semanas seguidas, de forma que o aluno tenha a  possibilidade de se concentrar num assunto especifico. Assim, o curso aqui exposto é o conteúdo de um desses períodos no 10º anos.

A base pedagógica e filosófica para este método de ensino foram dadas por Rudolf Steiner nos anos que se seguiram à fundação da primeira escola Waldorf, em Stuttgart, Alemanha, em 1919. Em São Paulo temos duas dessas escolas, a Escola Rudolf Steiner e o Colégio Micael.

 

 

Um triângulo Interessante  

(enviado por Odorico Cardoso de Oliveira)

Cálculo do numero de divisores

É ensinado, já no 1º grau, que:  Sem n = ap . bq . ... . mz, donde  a, b, ..., m são os fatores primos distintos de n, então o numero de divisores (positivos) de n é dado pela formula: (p+1) . (q +1) . ... .  (z +1). Por exemplo, 12 = 22 . 3 tem (2 + 1) . (1 +1) = 6 divisores.

Observe agora o seguinte triangulo:

1

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

2

1

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

3

1

1

 

 

 

 

 

 

 

 

 

4

2

1

1

 

 

 

 

 

 

 

 

5

2

1

1

1

 

 

 

 

 

 

 

6

3

2

1

1

1

 

 

 

 

 

 

7

3

2

1

1

1

1

 

 

 

 

 

8

4

2

2

1

1

1

1

 

 

 

 

9

4

3

2

1

1

1

1

1

 

 

 

10

5

3

2

2

1

1

1

1

1

 

 

11

5

3

2

2

1

1

1

1

1

1

 

12

6

4

3

2

2

1

1

1

1

1

1

  Descubra como ele é construído e veja só: “a diferença entre a soma dos elementos da n-ésima linha e a soma dos elementos de (n 1)-nésima linha é exatamente igual ao numero de divisores de n”.

Por exemplo,

(12+6+4+3+2+1+1+1+1+1+1) – (11 +5 + 3 + 2 +2 + 1 +1 +1 +1 +1 +1) = 6

e 6 é o numero de divisores 12.

Por quê?