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Severino Toscano Melo
A
Coluna do Botelho da RPM
37 descreve o interessante algoritmo usado no Brasil para a distribuição
das cadeiras de um Parlamento eleito por eleição
proporcional. Esse sistema político coloca o seguinte problema matemático:
como dividir um número inteiro de objetos (as
C
cadeiras de um Parlamento) em
n
partes inteiras (onde
n
é o número de partidos que se qualificam a ter representação),
proporcionalmente a
n
números dados (as votações obtidas pelos
n partidos). A
divisão proporcional das
C
cadeiras quase certamente resultará em números fracionários. É
razoável que cada partido tenha, então, pelo menos a parte inteira do número
que lhe cabe por divisão proporcional. Mas qualquer critério de aproximação
ou arredondamento que se use para dividir as sobras determinará bancadas
de tamanhos não mais proporcionais às votações obtidas pelos partidos.
A escolha de um algoritmo para distribuir as cadeiras restantes deve ter
como objetivo maximizar as vantagens ou minimizar os defeitos de uma
distribuição final necessariamente imperfeita. Está aí o aspecto
subjetivo, ou político, do problema: a
definição do que será bom ou ruim num eventual divisão de cadeiras. Proponho-me
aqui a tentar inferir qual o princípio que norteou a elaboração da
regra, a partir de uma interpretação aritmética do algoritmo descrito
pelo nosso colega Manoel H. C. Botelho. É impossível provar
matematicamente que o legislador teve tal ou qual intenção. O que este
artigo demonstra é que, se o legislador estivesse imbuído de um certo
objetivo (definido precisamente mais a frente), ele teria chegado ao atual
algoritmo de divisão das sobras.
Mas isso pode ser só coincidência. A intenção poderia ter sido outra
e, ainda assim, o algoritmo resultante poderia ter sido o mesmo. Caberia
talvez uma pesquisa histórico-legal para descobrir qual princípio
norteou o estabelecimento desse critério.
Supomos,
para leitura deste artigo, que o leitor está familiarizado com o
algoritmo descrito no artigo da
Coluna do Botelho da RPM
37.
Após
a distribuição inicial vêm as etapas seguintes do algoritmo que formam a distribuição das sobras. Suponhamos
que os n
partidos que se qualificaram,
Temos
portanto:
nova cadeira, estaremos, nesta etapa, escolhendo o partido que ganha a
nova cadeira de modo a maximizar
q.
Mais do que isso, o partido que recebeu a nova cadeira passa a ser
aquele Nas
etapas seguintes, também será verdade que, após a atribuição da nova
cadeira, o menor Definição:
Uma n-upla de inteiros positivos
Observação:
Segue imediatamente das definições que, se a
n-upla
Voltemos
agora ao algoritmo de distribuição das sobras. Segue da afirmação (1)
que a n-upla
A
proposição a seguir mostra que, em todas as etapas do processo, as
n-uplas obtidas são
razoavelmente justas. Da observação segue também que, ao atribuirmos a
nova cadeira a
Partindo
do princípio de que distribuição boa é aquela que tem
q
grande, somos naturalmente levados à seguinte questão: Será
que o algoritmo da lei eleitoral, ao maximizar
q
a cada passo, leva-nos ao máximo valor de
q
dentre todas as possíveis distribuições de cadeiras com
![]() Vimos
na seção anterior que a n-upla
de partida do algoritmo da lei eleitoral é razoavelmente justa e que, a
cada passo da distribuição das sobras, são obtidas n-uplas
razoavelmente justas. Em particular, a distribuição final de cadeiras é
razoavelmente justa e, portanto, a resposta à
pergunta acima é sim.
Cinco
partidos
O
total dos votos válidos (lembrando que, agora, voto em branco é
considerado nulo, como informado na RPM
38, pág. 37) é
Sem
usar o resultado teórico (*), uma maneira de verificar que
Uma
maneira alternativa é usar o argumento:
Gostaria
de agradecer ao Professor Antônio Luiz Pereira por conversas a respeito
do assunto, e ao Professor Carlos Isnard por ter dado a definição de n-uplas
razoavelmente justas, o que me permitiu melhorar a versão original deste
artigo.
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