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Mozart
Cavazza P. Coelho
O
sistema de pesos e medidas usado em Portugal à época do descobrimento e
posteriormente no Brasil, no tempo colonial, apresentava sérios
inconvenientes: não era uniforme de região para região, mudava segundo
o tempo e as circunstâncias e, além disso, as subdivisões eram
numerosas e irregulares, tornando os cálculos trabalhosos e imprecisos. A
tabela seguinte dá uma idéia da variedade de unidades de medida usadas
antigamente para distâncias (as igualdades devem ser entendidas sempre
como aproximações):
Qual
era a légua
mencionada na carta de Caminha? A braça
brasileira é citada no dicionário Aurélio e equivale a 2,2
m, enquanto no sistema inglês a braça equivale a 1,8 m. Uma
légua é definida no mesmo dicionário
como sendo uma medida itinerária igual a 6 000 m. Entretanto, uma légua
de sesmaria corresponde a 3 000 braças, o que significa 6 600
m. Essas são medidas comumente empregadas para medir distâncias
terrestres. Provavelmente, a légua
citada na carta de Caminha era a légua
marítima, que ainda diferia da légua terrestre. Considerando
a necessidade de uma uniformização, o rei da França, Luís XVI, em maio
de 1790, decretou a criação de uma comissão para estabelecer um sistema
padronizado de pesos e medidas. A comissão, formada por membros da
Academia de Ciências de Paris, decidiu tomar como referência para as
medidas de distância o comprimento de um meridiano terrestre. Assim, foi
definido o metro
como sendo o comprimento do meridiano terrestre dividido por 40 000
000. O comprimento do meridiano foi estabelecido a partir de medições
feitas em arcos do meridiano de Paris, entre a torre de Dunquerque e a
cidade de Barcelona, comparadas com medições feitas anteriormente no
Peru. Foi então construído um padrão para o metro, feito de platina e
cuidadosamente guardado, em 1799, no prédio dos Arquivos do Estado, em
Paris. Assim
nasceu o atual sistema
métrico decimal, no qual as subdivisões e os múltiplos do
metro são feitos de 10 em 10: temos portanto o centímetro, o decímetro,
o milímetro, bem como os múltiplos do metro, como o decâmetro, o hectômetro
e o quilômetro. Atualmente
as crescentes necessidades tecnológicas exigem um padrão mais preciso e
facilmente reprodutível. O metro é hoje definido como sendo o
comprimento do trajeto percorrido pela luz no vácuo durante um intervalo
de tempo de 1/299 792 458 de segundo. Mas
voltemos ao tempo do descobrimento do Brasil. Como já mencionamos, a légua
a que se refere Caminha em sua carta é, provavelmente, a légua
marítima, cuja definição também variava de lugar para lugar
e de navegador para navegador. No século XVI, considerava-se que um grau
do meridiano terrestre correspondia a um certo número de léguas, que
alguns navegadores diziam ser 16,7, enquanto outros diziam que era 18 ou
mesmo 17,5. Se
o meridiano terrestre mede 40 000 000 m, dividindo por 360 teremos que um
grau do meridiano eqüivale a aproximadamente 111 111 m. Admitindo que um
grau corresponde a 18 léguas, isso nos dá a medida 1
légua marítima = 6 173 m. No
entanto, os registros desses padrões são tão imprecisos que é possível
encontrar documentos atribuindo para a légua marítima o equivalente a 5
555 m. A
milha marítima é talvez a única
dessas unidades extravagantes que deverá permanecer sendo usada. Ela é
hoje definida como valendo 1
852 m, o que a torna igual ao
comprimento de um arco de 1 minuto do meridiano terrestre, ou seja, 1/21 600 do
comprimento do meridiano. Em navegação, posições são determinadas por
ângulos (latitude e longitude), o que torna extremamente cômodo adotar
como unidade de distância o comprimento de um arco de ângulo central
unitário. Aliás, foi algo parecido com isso o que os matemáticos
fizeram adotando o radiano. Felizmente,
na atualidade, quase todos os países do mundo adotam o sistema métrico
decimal. No Brasil, a lei de 26 de junho de 1862 e o decreto número 5 089
de 18 de setembro de 1872 tornaram o sistema métrico decimal obrigatório
a partir de 1o de janeiro de 1874.
Obs.
1: As
definições das unidades legais de medidas no Brasil são feitas pelo
Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial -
CONMETRO. Obs. 2:
O autor pede para citar seus colegas Nilton
Lapa (SP) e Maria Inês V. Faria
(MG), com os quais desenvolveu a atividade que deu origem a este trabalho. |