Um computador de papel!  Existe?  

Marcelo Escudeiro Hernandes
Maringá, PR


    Introdução

Facilitar cálculos sempre incentivou a pesquisa e construção de máquinas ou métodos que diminuíssem os esforços e permitissem maior rapidez e exatidão em operações. Assim foi com o ábaco, as barras de Napier, réguas de cálculo, ... até os computadores de hoje.

Entre esses métodos estão os chamados nomogramas, que são tipos de gráficos onde o resultado de operações é encontrado utilizando uma régua ou qualquer outro instrumento que permita o traçado de um segmento de reta.

Existem nomogramas  para operações elementares como adição, multiplicação,  médias, hipotenusa de um triângulo retângulo e outros.
 

    Adição

Vejamos o exemplo de um nomograma simples para adição de dois números reais.

Tome três eixos A, B, C, paralelos, eqüidistantes e perpendiculares a uma reta  r  dada. Seja  d  a distância entre eles. Graduamos os eixos com uma mesma unidade e marcamos 0  nos três eixos numa mesma horizontal. Nos eixos A e C,  marcamos o número n (ou  -n) a  n  unidades da origem. No eixo B,  marcamos  2n  (ou  - 2n)  a  n unidades da origem. Veja a figura abaixo

Para determinar a soma de dois números  a  e  c,  marcamos  a  no eixo  A  e   c  no eixo  C.  A soma  a + c  será determinada pela interseção da reta que une os pontos  a  e  c  com o eixo  B.

Veja os exemplos:

       1  +  3   =    4

     -3  +  2   =  -1

     -1  +(-1) =  -2

Por que isso funciona?  A explicação é bem simples e pode tomar dois enfoques distintos, um algébrico e outro geométrico. Vejamos, inicialmente, o apelo algébrico: 

Suponha que queremos encontrar a soma de dois números reais  a e c. Consideremos a reta que passa pela origem dos três eixos como sendo o eixo x, e o eixo  B  como sendo o eixo y. 

equação é:

Claramente, pode-se encontrar também a diferença de dois números  e  e  f, usando essa mesma construção. Basta marcar  e  no eixo  B,  f  no eixo  A,  e ler a diferença  d  no eixo  C, dada pela interseção desse eixo com a reta que passa por e e f.  De fato, teríamos f + d = e, donde
d = e - f.

Para a argumentação geométrica, chamemos os pontos correspondentes aos números  a  e  c  de  Pa   e  Pc . Observemos que há apenas três posições distintas para esses pontos:

a) Pa   e  Pc   estão no mesmo semiplano determinado pelo eixo  x.

b) Pa   e  Pc   estão em semiplanos distintos em relação ao eixo  x.

c) Um argumento semelhante aos anteriores pode ser usado se um dos  pontos, Pa  ou  Pc, estiver no eixo x.

 

     CÁLCULO DA HIPOTENUSA


Vejamos a construção de um nomograma que fornece a hipotenusa de um triângulo retângulo se forem dados os catetos.

Como  (hip)2 = (cat1)2  + (cat2)2,  precisamos realizar uma adição e, portanto, podemos tomar o modelo já visto. Mas, como queremos somar quadrados de números, dessa vez  nos eixos  A e C  escrevemos o número  n  a  n2  unidades da origem e no eixo  B  escrevemos o número n  a  n2/2  unidades da origem.

Aos catetos  3 e 4  corresponde a hipotenusa  5  e aos catetos  8  e  5  corresponde a  hipotenusa  » 9,4

 

Detalhando:

PR tem 9 unidades;
a R corresponde ao número 3.

QS tem 16 unidades;
a S corresponde o número 4.

    Multiplicação

Para a multiplicação de dois números positivos pode-se usar novamente o mesmo tipo de nomograma, lembrando que, se x . y = z,  então log x + log y = log z ,  qualquer que seja a base do sistema de logaritmos.  Nesse caso, para marcar os números nos eixos  A  e  C ,  fixamos a origem em cada eixo e marcamos o número  n  a uma distância igual a  log n unidades  dessa origem.  No eixo  B  marcamos  o número  n  a uma distância igual a  1/2 log n unidades da origem.  Uma figura, praticamente igual à de cima, mostrará por que tal nomograma funciona.

 

     NOTA HISTÓRICA (de autoria de José Paulo Carneiro)  

Gráficos como os apresentados neste artigo, ou nomogramas, destinam-se a calcular valores de funções ou resolver equações, através do traçado apenas de retas. Embora seus princípios básicos estejam implícitos em diversos instrumentos imaginados na antiguidade para resolver problemas isolados, o estudo sistemático de nomogramas surgiu em 1885, com C. Lallemand e principalmente com Maurice d’Ocagne, que criou o termo “Nomografia” (M. d’Ocagne, Nomographie. Les calculs usuels effectués au moyen des abaques, Paris, 1891). Nos livros de língua inglesa, os nomogramas são conhecidos também como allignement charts. Até menos de meio século atrás, o estudo dos métodos da Nomografia (assim como do uso da “régua de cálculo”, baseada em princípios semelhantes) fazia parte de um curso padrão de Cálculo Numérico, nos cursos técnicos das Universidades. Embora superados, em termos práticos, pelos computadores, os nomogramas constituem ainda instrumentos interessantes do ponto de vista didático. O leitor interessado pode consultar, por exemplo,  o livro de J. Lipka,  Graphical and Mechanical Computation,  New York, 1918.

 

 

 

Marcelo Escudeiro Hernandes é licenciado pela Universidade Estadual de Maringá, onde atualmente leciona como professor auxiliar, e mestrando em Matemática pelo ICMSC.