Flávio Wagner Rodrigues
São Paulo, SP

O Binômio de Newton é tão belo quanto Vênus de Milo. O que há é pouca gente para dar por isso.

Fernando Pessoa

Embora a Matemática tenha certamente coisas muito mais belas que o Binômio de Newton, é difícil discordar da idéia do poeta de que a beleza nem sempre salta aos olhos do observador, exigindo muitas vezes trabalho e esforço para ser devidamente apreciada.

O principal objetivo deste artigo é convencer o professor a utilizar em suas aulas, além da abordagem tradicional, outras maneiras de interpretar e demonstrar propriedades dos coeficientes binomiais. Vamos discutir alguns tópicos que julgamos interessantes e que raramente são apresentados, sob esse enfoque, nos textos didáticos. O leitor interessado encontrará mais material sobre o assunto no livro [2] que aparece na bibliografia.

Vamos começar, lembrando algumas definições e propriedades.

l. Para n e k inteiros não negativos, o coeficiente binomial de numerador n e denominador k é definido por:

Obs.: Embora o lado direito de ( l ) faça sentido quando k é inteiro positivo e n, um número real qualquer, nós vamos considerar apenas os casos em que n é um inteiro não negativo.

2. O Binômio de Newton

3. O triângulo de Pascal

Trata-se de uma disposição dos coeficientes binomiais em linhas e colunas que, se forem enumeradas a partir do zero, farão com que o
 linha com a k-ésima coluna.

 

     Teorema das Colunas

A soma dos elementos de qualquer coluna do triângulo de Pascal, começando com o primeiro elemento e terminando num elemento qualquer, é igual ao elemento que aparece na linha e na coluna seguintes àquelas à qual pertence a última parcela da soma (ver ilustração acima).

Em símbolos:

Na maioria dos textos didáticos a demonstração desse teorema é feita por indução ou por repetidas aplicações da relação de Stiffel:

O argumento binomial

A sequência  (l + x)k (1 + x)k+1,... , (l + x)k+n  é uma progressão geométrica com  n+ l termos, cujo primeiro termo é   (1 + x)k e cuja razão é  l + x . Usando a fórmula dos termos de uma P.G., para x 0, podemos escrever:

Vamos igualar os coeficientes de xk nos dois lados da identidade (3).

 

O argumento combinatório

Com o objetivo de tomar mais claras as idéias envolvidas, vamos considerar o caso particular k = 3 e n = 4. Portanto, desenvolveremos o argumento para mostrar (sem efetuar os cálculos) que :

Acreditamos que o leitor não terá maiores dificuldades para (se assim o desejar) ler, mais à frente, o argumento no caso geral.


 ser formados com os elementos do conjunto {1,2,3,4,5,6,7,8}. Vamos associar a cada agrupamento o seu máximo, isto é, o maior elemento a ele pertencente. Como os valores possíveis do máximo são 4, 5, 6, 7 ou 8, o conjunto A fica subdividido em 5 conjuntos disjuntos, Aj (4 j 8), onde A, é o conjunto dos agrupamentos cujo máximo é igual a j. Vamos determinar agora, por exemplo, quantos elementos pertencem ao conjunto A6. Para que um agrupamento pertença ao conjunto  A6  é necessário e suficiente que o seu máximo seja igual a 6. Para isso é preciso que o 6 pertença ao agrupamento e que os outros três elementos Como os Aj  são disjuntos e a  sua união é o conjunto A, o argumento combinatório, nesse caso particular, fica demonstrado.

            .........................................................................................

Em geral,


 com os elementos do conjunto { l, 2,... ,n + k + l}. Vamos associar a cada agrupamento o seu máximo, isto é, o maior elemento a ele pertencente. Dessa maneira o conjunto de todos os agrupamentos fica subdvidido em n +1 conjuntos distintos de modo tal que os agrupamentos de um mesmo subconjunto têm todos o mesmo máximo. Para que o máximo de um agrupamento seja igual a  j (k + l   j   n + k + l) é necessário que o elemento  j  pertença ao agrupamento e que os outros k elementos sejam todos menores do que j. Segue-se então que existem determinados pelos valores do máximo são disjuntos e a sua união dá o conjunto de todos os agrupamentos, segue-se que:

o que conclui a demonstração do teorema das colunas.

.........................................................................................

 

     Teorema das Diagonais

Como uma conseqüência do teorema das colunas e do teorema das combinações complementares,

O argumento binomial

Iguale os coeficientes de xk nos dois lados da identidade:

(l + x)n xk + (l + x)n+l xk-1 + . . . + ( l + x)n+k = (l + x)n+k+1 (l + x)n xk+1


No lado direito, o desenvolvimento de (l + x)n xk+1 não tem termo em  xk .

O argumento combinatório

Vamos, uma vez mais, discutir um caso particular, mostrando que


ser formados com os elementos do conjunto {l, 2, . . .,7, 8}, Para j = 1, 2, 3, 4, seja Aj o subconjunto de A formado pelos agrupamentos que contêm o elemento j. Afirmamos que o conjunto A pode ser expresso como a união de cinco conjuntos disjuntos:

Vamos agora contar o número de elementos de cada um desses conjuntos. O número de agrupamentos que contêm o l mas não o 2. Para isso nós colocamos o elemento l no agrupamento e escolhemos os outros três elementos entre os elementos que restam em A quando o  l  e o 2 são excluídos.



O leitor encontrará abordagens desse tipo para mostrar outros tópicos tais como o teorema das linhas, a fórmula de Euler, nos textos mencionados na bibliografia.

Esperamos que os professores se sintam estimulados a mostrar aos seus alunos o lado prático das demonstrações que utilizam casos particulares da fórmula do binómio e a beleza e elegância dos argumentos combinatórios. O caminho é certamente mais longo, mas a paisagem vale a pena.

Referências Bibliográficas

[l]   COHEN. D.I.A. Basic Techniques of Combinatorial Theory. New York: John Wiley & Sons, 1971.

[2|   MORGADO. A.C.O. et alii. Analise Combinatória e Probabilidade Rio de Janeiro: IMPA-VITAE, 1991.

|3]   NIVEN, I. Mathematics of Choice. New York: Random House. 1972.

 

E com prazer que a RPM comunica a seus leitores que Elon Lages Lima foi designado pelo presidente da República para integrar a Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, com um mandato de dois anos.

O professor Elon, que é um assíduo colaborador é membro do Comitê Editonal da RPM, desde o seu primeiro número, publicou na RPM 28 uma entrevista que deu a órgãos da imprensa, na qual ele resume suas opiniões sobre os problemas do ensino da Matemática e faz interessantes sugestões para a busca de soluções. 

A RPM gostaria de transmitir aos professor Elon os votos de sucesso em suas novas funções e deixar registrada a nossa certeza de que a sua presença no Conselho será altamente benéfica para o ensino de um modo geral é, em particular, para o ensino da Matemática no Brasil.