GM de La Penha
End. Atual: Museu Goeldi/CNPq
CX.P. 399
660000 – Belém - PA

Um ramo da matemática do qual EULER pode ser dito um dos fundadores é hoje conhecido por “Teoria dos Grafos”, uma parte hoje adulta e independente da “Topologia”. Esta é, grosseiramente, o estudo das formas das figuras geométricas e das propriedades qualitativas das transformações continuas entre tais figuras; o século XVIII a conheceu como Geometria Situs e mais tarde a denominação topologia combinatória se disseminou até advir a enorme expansão do assunto neste século praticamente dissociando-a de suas origens. Em um artigo clássico de 1736, EULER buscava solucionar um jogo particular, o das sete pontes de Konigsberg1 (Prússia de então, hoje Kaliningrado, Rússia) constituindo no seguinte: dadas duas ilhas no rio Pregel, ligadas entre si e ás margens do rio, por sete pontes, começando em qualquer das quatro áreas de terra, e sem nadar, voar ou dar a volta ao mundo, cruzar cada uma das pontes uma única vez e voltar ao ponto de partida.

A contribuição de EULER no caso, foi de fato a demonstração de que o problema não admite solução. Isso se depreende (não se constituindo em demonstração) ao tentarmos orientar (percorrendo em mão única e apenas uma vez cada segmento) o esquema simplificado (grafo) da figura, chegando sempre a uma inconsistência  (contramão).


Porém como era do seu feito, EULER generalizou seu resultado e enunciou seu teorema em três regras.

Se há mais de duas áreas às quais leva um número ímpar de pontes, então tal jornada é impossível (Caso de Konigsberg). Se, entretanto, o número de pontes é ímpar para exatamente duas áreas, então a jornada é possível se começa em qualquer dessas áreas. Se, finalmente, não existem áreas às quais levam um número ímpar de pontes, então a jornada requerida pode ser realizada iniciando-a a partir de qualquer área.

De maneira concisa pode-se dizer que uma rota do tipo especificado (conhecida como “percurso EULERiano”) é possível se e somente se o  número de áreas servidas por um número impar de pontes é 0 ou 2. Koingsberg tinha quatro áreas servidas por cinco, três e três pontes respectivamente, de modo que nenhum trajeto EULERiano era possível; não obstante, a destruição de pontes pelas guerras, sua reconstrução e a feitura de uma outra mais recente modificou o problema original, a solução global de EULER  se manteve e, no presente, o problema apresenta um percurso EULERiano. Concluindo seu artigo, EULER fez mais: mostrou como após haver sido estabelecida a existência de uma solução, a rota pode ser determinada.

Nota-se que a cidade de Koingsberg não entrou para a Matemática apenas devido às suas pontes. Ela foi o berço do grande filósofo KANT (1724-1804) que além de divulgador dos trabalhos de NEWTON na Prússia de então, veio a deduzir sua própria Metafísica a partir dos estudos filosóficos de seu contemporâneo EULER, cujo trabalho principal nessa área, só veio a ser devidamente assimilado após o surgimento das Geometrias não EUCLIDIANAS (Veja RPM 2 (1983) 28-31) e da Relatividade, isto é, respectivamente, cem e duzentos anos após sua época. Também o eminente matemático HILBERT (1862-1943) nela nasceu enquanto JACOBI (1804-1851), WEIERSTRASS (1815-1897) e H. MINKOWSKI (1864-1909), este mais conhecido em Física, dentre outros, foram matemáticos ilustres ligados à Universidade dessa pequena cidade.

Dentre as mais conhecidas descobertas de EULER está aquela contida na fórmula que relaciona o número de vértices, áreas e faces de um poliedro2. É tão simples que nos faz pensar ter sua origem nos geômetras gregos embora na época estivesse sepultada, com desconhecimento por EULER, em um manuscrito inédito de DESCARTES de 1635. EULER a expôs em uma carta de 1750 dirigida a GOLDBACH (1690-1764) – um prussiano enérgico e inteligente, para o qual a Matemática era uma distração, o reino das letras uma ocupação e a espionagem um meio de vida mas que deixou seu nome registrado na Matemática com um conjectura até hoje não totalmente comprovada. De fato, não foi senão em 1752 que EULER veio a demonstrá-la corretamente ao exibir uma prova por dissecção: cortou peças tetraédricas do sólido até que um único tetraedro restasse. Desde então, demonstrações mais rigorosas têm sido obtidas e o teorema generalizado de muitas maneiras. Assim, EULER havia aberto a trilha em um novo território com vértices, arestas e faces ligadas por:

 

aplicável a certos poliedros bem comportados (convexos ou simples) porém não a “monstros” poliédricos como os da figura.

No entanto, , serve, em um contexto mais, geral, exatamente para definir um número importante, que se presta à classificação das superfícies, chamado “característica de EULER” sendo, como usado por H. POINCARÉ (1854-1912), um dos principais invariantes da moderna Topologia.

Todos os poliedros bem comportados têm  e não é a toa que essa é característica da superfície de uma esfera; certamente os gomos e as costuras de uma bola de futebol lembrarão ao leitor a conexão. De fato, não há outros poliedros regulares ou Platônicos sujeitos a condição de característica 2 que não são os seguintes: cubo, tetraedro, octaedro, dodecaedro e o icosaedro.


Superfície de característica

1N. da R.: Konigsberg era uma pequena cidade da Alemanha. Havia 7 pontes cruzando o rio Pregel que corria sinusiosamente através da pequena cidade. “O povo simples da Alemanha gostava de dar seus passeios e por cima de seus canecões de cerveja perguntavam: como poderá alguém planejar seu passeio na tarde de domingo de tal forma que passe por todas as 7 pontes sem voltar a cruzar qualquer uma delas?... Muito longe, em S. Petersburgo, Euler veio a saber deste problema e o resolveu com sua habitual agudeza...” Extraído de Matemática e Imaginação. E. Kasner e J. Newman. Zahar Editores.

2 V. Teorema de Euler, pág. 15