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Leia o seguinte texto*, supondo que depois será questionado sobre ele: Um jornal é melhor do que uma revista. Um cume ou encosta é melhor do que uma rua. No início parece que é melhor correr do que andar. É preciso experimentar várias vezes. Prega várias partidas, mas é fácil de aprender. Mesmo as crianças podem achá-lo divertido. Uma vez com sucesso, as complicações são minimizadas. Os pássaros raramente se aproximam. Muitas pessoas, às vezes, fazem-no ao mesmo tempo, contudo isso pode causar problemas. É preciso muito espaço. E necessário ter cuidado com a chuva, pois destrói tudo. Se não houver complicações, pode ser muito agradável. Uma pedra pode servir de âncora. Se alguma coisa se partir, perdemo-lo e não teremos uma segunda chance. Cada frase parece fazer sentido, mas se você é como a maioria, ficou com a sensação de que na realidade não percebeu praticamente nada do conteúdo. Volte atrás e, tendo agora em mente que o presente texto fala sobre papagaios de papel, leia o novamente e compare com a primeira leitura. Consegue ver a diferença da sua compreensão nessa segunda leitura? Agora é possível visualizar mentalmente tudo o que é dito no texto. Essa visualização é quase sempre sinônimo de entendimento. Na verdade, quando sabemos do que se trata, é muito mais fácil compreender e assim contribuir para uma melhor memorização e motivação sobre o assunto. A seguir são apresentadas duas situações nas quais novamente se exemplifica que o trabalhar no abstrato causa confusão para certas pessoas: No filme Perigo iminente há uma cena em que um médico, ao estudar a inteligência de um paciente, lhe diz:
— Suponha que você está no meio de um
deserto e... —Mas qual? Num dos programas de questionários, perguntaram a um participante quanto era 12 x 6 e este, desconfiado, pergunta:
—
12 vezes 6 o quê? (metros, litros,
...?) — 12 vezes 6 litros. E assim o concorrente conseguiu fazer o respectivo cálculo. Na disciplina de Matemática passa-se algo de semelhante. A maioria dos alunos não consegue visualizar os elementos e conceitos matemáticos. De fato, a maior parte da Matemática infelizmente ainda é apresentada de uma maneira muito abstrata e formal.
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Há mais de 50 anos, Brownell (1935) verificou que os estudantes desprovidos de situações concretas (como, por exemplo, 5 + 7), do que quando lhes é associada uma unidade (exemplo, 5 laranjas + 7 laranjas). Quando as unidades são omitidas, a soma indicada não só se torna mais difícil, como também se transforma numa abstração a ser memorizada. E quando as unidades estão presentes, os estudantes aparentemente visualizam a situação como real e são capazes de responder corretamente. O mesmo problema acontece a estudantes do ensino secundário perante questões acerca de funções divorciadas de uma situação real. Quando esses estudantes investigam funções em situações concretas (por exemplo, com as relações: x = tempo e y = espaço, no lançamento oblíquo de uma pedra, o movimento é descrito por uma parábola), estão aptos a dar sentido aos resultados matemáticos com a experiência real da situação exemplificada. Quando os alunos inventam falsos raciocínios (por exemplo, (x + y)2 = x2 + y2)* provindos não se sabe de onde, talvez estejam apenas reagindo à dificuldade que têm em relacionar conceitos matemáticos com o seu significado real. Estão também mandando a importante mensagem: "Eu não vejo significado real e, portanto, utilidade nessa matéria. Por isso dêem-me exemplos concretos". É preciso pintar as idéias matemáticas dadas aos alunos. Esses exemplos apresentados servem para justificar tal necessidade, mas muitos outros exemplos no campo da Matemática são comuns no dia-a-dia dos estudantes. E nós, professores de Matemática, muitas vezes, não sentimos a necessidade de materializar os objetos matemáticos, pois, na verdade, somos parte dos poucos sobreviventes de uma Escola passiva e destinada a craques.
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Referências Bibliográficas [l] BROWNELL, W.A. Psycological Considerations in the Learning and the Teaching of Arithmetic. TheTeaching of Arithmetic (pp. 1-31), New York, NCTM e Columbia University, 1935. [2] CARROLL, L. Alice no País das Maravilhas. [3] DAVIS, R. Learning Mathematics: The Cognitiva Science Appronch to Mathematics Education. Ablex Publishing Co., 1984 [4] FARREL, MA. Learn from your Students Mathematics Tearher, 85: 656 659, 1992. [5] LEVINE, M. Effective Problem Solving. New Jersey, Prentice Hall, 1992. [6] National Council of Teachers of Mathematics (NCTM). Professional Standards for Teaching Mathematics, 1991. [7] PAULOS, J.A. Analfabetismo em Matemática e suas conseqüências. Editora Nova Fronteira, 1994.
NR. Não podemos esquecer, porém, que, embora seja bom partir de exemplos concretos para explicar operações e propriedades, é também muito importante dar passos em direção ao abstrato. Na RPM 28, p. 2, ao falar sobre a Matemática, diz Elon Lages Lima: ... a Matemática trata de noções e verdades de natureza abstrata. Aliás, essa é uma das razões da sua força e sua importância. A afirmação 2 x 5= 10 tanto se aplica aos dedos de duas mãos quanto aos jogadores que disputam um jogo de basquete. Certamente temos que ir muito além do 2 x 5 dedos = 10 dedos. |