Augusto César Morgado
Eduardo
Wagner

Resenhas de livro sempre têm um ingrediente subjetivo e isso faz com que às vezes seja interessante mostrar opiniões diversas sobre um mesmo livro. Assim, pela primeira vez, publicamos duas resenhas de um mesmo livro e uma nova resenha. de um livro já apresentado na RPM 27.
 

     Aprendendo e Ensinando Geometria

Primeira Resenha

Mary Montgomery Lindquist e
 Albert P. Shulte

(organizadores)Atual Editora, 1994

Os professores que, de algum modo, se preocupam com o ensino da Geometria na escola já podem contar com um importante auxílio para suas reflexões e seu trabalho em sala de aula. Isso porque a editora Atual publicou, recentemente, o livro Aprendendo e ensinando Geometria.

Publicado originalmente pelo respeitado Conselho Nacional de Ensino de Matemática (NCTM) dos Estados Unidos como livro do ano de 1987, essa obra é uma coletânea de vinte artigos divididos em cinco partes. Cada uma dessas partes agrupa textos com preocupações em torno de:

   fundamentação didática e metodológica para uma abordagem da Geometria na escola,

   a Geometria e suas aplicações na resolução de problemas,

   sugestões sobre o ensino de alguns tópicos particulares de Geometria,

   formas de estabelecer uma conexão entre Geometria e outros tópicos da Matemática e de        outras ciências,

   considerações sobre a Geometria na formação de professores.

Para apontar um dentre os muitos pontos que ilustrariam o valor dessa publicação, mencionamos a preocupação de todos os especialistas que redigiram os artigos em levar em conta aspectos didáticos do ensino da Geometria, aspectos cognitivos referentes à forma como os alunos constróem seu conhecimento geométrico, as dificuldades que permeiam o aprendizado da Geometria na escola e de que modo esses obstáculos podem ser transformados em ações que motivem e desafiem o aluno. Dois artigos do livro poderiam ser citados como exemplo de abordagem das preocupações acima.

O primeiro deles, O modelo vau Hiele de desenvolvimento do pensamento geométrico, apresenta o modelo de pensamento geométrico que emergiu dos trabalhos do casal Pierre e Dina van Hiele. Esse modelo consiste em cinco níveis de compreensão acerca da Geometria, denominados visualização, análise, dedução informal, dedução formal e rigor.

Apoiado em diversas experiências educacionais, o modelo descreve características do processo de aprendizagem de Geometria dos alunos e afirma que o aluno move-se, seqüencialmente, a partir do nível inicial — a visualização — até o nível mais elevado — o rigor —, que diz respeito aos aspectos formais da dedução geométrica. 0 artigo apresenta uma sinopse dos níveis e propõe sugestões de atividades adequadas aos quatro primeiros níveis, que deveriam, de acordo com a proposta do modelo, ser desenvolvidos na escola do primeiro e do segundo graus.

O segundo artigo, Percepção espacial e geometria primária, analisa as habilidades de percepção espacial e considera quais atividades geométricas poderiam desenvolver e realçar tais habilidades na criança da escola primária, pois, na opinião do autor, a própria natureza das atividades envolvidas na geometria primária faz dela o veículo ideal para a aquisição de experiências de percepção espacial.

Em ambos os artigos citados, a maior contribuição que temos é perceber que a Geometria na escola deve ser muito mais do que a apresentação, por parte de livros didáticos e professores, de nomes e propriedades de figuras.

Que o conhecimento geométrico é importante para o desenvolvimento do pensamento matemático e espacial parece já ser um consenso entre nós, professores, porém a discussão sobre quando, como e qual o tratamento dar à Geometria na escola permanece um problema em aberto para o ensino da Matemática. O livro Aprendendo e ensinando Geometria tenta, através de todos os artigos, responder ou, pelo menos, apontar meios para o encaminhamento dessas e de outras questões, o que faz dele uma excelente indicação de leitura.

Kátia Cristina Stocco Smole

 

Segunda Resenha

Lançamento da Atual Editora destinado à Educação Matemática como área recente de pesquisas formais e independentes. O tema em foco é o ensino da Geometria desde a pré-escola até o colegial. São vinte capítulos agrupados em cinco partes, cobrindo cerca de 300 páginas.

A variedade de temas tratados, com bom nível de profundidade, torna o livro atraente e interessante. No capítulo 1 faz-se uma descrição bastante abrangente de um modelo que procura descrever a evolução do pensamento geométrico - modelo de Van Hiele, fruto das pesquisas de um casal holandês, Dina e Pierre van Hiele. Ficamos sabendo que a extinta União Soviética reformulou seu currículo de Geometria na década de 60 para adaptar-se ao modelo Van Hiele. A julgar pela farta bibliografia citada no final do capítulo e ao longo do texto, o tema deve ser objeto de estudo obrigatório para todos que ensinam Geometria.

Dentro da heterogeneidade de pontos de vista de como deve ser conduzido o ensino da Geometria há também os defensores da incorporação imediata dos micro-computadores. A linguagem Logo é usada na arquitetura de programas que geram desde figuras poligonais simples até fractais com boa resolução nos atuais micro-computadores. Esse tema está tratado no capítulo 8.

Alguns capítulos são sobre temas não diretamente ligados ao ensino primário e secundário. Exemplo é o capítulo 9, Alguns usos modernos da. Geometria. Os autores descrevem três aplicações da Geometria. Na primeira, uma propriedade dos quadrados latinos, obtida através das chamadas geometrias finitas, é usada para orientar a implementação de um teste estatístico. Na segunda, muito curiosa, a geometria das transformações é aplicada na Arqueologia. A terceira descreve uma aplicação na Álgebra Avançada, sobre grupos.

Mais próximo para uso em sala de aula, no nível colegial, é o capítulo 18, Problemas geométricos de contagem. > Os autores começam com o seguinte problema: Quantos quadrados podem ser traçados num tabuleiro de xadrez n x n? Entenda-se que os quadrados devem ser formados com as células do tabuleiro. A análise é muito bem conduzida e chega-se à resposta: l 2 + 22 + . . . n2. Generaliza-se o problema em mais de um sentido.

Há também capítulos específicos sobre construção e uso de material concreto -ampliação de figuras, construção de polígonos e poliedros usando cartolina. Muito adequado para o ensino primário. Como exemplo temos o capítulo 12, no qual são descritas várias atividades envolvendo o conceito de semelhança.

A nosso ver, há no livro todo uma unanimidade que transcende povos e nações no que diz respeito ao ensino da Matemática em todos os níveis: a resolução de problemas variados e não rotineiros deve incorporar qualquer projeto de ensino. As pesquisas em Educação Matemática têm o objetivo de encontrar os melhores caminhos para essa meta ser atingida.

Claudio Arconcher

 

     Introdução à Geometria Espacial

Paulo Cezar Pinto Carvalho
IMPA / VITAE, 1993.

Trata-se de mais um título da coleção IMPA / VITAE, publicado com o objetivo de oferecer ao professor que atua no ensino secundário um texto de estudo onde a Geometria Espacial é tratada de forma rigorosa (postulado - teorema - corolário -teorema ...), mas quase como um diálogo entre o autor e o leitor.

Tomando como ponto de partida a Geometria Plana, o autor, em poucas páginas, chega à terceira dimensão. Interessante aqui é a lúcida discussão que se estabelece para eleger o postulado (postulado 5: se dois planos possuem um ponto em comum, então eles possuem pela menos mais um ponto em comum) que fixa a terceira dimensão do espaço. Essa maneira de justificar o papel desempenhado pelo postulado conduz o leitor a um verdadeiro exercício de criação matemática, coisa que, infelizmente, está cada vez mais ausente dos textos para o segundo grau.

No capítulo 3, sobre paralelismo de retas, podemos ler o teorema: por um ponto fora de uma reta pode-se traçar uma única reta paralela a ela. Trata-se da extensão para o espaço do postulado de Euclides sobre paralelas.  Em dimensão dois é um postulado, em dimensão três é um teorema.

Até o capítulo 9 o autor constrói todos os conceitos e teoremas familiares da Geometria Espacial. Chega-se a cada teorema sempre com uma justificação prévia da sua necessidade e oportunidade. O capítulo 10 é dedicado à esfera. Justifica-se a existência da esfera inscrita e a da esfera circunscrita ao tetraedro regular, aparecendo também a esfera tangente às arestas do tetraedro - tema que se tornou ausente na maioria dos atuais textos publicados sobre Geometria. O último capítulo - onze - é uma pincelada na Geometria Descritiva. Em pouquíssimas páginas o leitor terá uma clara noção desse assunto, hoje praticamente banido do segundo grau.

Os exercícios que completam cada capítulo não são numerosos mas, muito bem escolhidos, dão ao leitor a oportunidade de se exercitar nos assuntos abordados pelo autor.

Texto muito recomendável para todas as escolas do segundo grau e para cursos de Licenciatura em Matemática.

Cláudio Arconcher

(Uma outra resenha do mesmo livro encontra-se na RPM 27, p. 52.)

 

     Introdução às Funções e à Derivada

Geraldo Ávila
Atual Editora, 1994

Teoria de derivação é um tema sofisticado que só pode ser compreendido após um curso de limites, certo? Por isso "derivadas" devem ser ensinadas na Faculdade, nos cursos de Cálculo e, excepcionalmente, para alunos "fortes" do final do colegial, certo? Assim, os benefícios de estudar funções — gráficos, crescimento, etc. — e cinemática — velocidade, aceleração, etc. — com auxílio da teoria da derivação é algo inacessível aos alunos do 1 colegial, certo?

Errado!

Neste livro, o professor Geraldo Ávila se propõe a apontar um caminho para o estudo de derivadas e suas aplicações de maneira simples, direta, acessível a um aluno "normal" da 1.ª série do 2 grau.

Vejamos como o livro foi arquitetado para atingir esses objetivos.

No primeiro capítulo o autor faz uma introdução ao estudo de funções, com ênfase na construção de gráficos e na compreensão de propriedades das funções através de seus aspectos geométricos. Os exemplos estudados incluem funções do 1 e do 2 graus, hipérboles e raízes.

No segundo capítulo apresenta-se o conceito de derivada a partir do estudo da reta tangente ao gráfico de uma função num ponto dado. Algumas aplicações importantes são estudadas, como o crescimento e decrescimento de funções, e os resultados aplicados imediatamente à função do segundo grau. Chega-se até à regra da cadeia e à análise da inversa de uma função e de sua derivada. As funções trigonométricas não aparecem no livro, porque normalmente serão ensinadas mais tarde, no 2.° grau. A riqueza da idéia de derivada pode ser apreciada mesmo nos exemplos iniciais, mais simples, como a função quadrática.

No capítulo seguinte, todo dedicado à cinemática, vemos como esse assunto pode ser abordado de maneira mais ágil e mais simples quando as idéias anteriormente apresentadas são aplicadas ao estudo de movimentos.

As funções exponencial e logarítmica são tratadas nos dois capítulos seguintes. No primeiro elas são estudadas de maneira bastante completa, com aplicações interessantes. No segundo, são desenvolvidas muitas outras aplicações importantes: decaimento radioativo, idades geológicas, juros compostos, entre outras.

Ao longo do texto encontramos muitos exercícios e notas históricas que complementam a leitura. Cabe destacar que o livro foi escrito para o professor, não sendo destinado ao uso direto em sala de aula no 2.° grau. Ele é adequado para uso em cursos de Licenciatura em Matemática, de reciclagem ou de aperfeiçoamento para professores.

A grande contribuição do professor Geraldo está em mostrar um caminho para o ensino de derivação e aplicações que atrairão os alunos numa classe "normal" do 2.° grau.

O texto é bem escrito e acessível, estando lançadas as bases de uma proposta de renovação do ensino do 2° grau, que tem tudo para funcionar bem. O ideal seria trabalhar de forma integrada com a Física para que o aluno perceba melhor a força da teoria estudada. Cabe a nós termos a disposição de começar.


Cláudio Possani


A RPM recebeu, em 1995, diversas publicações de interesse para o professor de Matemática. Entre elas:

    Folhetim de Educação Matemática, números 24 a 29.
Inf.: NEMOC - Av. Universitária s/n - km 03, BR 116 - Campus Universitário - 44031-460 Feira de Santana, BA.

    Zetetiké
Inf.: Faculdade de Educação - UNICAMP - Caixa Postal 6120 -13081-970 Campinas, SP.

    Revista de Educação Matemática
Inf.: Sociedade Brasileira de Educação Matemática- Regional São Paulo -Av. 24 A, 1515 - 13506-700 Rio Claro, SP

    A Educação Matemática em Revista
Inf.: Sociedade Brasileira de Educação Matemática - Caixa Postal 1507 -89010-971 Blumenau, SC.

    Jornal de Mathemáíica Elementar (publicação mensal)
Inf.: Rua António Saúde, 16 - 4? E - 1500 Lisboa - Portugal.

    El Acertijo (La Revista de los Juegos de Ingenio)
Jnf.; Casilla de Correo 74, Sucursal 12 - (1412) Buenos Aires, Argentina.

   Revista del Professor de Matemáticas
Jnf.:
Sociedad de Matemática de Chile - Maria Luisa Santander 0363 -Providencia - Santiago, Chile.

    Epsilon (Revista de la Sociedad Andaluza de Educacion Matemática "Thales")
ínf.: S.A.E.M. "Thales" - Facultad de Matemáticas - Apartado 1160 - 41080 Sevilla, Espanha.

    Quantum (The magazine of Math and Science)
Informações e xerox de alguns artigos foram enviadas à RPM pelo colega íris Yan, Rio de Janeiro, RJ.
Inf.: Quantum - PO Box 2485 - Secaucus, NJ 07096-9813 - Estados Unidos

Além dessas, a RPM recebeu também exemplares do Boletim da Sociedade Portuguesa, de Matemática, Lecturas Matemáticas da Sociedad Colombiana, de Matemáticas, Boletim da. Sociedade Paranaense de Matemática, Revista Nova Escola, todos contendo, entre outros, artigos de interesse para o professor de Matemática da escola média.

 

Jakubo

No mês de julho deste ano, os professores de Matemática perderam o colega José Jakubovic (Jakubo).

Para nós, que assinamos esta nota, é muito difícil escrever sobre o Jak porque, por vários anos, convivemos, trabalhamos juntos, dividimos a autoria de livros e artigos, e fomos amigos muito próximos.

Os leitores da RPM poderiam ter uma pálida idéia de seu trabalho folheando exemplares antigos. Há colaborações dele e referências a seus livros. Já na RPM 1 comentava-se o Matemática Aplicada (atualmente fora de catálogo), obra que na época continha um sopro renovador. Essa abordagem original era fruto da colaboração dos três co-autores, mas seus primeiros gérmens nasceram da cabeça inquieta de nosso amigo.

Para conhecer melhor o Jak, seria preciso encontrá-lo na sala de aula. Começou 25 anos atrás, em cursinhos pré-vestibulares, destacando-se por explicações claras e precisas. Evoluiu, foi além do ensinar ou explicar. Tornou-se aquele que orientava os alunos — tanto os interessados como os reticentes — na descoberta e produção de ideias matemáticas. E isso ocorria com crianças, adolescentes ou mesmo em seus cursos para professores. As pessoas ficavam satisfeitas consigo mesmas, com a Matemática e com o Jak.

Numa de suas palestras recentes, ele comentava como era ilógico, da parte de nós, professores, esperar que o aluno procedesse sempre com a nossa lógica (e não com a dele!). Essa consideração revela uma das bases de sua atuação como professor: o respeito pelo outro (o aluno), pelas suas ideias, pelo seu raciocínio. Daí, sua preocupação em ajudar a construir conhecimento ao invés de impor conhecimento.

Essa atitude do Jak era também uma de suas melhores qualidades como ser humano e faz dele um exemplo para todos nós, professores.

 

Luiz Mareio Imenes  e  Marcelo Lellis