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José Orlando Gomes Freitas
A Geometria grega pode ser comparada a um elemento manual, a Algebra árabe a uma produção automática, à máquina. (Luci L. Radice)
A RPM recebe colaborações não apenas de colegas aqui do Brasil, mas também de outros países. Este artigo veio de Funchal, Ilha da Madeira, Portugal. Optamos pela versão original. O autor já nos mandou outros pequenos trabalhos e numa carta explica: "Um dos meus passatempos é fazer pequenos artigos, (. . .) por nos dar uma rodagem, pois a formação contínua é importante nos dias de hoje. E sempre podemos apresentá-los aos nossos alunos". A RPM dá as boas-vindas ao professor José Orlando Gomes de Freitas no rol de seus autores e, em nome dos leitores, agradece a colaboração. Já é do nosso conhecimento que a geometria analítica é a "geometria que usa sistemas de coordenadas e métodos algébricos na representação de pontos, rectas e curvas". A geometria analítica parece consistir na associação de três factores: a expressão de uma realidade geométrica por uma relação entre quantidades variáveis, o uso das coordenadas e o princípio da representação gráfica. Ora, se cada um destes três factores surge desde muito cedo no desenvolvimento da geometria anterior a Descartes, eles não foram no entanto encadeados. A idéia de caracterizar um ponto do plano por meio das suas coordenadas surge na Grécia antiga. Apolônio (séc. III a.C.) caracterizou as secções cônicas através das suas coordenadas, sem as designar por esse nome e sem lhes atribuir valores numéricos. Também na mais alta antiguidade, a observação astronômica conduzira a referenciar as direcções no espaço por duas coordenadas angulares: altura acima do horizonte e afastamento em relação ao meridiano. Contudo, a interpretação das relações entre essas coordenadas, ou seja, a geometria analítica só aparece muitos séculos depois. Um diagrama cartesiano é uma coisa que se vê agora todos os dias; compreende-se, ainda que não se saiba, que aquelas "figurinhas" se chamam assim: diagramas cartesianos. Quando jogamos a Batalha Naval, para nos referirmos a um lugar temos uma letra e um número, ou seja, duas coordenadas. Quando analisamos um Mapa do Mundo ou mesmo uma Planta de Lisboa ou Funchal, utilizamos duas coordenadas para indicar o destino desejado. Para os aviões em pleno voo é preciso mais um número para dar a sua altitude. E, se quisermos, usamos uma quarta coordenada para o tempo. "y = ax + b, com a e b constantes reais, é uma recta; x2 + y2 = r2 é uma circunferência com centro na origem e raio r; e por aí diante... à Descartes". A primeira vez que afirmei isto às minhas turmas do 10.° ano (programa novo), os alunos fizeram uma cara de espanto mas, umas aulas depois, eles próprios já chamavam recta a y = x e circunferência a x2 + y2 = 1, entre outros exemplos. Descartes terá sido influenciado pelos trabalhos de Nicolau Ores-me (bispo de Lisieux), que num seu trabalho (1360) introduz as coordenadas rectangulares (longitude e latitude), bem como a equação da linha recta. Oresme começa por apresentar o princípio de representação gráfica no plano, passando ao espaço a três dimensões e chegando a antever o que hoje é o espaço a quatro dimensões. Mas a sua teoria não pôde evoluir devido à falta de simbolismo algébrico. E é precisamente neste aspecto que Descartes - paralelamente com Fermat, apesar da notação deste último ser antiquada, apegado à linguagem pesada da álgebra dos gregos - desempenha um papel fundamental. Recorrendo a dois eixos perpendiculares e às coordenadas dos pontos do plano, relativamente a esses eixos, desenvolve o estudo das curvas e considera que a definição de cada curva (ou linha) é a expressão da relação algébrica entre as coordenadas x e y dos seus pontos. Estendendo ao espaço o que se passa no plano, Descartes considera três planos perpendiculares dois a dois e estabelece que, fixados esses planos, qualquer ponto do espaço é determinado pelas distâncias a cada um deles, ou seja, por três coordenadas. O verdadeiro progresso realizado por Descartes reside no facto de, em vez de limitar tal cálculo ao estudo de uma dada figura, como faziam os gregos, ele o erigir em processo geral susceptível de permitir a criação de uma infinidade de novas curvas. As idéias e obras de Descartes vão revolucionar não só a Matemática como também a Filosofia. Após a sua morte é colocado no Índex, o que não impede que a sua obra venha a ser divulgada e influencie as gerações seguintes. Referências Bibliográficas [1] COSTA, Liliana. Matemática - 10° ano, Lisboa, Texto Editora, 1992. [2] RADICE, L. Lúcio. La Matemática da Pitagora a Newton, Roma, Editori Riuniti, 1971. [3] Vários autores. Galileu, Descartes e o Mecanismo, Lisboa, Gradiva, 1987.
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