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Oscar
Guelli
Com a morte de Alexandre, o Grande, no ano 324 a.C, o império mundial que ele havia construído foi dividido entre os seus generais. O Egito ficou sob o domínio de Ptolomeu. Na cidade de Alexandria, Ptolomeu criou um centro de ensino e pesquisa chamado Museu, que significa refúgio das musas. Mais de 500 mil manuscritos foram guardados na biblioteca do Museu. Muitos dos grandes cientistas dessa época trabalharam no Museu. Entre eles lá estava Euclides de Alexandria. O Museu funcionava como uma espécie de universidade moderna. Entre os professores, alguns se dedicavam à pesquisa, outros eram bons administradores e uma parte se destacava pela capacidade de ensinar. Euclides fazia parte deste último grupo. Foi, provavelmente, por esta razão que o livro Os Elementos, escrito por Euclides por volta de 300 a.C. e depois copiado e recopiado centenas de vezes, teve uma repercussão tão grande nos meios científicos. Durante mais de 20 séculos os homens estudaram a Geometria, segundo Euclides. Todo estudante de Geometria tem uma dívida de gratidão para com Euclides. Mas os estudantes de Álgebra também devem saber algo sobre ele. Para um estudante de hoje, a Álgebra começa quando as quantidades desconhecidas passam a ser representadas por letras. Na sua "Álgebra" Euclides representava as quantidades desconhecidas por segmentos de retas, quadrados, retângulos, triângulos, etc.
Veja: nós entendemos o produto notável (a + 6)2 como "o quadrado do primeiro termo, mais duas vezes o produto do primeiro termo pelo segundo, mais o quadrado do segundo termo", isto é, (a + b)2 = a2 + 2ab + b2 Euclides e seus colegas de Alexandria também manejavam com muita facilidade este produto notável, mas interpretando-o através desta construção geométrica:
Você
consegue reconhecer nesta construção geométrica:
o produto notável (a + b)(a b) = a2 b2 ?
Euclides realiza muitas construções semelhantes a estas nos Elementos, utilizando-se somente de uma régua e de um compasso. Além disso a régua não tem qualquer tipo de marcação, nela não está assinalado nenhum milímero, nenhuma medida. Euclides e os antigos matemáticos preocupavam-se apenas com as relações que podiam obter geometricamente. Para eles, os cálculos e as medidas eram para serem efetuados unicamente por escravos. Um problema simples como este, formulado pelos matemáticos egípcios, há cerca de 4 000 anos:
Um
número, o seu dobro, a sua
terça parte, todos ao juntar-se aprendemos a expressar através de uma equação:
No tempo de Euclides a Álgebra Simbólica estava ainda muito distante de ser inventada; por isso os matemáticos da antiguidade usavam construções geométricas para estudar equações. Veja como podemos visualizar a resolução desta equação através de um método descrito por Euclides no livro 2 dos Elementos, e que passou para a história com o nome de Álgebra Geométrica: Em primeiro lugar construímos um retângulo de área 10. Ao invés do retângulo ao lado, poderíamos ter desenhado qualquer outro cujos lados tivessem estas medidas: 10 e 1, 4 e 2,5 , 1,25 e 8 etc. Procuramos traduzir o problema através de área de figuras planas. Esta primeira construção corresponde à seguinte passagem na equação:
"Anexamos" a este retângulo, era assim que se escrevia antigamente, um novo
Com os passos seguintes vamos construir um outro retângulo de área igual à área do retângulo de lados 5 e 2. Por isso, prolongamos a diagonal do retângulo até ela cortar o prolongamento do lado 5 e formamos um outro retângulo:
Observe:
área de
A + área de B + área de C = área de A' + área de B' + área de C
Portanto
Para os matemáticos de hoje, a resposta do problema é o número real
A "Álgebra" de Euclides significa a construção desta figura
e a solução da "equação" é o segmento AB. Dois motivos impediram que a Álgebra Geométrica tivesse um papel muito mais destacado no estudo das equações na Matemática: um motivo político: a sociedade grega desta época era escravocrata e o desenvolvimento da ciência refletia a estrutura social. Assim, os antigos matemáticos gregos consideravam os cálculos com números e medidas um assunto de escravos, indigno de cidadãos livres; o outro motivo era puramente matemático: os antigos matemáticos gregos ficaram surpresos e desnorteados ao descobrirem que havia alguns problemas impossíveis de serem resolvidos através da Álgebra Geométrica de Euclides. Mas não foram somente eles. Por mais de 2 000 anos, matemáticos de outros povos também tentaram resolver estes problemas, usando somente uma régua não graduada e um compasso. E a história de um destes problemas, chamados de problemas insolúveis da antiguidade, que vamos discutir.
Quando uma pessoa está fazendo um cálculo errado, absurdo, é comum dizer que ela quer "quadrar o círculo".
Esta expressão significa, simplesmente, que dado um círculo devemos construir um quadrado que tenha exatamente a mesma área do círculo, usando somente uma régua não graduada e um compasso. E muito fácil construir um quadrado de área aproximadamente igual a de um círculo dado. Veja: a área de um círculo de raio r é igual a r2 . Construir um quadrado de área igual à de um círculo de raio 1 equivale a construir um segmento dado por
Sabemos que e, portanto, . Podemos, agora, construir um quadrado de lado 1,772 - a sua área será aproximadamente igual à área do círculo de raio 1. Durante cerca de 20 séculos, os mais brilhantes matemáticos de todo o mundo não conseguiram construir, usando somente régua e compasso, um quadrado que tivesse exatamente a mesma área que um círculo dado. E este o significado da Álgebra Geométrica de Euclides: efetuar construções com régua e compasso seguindo os passos da demonstração de um teorema. Os numerosos esforços para quadrar o círculo duraram desde o século 3 a.C. até o século 19. Em 1882, um matemático alemão, chamado Lindemann, mostrou a impossibilidade de se resolver o problema através da Álgebra Geométrica: é impossível construir o segmento , usando-se apenas uma régua e um compasso. A demonstração requer uma Matemática bastante sofisticada. A Álgebra Geométrica dos antigos matemáticos gregos e a regra da falsa posição (v. RPM 15, p. 18) do Egito Antigo representaram, de um certo modo, o esforço dos matemáticos da antiguidade para encontrar uma linguagem apropriada para as equações. Mas os dois métodos apresentavam falhas: a Álgebra Geométrica não tinha resposta para vários problemas ; a regra da falsa posição parecia uma "receita", sem nenhuma justificação ou explicação. Por volta do ano 400 d.C, uma idéia simples e audaciosa de um matemático de Alexandria, chamado Diofante, iria começar a mudar todo o aspecto da Matemática: começavam a surgir os primeiros símbolos matemáticos, inicialmente na forma de abreviação de palavras. Mas esta já é uma outra história.
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