Paulo Antonio Esquef
Sérgio Armando P. Ribeiro

 

Ensina-se, no nível médio, que as orbitas dos planetas do sistema solar são regidas pelas três leis de Kepler, das quais a primeira afirma que: "a órbita de qualquer planeta do sistema solar é elíptica, com o Sol em um de seus focos".

Os livros tradicionais de Física mostram elipses representativas das órbitas (na maioria das vezes com excentricidades exageradas) e apresentam tabelas com dados astronômicos relativos aos planetas, mas não determinam as equações dessas elipses. Por outro lado, em Matemática, no estudo das cônicas, o aluno se depara com a elipse, aprende sua equação, e propriedades como a excentricidade, etc., sem que, em geral, lhe seja mencionada alguma aplicação. A partir daí surgiu a idéia de mostrar a utilidade das elipses no estudo das órbitas dos planetas, usando dados astronômicos e escolhas apropriadas de fatores de escala.

O objetivo deste trabalho é, então, obter a equação cartesiana da órbita de um planeta em função do seu afélio – o ponto da órbita em que o planeta está mais afastado do Sol e do seu periélio – o ponto da órbita em que ele está mais próximo do Sol.

As distâncias entre o Sol e os afélios e periélios dos planetas do sistema solar são facilmente encontradas em livros de Astronomia ou em sites adequados da Internet.

 

Criando um sistema cartesiano no plano orbital

No plano orbital do planeta (plano que contem a sua órbita), vamos imaginar, com o auxílio da figura 1, um eixo x passando pelos dois focos da elipse: um o Sol, S, e o outro o pequeno ponto a direita. O eixo y é perpendicular ao eixo x e passa pelo Sol. O Sol é o único elemento "fixo" do sistema.

A figura 1 tambem mostra o planeta (simbolo ) no seu afélio e periélio, sendo A e P, respectivamente, a distância do afélio e do periélio ao Sol.

figura 1: planeta (simbolizado por ) no seu afélio e periélio

 

Obtendo a posição do planeta em função de A e P

Vamos partir da equação da elipse = 1 em que a e a metade do eixo maior, b a metade do eixo menor é x0 e y0 são as coordenadas do centro da elipse no sistema cartesiano. A distância entre os focos vale 2c. No nosso caso, temos x0 = c e y0 = 0. Então, a equação da elipse fica = 1. (*)

Da figura 1, temos A + P = 2a e P + 2c = A, o que permite obter a e c em função de A e P : a =  e  c = .

Substituindo esses valores de a e c na relação conhecida entre a, b e c, que é a2 = b2 + c2, obtemos b em função de A e P :

= b2 + ou

b2 = [(A + P)2 - (A - P)2] = 2A × 2P = A × P

A equação (*) da elipse pode, então, ser escrita em função de A e P como

= 1. (**)

A excentricidade e = c/a da elipse é dada por e = .

A tabela a seguir mostra, em Unidade Astronômica (U.A.)#, as medidas A, as medidas P e as excentricidades, e, dos planetas, calculadas usando a relação acima.

Planeta A(U.A.) P(U.A.) e
Mercúrio (Me) 0,46670 0,30750 0,20563
Vênus (V) 0,72823 0,71834 0,00677
Terra (T) 1,01671 0,98329 0,01671
Marte (M) 1,66599 1,38133 0,09341
Júpiter (J) 5,45517 4,95156 0,04839
Saturno (S) 10,05351 9,02063 0,05413
Urano (U) 20,09647 18,28606 0,04717
Netuno (N) 30,32713 29,81080 0,00859

# Unidade Astronômica (U.A.): medida de distância utilizada em Astronomia.
A unidade astronômica é definida como a distância média entre a Terra e o Sol.
Uma U.A. equivale a 149.597.870,7 km.

Vamos analisar inicialmente as excentricidades das órbitas. Sabemos que a excentricidade e de uma elipse é tal que 0 < e < 1; para e = 0, a elipse se degenera em uma circunferência e, para e = 1, em um segmento de reta. Se e se aproxima de zero, então A se aproxima de P e a equação (**) tende a equação da circunferência: x2 + y2 = R2, com R2 @ A2 @ P2.

Observando as excentricidades na tabela, vemos que, com exceção de Mercúrio, elas estão na ordem dos centésimos ou dos milésimos, ou seja, todas bem próximas do zero. Conclui-se então que as elipses das órbitas dos planetas têm aspectos parecidos com circunferências.

 

Plotagem das órbitas elípticas

O programa de computador usado na plotagem das órbitas foi o GeoGebra (http://www.geogebra.org/cms/pt_BR), utilizando o modo implícito com entradas do tipo T: 4 (xat/2+pt/2)2/(at+pt)2+y2/(at*pt) = 1 {pt x at} onde T foi o identificador da função para a Terra, at e pt parametros que receberam os valores das distâncias ao Sol do afélio e periélio da Terra.

O GeoGebra exige que os valores dos parâmetros da função sejam informados previamente na janela de entrada. A fórmula principal pode ser copiada para a caixa de entrada e, em seguida, atualizar os parâmetros para a órbita correspondente.

As equações usadas para gerar as órbitas foram obtidas substituindo os valores de A e P dos respectivos planetas na equação (**). A tabela a seguir mostra as equações orbitais obtidas dos oito planetas do sistema solar.

Planeta Equação Orbital
Mercúrio (Me) 6.67264x2 + 6.96701y2 – 1.06195x = 0.95775
Vênus (V) 1.91126x2 + 1.91135y2 – 0.01871x = 0.99995
Terra (T) 1.00000x2 + 1.00028y2 – 0.03342x = 0.99972
Marte (M) 0.86150x2 + 0.86908y2 – 0.24523x = 1.98255
Júpiter (J) 0.07387x2 + 0.07404y2 – 0.03720x = 1.99532
Saturno (S) 0.02199x2 + 0.02205y2 – 0.02271x = 1.99414
Urano (U) 0.00543x2 + 0.00544y2 – 0.00983x = 1.99555
Netuno (N) 0.00221x2 + 0.00221y2 – 0.00114x = 1.99985

As figuras 2 e 3, a seguir, são cópias da tela do GeoGebra; mostram as órbitas plotadas e a posição do Sol. Os eixos cartesianos foram "escondidos" e as órbitas foram traçadas, para maior facilidade, em um mesmo plano, embora seja sabido que os planos orbitais dos planetas não são coincidentes.

figura 2                                                      figura 3
escala: 3 mm = 1 U.A.                                 escala: 3 cm = 1 U.A.

Observe que, na órbita de Mercúrio (Me), o Sol aparece bem mais deslocado do centro da elipse do que na da Terra ou na de Vênus; e isso porque a excentricidade de Mercúrio é cerca de 12 vezes maior do que a da Terra e cerca de 30 vezes maior do que a de Vênus.

O leitor também pode observar que a equação da órbita de Netuno, com os coeficientes representados com precisão de 5 casas decimais, corresponde a equação de uma circunferência de equação

+ y2 = R2, sendo

R = = 30,08282

resultado bem próximo do valor do raio médio de Netuno.

 

Nota da RPM: Sugerimos ao leitor o artigo Arredondada ou achatada?, publicado na RPM 11, p. 42.

 

 

Referências bibliográficas

[1] Iezzi, Gelson. Fundamentos da Matemática Elementar, vol. 7. São Paulo: Atual, 1993.

[2] Penteado, P. C. Martins. Física – Conceitos e aplicações, vol. 1. São Paulo: Moderna, 1998.

[3] Beserra, Vagner de Sousa; Guimaraes, Diego Dias Machado. Ambiente Multimídia para o ensino de seções cônicas – Elipse.
http://www.feg.unesp.br/~man04026/sceclipse/Artigo.pdf