Lenimar Nunes de Andrade
João Pessoa, PB

O algoritmo de Briot-Ruffini para a divisão de um polinômio    de grau  n  por um polinômio    de grau 1 é de fácil aplicação. Apesar de fazer uma grande restrição com relação ao grau do divisor  , é um algoritmo amplamente divulgado e utilizado no 2o grau.

Neste artigo, mostramos que esse algoritmo pode ser generalizado. É possível obter um algoritmo semelhante, também de fácil aplicação, no qual o divisor    pode ter qualquer grau. Esse algoritmo pode ser utilizado como uma alternativa à trabalhosa divisão euclideana tradicional de dois polinômios quaisquer, estudada na 7a série do 1o grau e revista no 2o grau sem modificações.

Todos os polinômios mencionados neste artigo têm coeficientes reais; no entanto, eles poderiam ser polinômios de coeficientes complexos que tudo continuaria funcionando do mesmo modo.

Suponhamos que queiramos dividir, por  ,  o polinômio
. Neste caso, g(x) é da forma  , com  a = 2 . Temos o conhecido diagrama de Briot-Ruffini:

Neste diagrama, na primeira linha temos os coeficientes de    e na segunda linha à esquerda temos o valor de  a. Cada elemento da 3a linha é obtido somando-se os dois elementos da 1a e 2a linhas que se situam acima dele, com exceção do 1o elemento, que é uma simples repetição do 1o elemento da linha. Os elementos da 2a linha são obtidos multiplicando-se  a  pelo elemento da 3a linha situado na coluna anterior.

É mais comum o diagrama anterior aparecer nos livros do 2o grau com a omissão da 2a linha. A 2a linha está sendo escrita para facilitar a comparação com os exemplos a seguir. Os elementos da 3a linha fornecem o quociente    e  o resto    da divisão  de    por  .

Vamos agora construir um diagrama semelhante para efetuarmos a divisão de    por  :

 

Neste diagrama (* ver a seguir), cada elemento da última linha é obtido somando-se os elementos acima dele, da coluna a qual pertence. De modo semelhante ao algoritmo de Briot-Ruffini, na última linha temos os coeficientes do quociente e do resto da divisão:

  e  .

Basta separar à direita tantos elementos quanto for o grau de ; uma vez determinados  os coeficientes de  , os coeficientes do quociente    são os que sobram à direita dos coeficientes de  .

*O diagrama é construído da seguinte forma:

(1)   Escrevemos na 1a linha do diagrama os coeficientes de  , seguindo a ordem decrescente das potências de  x. Coeficientes nulos devem ser considerados.

(2)   Escrevemos os coeficientes de  , exceto o do termo de maior grau, na 1a  coluna, com sinais trocados; iniciamos na 2a linha, observando a ordem decrescente das potências de  x.

(3)   Repetimos o elemento da  1a  linha e  1a  coluna na última linha. da  1a  coluna. Deixamos vagos os espaços correspondentes aos elementos situados abaixo da diagonal que se inicia no elemento da  1a  linha e  1a  coluna.

(4)   Os elementos da última linha são escritos da esquerda para a direita. Para cada elemento    escrito  na  última linha, calculamos os produtos de    pelos elementos da  1a coluna  (-3, 5 e -1)  e distribuímos esses produtos no diagrama segundo uma diagonal iniciada na 2a linha e coluna imediatamente à direita de  , “descendo” para a  4a   linha e  3   colunas à direita de  .

(5)   Assim que for escrita a diagonal mencionada no item anterior, somamos os elementos escritos na coluna logo à direita de  , escrevendo a soma na última linha da mesma coluna.

(6)   Repetimos (4) e (5) seguidamente, até escrevermos o elemento da última linha e última coluna do diagrama. Devem ser deixados vagos os espaços correspondentes aos elementos da 2a e 3a linhas situados acima da diagonal iniciada na última coluna da penúltima linha.

A grande vantagem deste algoritmo é que não perdemos tempo escrevendo potências de  x, nem efetuando produtos e divisões do tipo    e  ,  que ocorrem diversas vezes no método tradicional; em relação aos coeficientes, não há diferença significativa entre a quantidade de operações aritméticas efetuadas nos dois métodos.

Demonstração

Para provarmos que este algoritmo sempre funciona podemos proceder de forma semelhante à demonstração do algoritmo de Briot-Ruffini.

Em linhas gerais, a demonstração pode ser feita da seguinte forma. Sejam

dois polinômios tais que  n m.  PeloAlgoritmo da Divisão, existem polinômios

 e  tais que

.

Desenvolvendo as operações com polinômios indicadas na igualdade anterior e comparando os coeficientes dos polinômios do 1o membro e do 2o membro, obtemos    igualdades envolvendo    ou  . Isolando-se, nos primeiros membros das igualdades, os termos    e ordenando-se de modo conveniente os elementos dos segundos membros da igualdade, obtemos o diagrama desejado.

Se o coeficiente  k  do termo de maior grau do divisor    não for igual a 1, então procedemos de forma análoga ao que é feito na aplicação do algoritmo usual de Briot-Ruffini: fazemos a divisão de    por um polinômio auxiliar  , que tem o coeficiente do termo de maior grau igual a 1. O resto    da divisão de    por    será o mesmo resto da divisão de    por    e o quociente    da divisão de    por    será igual a    vezes o quociente    da divisão    por  .

Exemplo: Dividir   por  .  Como o coeficiente do termo de maior grau de    é  3,
coeficientes de    e    construímos o seguinte diagrama:

 

Observando a última linha deste diagrama, temos que o quociente da divisão de    por    é  .

Logo, o quociente da divisão de  por  é   . O resto da divisão de    por    é  .

Em muitos problemas, divisões de polinômios surgem ao longo da resolução. Os dois exemplos seguintes ilustram isso e são aplicações do algoritmo apresentado.

Exemplo 1: Se    for um polinômio de coeficientes reais, podemos calcular facilmente  , o valor numérico de  f  em  , onde  a  e  b  são reais,    e  i  é a unidade imaginária. Para fazer isso, basta dividir  por  , obtendo assim um quociente     e um resto  ,  ambos de coeficientes reais. Daí, obtemos  ,  o que implica . Como  ,  temos que 

Sendo  , vamos calcular  .

Calculemos  , o resto da divisão de    por

:

 

Do diagrama anterior, temos  , e daí 

  .

Observe que obtivemos o resultado sem precisarmos efetuar trabalhosas potências de números complexos.

Exemplo 2: Muitas equações polinomiais envolvem alguma divisão de polinômios na sua resolução. Neste exemplo apresentamos um critério simples que pode ser usado na resolução de algumas equações polinomiais. Seja    um polinômio de coeficientes inteiros.  Se  ,    for uma raiz de  , então    também será uma raiz e, conseqüentemente,   será divisível por  . Fazendo  ,   e  ,  obtemos que os inteiros  ,  e    devem ser divisíveis por  ,  e ,  respectivamente. Assim, as possíveis raízes da forma  , de uma equação polinomial de coeficientes inteiros    são as que satisfazem as seguintes condições:

(1)   deve ser divisor de  termo constante de  ;

(2)   deve ser um divisor de  soma dos coeficientes de ;

(3)   deve ser divisor de  .

Usando o item (1) obtemos todas as possíveis raízes da forma  . Note que temos somente uma quantidade finita de possíveis raízes dessa forma. Os itens (2) e (3) nos permitem eliminar várias falsas raízes encontradas em (1). Devem restar assim poucas possíveis raízes de    para serem realmente testadas. Para efetuarmos o teste, ou seja, para calcularmos  , procedemos como no exemplo anterior.

Como exemplo de aplicação desse critério, vamos resolver a equação

.

Vamos procurar as raízes da forma    e  b  inteiros com b positivo. Se encontrarmos raiz dessa forma, então    também será raiz. Para que a condição (1) acima esteja satisfeita, as opções para    são  , , , , , , ,  ,  . Entre essas opções, satisfazem os itens (2) e (3) somente  x5  e  x9. Elas são, portanto, as que tem alguma chance de ser raiz de  .

Para calcularmos    e , dividimos    por    e por :  

Como  , a divisão não é exata e, conseqüentemente,    não é raiz de  .

 

Como a divisão é exata,  x9 = 4 + 4i   e  x9 = 4 4i   são raízes de  f(x). Além disso, observando a última linha do diagrama anterior, temos que as outras 2 raízes de  x2+x1=0.  .

Esse critério será de difícil aplicação quando o termo constante da equação possuir muitos divisores. No entanto, ele pode ser transformado num eficiente e simples programa de computador para a determinação desse tipo de raiz. Para o leitor que tiver se interessado por este exemplo, deixamos como exercício a resolução da equação

 

Referências Bibliográficas

[1]   BARBEAU, E.J.  Polynomials. New York: Springer-Verlag, 1989.

[2]  ACTON, F.S.  Numerical methods that work. Washington: The Mathematical Association of America, 1990.