A interpretação gráfica e o ensino de funções

 

Katia Cristina Stocco Smole
Marília Ramos Centuríón
Maria Ignez de Souza Vieira Diniz

IME/USP


Vamos discutir um pouco sobre o ensino de funções, tendo em vista que este tópico se apresenta tardiamente nos currículos de Matemática. Assim, o estudante só tem acesso à representação gráfica rio final do primeiro grau, encontrando grande dificuldade na interpretação de gráficos.

O que acontece nos dias de hoje é que, apenas em algum momento da 8 ou 7 séries, queremos ensinar, em poucas horas: o que é função, suas propriedades, salientamos as funções reais, fazemos os gráficos das funções lineares e quadráticas, e aplicamos tudo isso em alguns problemas e em ineqüações. No entanto, este instrumento rico em possibilidades de abordagens e colocações pode ser explorado já nas primeiras séries do 1 grau com o objetivo de familiarizar o aluno com a interpretação de gráficos e o conceito de função.

Na verdade, qual é o conceito de função que esperamos passar a nossos alunos? — Função é uma lei ou associação entre dois conjuntos que a cada elemento do primeiro conjunto associa um único elemento do outro. Intuitivamente, uma função é uma espécie de máquina na qual colocamos um certo dado (o elemento do primeiro conjunto) e ela atua sobre este dado e nos dá uma resposta que depende dele (elemento do segundo conjunto).

Tendo isto em mente, as atividades em sala de aula podem ser orientadas no sentido de assegurar a apropriação do aluno desses conhecimentos, antes do estudo de funções como se encontra nos atuais livros didáticos.

Nossa sugestão é que, a partir de problemas concretos e interessantes, o aluno seja capaz de construir e interpretar tabelas e gráficos, sendo que as situações apresentadas devem sempre se reportar ao universo mais próximo do aluno. No entanto, o material concreto não corresponde, necessariamente, a uma situação-problema real.

O trabalho com gráficos, quando introduzido nas primeiras séries escolares, se presta como instrumento complementar das atividades de classificação, ordenação e visualização das operações aritméticas simples.

As atividades que proporemos a seguir baseiam-se no princípio de que, para aprender eficazmente, a criança precisa participar dos acontecimentos ao invés de ser apenas expectadora, pois a experimentação pode fornecer oportunidades para a descoberta e formulação de leis e propriedades.

 

 

     Atividade 1

São dados seis cartões coloridos, dois de cada uma das cores: vermelho, azul e amarelo. Vamos estabelecer um modelo gráfico para representar a seguinte associação:

 

O que se espera obter é um gráfico semelhante a:



 

     Atividade 2

Utilizando o material blocos lógicos (ou outro material similar), vamos estabelecer com a classe o uso de um sistema gráfico para a representação da seguinte associação entre os blocos: a cada bloco associamos outro semelhante em todas as características mas de tamanho diferente.

Teremos um gráfico como o que segue:

Nestas duas atividades, estamos utilizando materiais comumente empregados nas primeiras séries do 1 grau, para trabalhar com classificação e agrupamento. O fato novo introduzido é aquele que leva o aluno a estabelecer registro de suas observações em forma de tabelas e gráficos. Outros jogos utilizados em sala de aula podem dar base a atividades relacionadas a tabelas e gráficos.

 

 

 

     Atividade 3

Propor a seguinte situação: Considerando que todos os alunos tomam sorvete e que, no entanto, nem todos gostam do mesmo sabor, como deverá o sorveteiro organizar um estoque de sorvetes de modo a agradar a todos?

A partir deste questionamento o aluno deverá realizar uma pesquisa de preferência de sabores entre os colegas (a consulta pode se restringir a algumas classes da escola), fazer a tabulação dos dados e a confecção de um gráfico de barra ou coluna. É interessante notar que os gráficos de barra e coluna devem ser utilizados nas aulas de Matemática, não só para que o aluno entenda este tipo de gráfico, muito usado nos meios de comunicação, mas como um instrumento a mais para alcançar o conceito de função, já que, tradicionalmente, o professor se restringe apenas às retas e parábolas. Mas, continuando, suponhamos que, após a tabulação, apareça um gráfico semelhante ao desenhado abaixo:


 

O aluno poderá, então, formular uma hipótese e compará-la à forma co­mo o sorveteiro efetivamente organiza seu estoque.

 

 

 

      Atividade 4

Após o estudo das primeiras operações podemos sugerir as representações das seguintes "máquinas" atuando sobre números naturais:

 

Observando os resultados obtidos ao introduzirmos alguns números, esperamos chegar aos seguintes gráficos, que são exemplos de funções crescentes:

Nesta atividade, ao contrário das anteriores, passa a ser conveniente uma ordenação nos dois eixos para que possamos visualizar o comportamento das funções. Uma outra coisa interessante é que, por ser IN o conjunto utilizado, a representação é feita apenas por pontos, mas estes podem ser unidos para ajudar a visualizar o crescimento das funções. Observe que, propositalmente, foram usadas escalas diferentes nos dois eixos.

 

 

 

     Atividade 5

Determinar os gráficos das leis que a cada número natural  n  associam mdc(2, n), ou  mdc(5<,n)  explorando o conceito de função periódica.

 

     Atividade 6

Feito o estudo de área e perímetro do quadrado podemos propor que a partir do quadrado de lado 1 unidade, o aluno construa a seguinte tabela:


 

Pronta a tabela, a próxima etapa é representar ambos os valores da área e do perímetro para cada valor do lado num mesmo par de eixos.

Unindo os pontos obtidos te­remos um gráfico comparativo da evolução do perímetro e da área de um quadrado, a partir da medida de seu lado.

Podemos   colocar   as   seguintes questões:

   O que é maior — a área ou o perímetro de um quadrado?

   Observando o ponto   Q,   queconclusões podemos tirar?

 

 

     Atividade 7

Observando o gráfico responda:

1.       Do que trata o gráfico?

2.       De 1970 a 1990 o desmatamento em Rondônia aumentou ou
diminuiu?

3.       Qual a porcentagem aproximada da área desmatada entre 1980 e 1985?

4.       Se tudo continuar assim, em 1990 qual será, aproximadamente, a porcentagem da área desmatada?

5.      Em que ano a área desmatada atingiu 10%?

6.      Por que entre 1970 e 1975 o gráfico está tão próximo à linha onde estão marcados os anos?

7.      Qual o valor máximo que a porcentagem da área desmatada poderá atingir?

 

 

     Atividade 8

Observe os gráficos de consumo anual de chicletes das marcas "Boa Bola" e "Gruda Bem":
 

Qual a marca mais vendida? Por quê?

Estes dois gráficos analisam situações semelhantes, no entanto a mudança de escala em um dos eixos induz à falsa impressão de que o chiclete "Boa Bola" foi mais consumido que o outro.

Como o trabalho com a análise de fenômenos e situações-problema tem o objetivo de desenvolver o espírito crítico, escolhemos as duas últimas atividades para nos aproximarmos deste objetivo, considerando que a capacidade de raciocinar dedutivamente a partir de um conjunto de hipóteses pressupõe uma análise condicional das mesmas.

Sem dúvida, estas são apenas sugestões para exemplificar o que pode ser feito com crianças ao longo do 1 grau, no sentido de encaminhar melhor o ensino de funções e de dar, o mais cedo possível, uma ferramenta poderosa de trabalho em Matemática, que é a representação gráfica.

 

Referências

Dienes, Z. P. Relations and Functions. Living Mathematics-Centre de Recherches en Psycho-Mathématique, Université de Sherbrooke, Québec, 1976.

Nery, C, Jakubovic, J. Curso de Matemática, volume 1, Ed. Moderna, 1986. Woodward, E. Graphs: Patterns, Periodic Functions, and Problem Solving, Math. Teacher, February, 98, 1986.

D'Ambrosio, U. Da Realidade à Ação. Reflexões Sobre Educação e Matemática. Summus Ed. e Ed. da UNICAMP, 1986.

Johnson, D. A, Glen, W. H. "O Mundo da Estatística". In: Matemática sem problemas, vol. 2, Ed. José Olímpio e Ed. Melhoramentos, 1961.

Trotta, F., Imenes, L. M. P., Jakubovic, J. Matemática Aplicada. 1? série do 2? grau, Ed. Moderna, 1979.

 

 

Kátia Cristina Stowo Smole é professora de Matemática do Centro Específico de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério — CEFAM — Osvaldo Aranha e bolsista do projeto RIPEC/IME-USP do programa SPEC/CAPES.

Marília Ramos Centurion é professora de Matemática do Colégio Rainha da Paz e bolsista do projeto RIPEC/IME-USP programa SPEC/CAPES.

Maria Ignez de Souza Vieira Diniz é professora do IME-USP, coordenadora do "Centro de Aperfeiçoamento do Ensi­no de Matemática" — CAEM e responsável pelo projeto "Rede Integrada de Propostas para o Ensino de Ciências" — RIPEC, junto ao IME/USP.

 

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